Descrição de chapéu The New York Times

Ex-infiltrado na Al Qaeda ganha US$ 27 mil de indenização por estresse pós-traumático

Espião dinamarquês teve de provar na Justiça que trabalhou para órgão de inteligência do governo

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Copenhague | The New York Times

Descrevendo seu trabalho como um agente secreto entre um grupo de terroristas da Al Qaeda fortemente armado, Morten Storm disse que seu emprego como informante transformado em jihadista era perigoso e exaustivo.

Os órgãos de espionagem nunca reconheceram seu trabalho sigiloso. Mas o governo dinamarquês, em uma decisão que surpreendeu Storm, concedeu-lhe cerca de US$ 27 mil em danos por perda de capacidade de trabalho, devida a transtorno de estresse pós-traumático. Segundo ele, o problema foi consequência de seu trabalho secreto para órgãos de inteligência dinamarqueses e outros.

O Seguro do Mercado de Trabalho, um órgão estatal, concluiu que ele experimentou "eventos excepcionalmente perigosos" durante sua atuação, relatou na segunda-feira (18) o jornal "Jyllands-Posten". Uma futura revisão decidirá em que medida ele ainda pode trabalhar e se receberá outras compensações.

O ex-espião dinamarquês Morten Storm durante entrevista
O ex-espião dinamarquês Morten Storm durante entrevista - Reprodução

O pagamento é, na verdade, o primeiro reconhecimento formal pelo governo de seu trabalho secreto; ele nunca foi reconhecido pelo Serviço de Inteligência e Segurança da Dinamarca, o PET, ou por outras agências de inteligência ocidentais, que geralmente se recusam a comentar sobre fontes secretas.

Hans Jorgen Bonnichsen, um ex-chefe de operação do serviço de inteligência dinamarquês, disse que ficou surpreso quando soube da decisão de indenizar Storm. Agências que realizam trabalho sigiloso são colocadas em situação difícil quando ex-agentes falam publicamente sobre seu trabalho, disse Bonnichsen, mas o serviço de inteligência geralmente guarda silêncio "até que o inferno congele" para proteger seus atuais funcionários. 

O advogado de Storm disse que o caso de indenização foi "um pouco peculiar", embora o valor da indenização inicial fosse bastante comum. Storm não tinha recibos ou contrato para provar seu trabalho, e o PET se recusou a apresentar qualquer corroboração.

"Em casos de indenização trabalhista normais, tanto o prejudicado quanto o empregador oferecem informação, mas o PET preferiu ficar em completo silêncio", disse o advogado de Storm, Brian Hansen.

Em um e-mail, um membro do PET disse que a agência "geralmente não confirma ou nega se uma pessoa está trabalhando ou trabalhou como fonte".

Em vez de documentos provando sua relação com agentes de inteligência do Estado, Storm apresentou gravações de voz e prova de transferências de dinheiro pela Western Union que incluíam os nomes de agentes do PET.

Suas reivindicações anteriores sobre o trabalho secreto foram levadas a sério pela mídia internacional e pela Atlantic Monthly Press, que publicou um livro de memórias do dinamarquês em 2014, "Agent Storm: My Life Inside Al Qaeda and the CIA" [Agente Storm: minha vida dentro da Al Qaeda e da CIA]. Uma resenha publicada no New York Times chamou seu relato de "altamente verossímil".

Antes que se juntasse a militantes islâmicos, Storm, hoje com 43 anos, foi um ladrão e, aos 21, um membro promissor de um bando criminoso de motociclistas.

Em 1997, com 20 e poucos anos, ele se converteu ao islã e mudou-se para o Reino Unido, depois para o Iêmen para aprender árabe. Lá ele fez amizade com membros graduados da Al Qaeda na Península Arábica.

Em 2006, segundo seu relato, perdeu a fé no jihadismo e entregou seus camaradas terroristas para se tornar informante do serviço de inteligência dinamarquês, assim como para agências do Reino Unido e dos Estados Unidos. 

Storm afirma que a informação que ele deu ajudou na morte por drone do religioso americano e recrutador da Al Qaeda Anwar al-Awlaki no Iêmen em 2011 e à prisão naquele ano de Ahmed Abdulkadir Warsame, um somaliano que ajudou a al-Shabab, grupo terrorista da Somália, e a Al Qaeda no Iêmen.

Suas afirmações nunca foram publicamente confirmadas pela CIA. Em 2012, Storm rompeu com o PET e começou a falar com a mídia.

Ele disse que trabalhou diretamente com agentes americanos e dinamarqueses e recebeu pagamentos mensais, mas nunca recompensas ou ajuda para recomeçar a vida —motivo de grande ressentimento para ele.

Storm aparentemente está escondido hoje em uma aldeia na Dinamarca, dizendo que teme seus ex-camaradas da rede jihadista que o ameaçaram pela internet.

Em 2018, quatro pessoas foram condenadas por ameaçá-lo em uma praia na Dinamarca durante uma viagem com seus três filhos.

Foram as tensões de uma vida dupla perigosa, segundo Storm, que causaram seu transtorno pós-traumático. Hoje, fazer compras na região rural da Dinamarca lhe causa medo, diz ele.

"À noite eu grito e dou pontapés", disse ele em uma entrevista por telefone. "Só de falar sobre isso me deixa nervoso."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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