Netanyahu fez israelenses acreditarem que é insubstituível, diz analista

Para Yaron Dekel, premiê vence eleições no discurso de que só ele pode assumir desafios que Israel enfrenta

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tel Aviv

Para o jornalista e analista político Yaron Dekel, um dos mais respeitados de Israel, Binyamin Netanyahu conseguiu uma vitória pessoal impressionante nas eleições desta terça-feira (9) e certamente continuará no poder com seu partido de direita, o Likud.
 
Dekel, que foi chefe do escritório da TV pública israelense em Washington e editor-chefe e CEO da rádio Galei Tsahal, analisa que o possível indiciamento do premiê por corrupção, nos próximos meses, não foi um fator na campanha porque os israelenses, em geral, enxergam todos os políticos como corruptos.

Ele também afirma que as acusações contra Netanyahu não são identificadas como "corrupção clássica".

O premiê israelense, Binyamin Netanyahu, discursa para seus apoiadores em Tel Aviv
O premiê israelense, Binyamin Netanyahu, discursa para seus apoiadores em Tel Aviv - Muammar Awad - 9.abr.19/Xinhua

"Quando [o ex-premiê Ehud] Olmert recebeu dinheiro em envelopes, foi muito fácil digerir isso como corrupção. Mas quando Netanyahu é acusado de receber presentes como joias e charutos ou uma cobertura positiva na imprensa, [os israelenses] não acreditam que seja tão crítico."
 
Apresentador de um programa semanal sobre política na rádio Reshet Bet e convidado frequente de painéis políticos, Dekel avalia que a promessa de Netanyahu de declarar soberania israelense sobre os assentamentos judaicos na Cisjordânia foi apenas bravata de campanha, uma vez que o premiê teve dez anos para fazer isso e não o fez.

Parece certo que Binyamin Netanyahu formará o próximo governo?
Ficou claro que Netanyahu obteve um sucesso inédito em sua campanha. É uma conquista pessoal, e ele vai quebrar o recorde de David Ben-Gurion como o premiê mais tempo no cargo na história de Israel. Ele é quem dirigiu a campanha, carregou tudo em seus ombros. Isso tudo com a sombra da decisão do procurador-geral de indiciá-lo.
 
Como ele conseguiu se reeleger com a ameaça de indiciamento?
A questão da corrupção não teve quase nenhum efeito sobre os eleitores. A primeira razão é que os israelenses não encaram a questão da corrupção como no passado. Cada vez mais ministros, inclusive um premiê, são condenados por suborno e outras questões. As pessoas acreditam em Israel, e em todo o mundo há sempre corrupção na política.

 
Mas Netanyahu é acusado de troca de favores e recebimento de presentes de empresários.
Mas não identificam isso como corrupção clássica. Quando [o ex-premiê Ehud] Olmert recebeu dinheiro em envelopes, foi muito fácil digerir isso como corrupção. Mas quando Netanyahu é acusado de receber presentes como joias ou charutos ou uma cobertura positiva na imprensa, não acreditam que seja tão crítico. Ele também convenceu muitos israelenses de que é apenas uma vítima das elites, da mídia, da Justiça. 
 
No mês passado, o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, visitou Israel. Netanyahu também foi recebido por Putin em Moscou, e por Trump, em Washington. Essa blitz diplomática o ajudou?
Sim. Ele fez muitos israelenses acreditarem que é insubstituível, que ninguém pode assumir os riscos e desafios que Israel enfrenta, como a fronteira com a Síria, com o Líbano e com a Faixa de Gaza. Ele fez muitos pensarem que ninguém pode se igualar ao seu forte status internacional. As visitas a Moscou e a Washington foram provavelmente parte de sua campanha para mostrar aos israelenses que ele é um líder internacional de peso. Ele abriu portas também na América do Sul, na África e na Europa.

Netanyahu prometeu anexar os assentamentos na Cisjordânia. Vai cumprir a promessa?
Acho que todos sabem que [a declaração] foi parte da campanha para conseguir votos da extrema-direita. Mas ele não fez nada sobre isso nos últimos dez anos. Não vai, de repente, começar a se envolver em ações unilaterais na Cisjordânia. Sabemos que, na política israelense, às vezes, há uma grande lacuna entre palavras e ações.
 
Quem foram os grandes perdedores dessas eleições?
Foi a maior derrota da história do chamado “campo da paz”, o bloco de esquerda judaico. O Partido Trabalhista conseguiu apenas seis cadeiras em comparação com as 24 das eleições passadas. E o Meretz [de extrema-esquerda] ficou com apenas quatro. Juntos, eles terão menos de 10% do Parlamento. Não conto o Azul e Branco, que não faz exatamente parte do “campo da paz”. É um quebra-cabeças de pessoas com muitas posições políticas.

Assentamento judaico de Kiryat Arba em Hebron, na parte ocupada por Israel na Cisjordânia
Assentamento judaico de Kiryat Arba em Hebron, na parte ocupada por Israel na Cisjordânia - Mussa Qawasma - 7.abr.19/Reuters

 
Por que essa derrota foi tão grande?
A primeira razão é que o processo de paz palestino-israelense está totalmente fora da mesa devido ao fato de que existem dois jogadores, Netanyahu e Mahmoud Abbas, que não estão comprometidos com esse processo. Durante a campanha, quase ninguém mencionou a palavra “paz”, que era muito popular na política israelense há 15 ou 20 anos.  
 
Há motivos para isso?
Sim. Depois da retirada israelense da faixa de Gaza, em 2005, a opinião pública israelense se voltou para a direita. A tradicional equação que os israelenses conheciam desde 1967 –“Terra em troca de paz”– foi quebrada. Israel se retirou de Gaza, mas, desde então, é atacado por foguetes do Hamas. As pessoas pararam de acreditar na bandeira principal do "campo da paz", a troca de terras por paz.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.