Descrição de chapéu Coreia do Norte

Foto de satélite mostra Coreia do Norte como buraco negro econômico

Falta de luminosidade noturna é um dos poucos indicadores para medir atividade no país

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São Paulo

Uma imagem de satélite publicada pela revista britânica The Economist não deixa dúvidas: a Coreia do Norte é um buraco negro econômico (a própria revista fez a analogia).

A foto noturna inclui as Coreias do Norte e do Sul, além de parte dos territórios fronteiriços chinês e russo. No extremo sudeste, aparece a ilha de Kyushu, no Japão.

No registro, as luzes sul-coreanas refletem a pujança econômica do país. Idem para a parte chinesa, um pouco menos na Rússia. Do riquíssimo Japão, nem se fala. Na Coreia do Norte, exceto por um brilhareco na capital, Pyongyang, o breu é absoluto.

A luminosidade noturna é um bom indicador de vigor na economia. A Economist cita um estudo recente do FMI, apontando uma correlação direta entre as luzes da noite e o PIB. Em nações tão fechadas como a Coreia do Norte, esse é um dos únicos indicadores disponíveis para saber da economia. 

Diante da escuridão vista na imagem de satélite, vem a pergunta inevitável: a economia norte-coreana vive de quê? A resposta mais simples é: algumas poucas exportações (como minerais e tecidos), contrabando e mercados domésticos semi-informais. 

A derrocada econômica da Coreia do Norte começou nos anos 1990. Até então, o país, fundado em 1949, vivia às custas da União Soviética, num modelo parecido com o de Cuba: recebia petróleo quase de graça e exportava produtos superfaturados. Um péssimo negócio para a URSS, mas era assim que ela consolidava sua influência pelo globo.

No fim dos anos 1980, o Muro de Berlim ruiu, o socialismo real entrou em colapso e a Coreia do Norte, na época sob Kim Jong-il (pai do atual ditador), teve de andar com as próprias pernas. Não foi longe. 

Condições climáticas terríveis (secas e enchentes extremas), somadas a lambanças na gestão ditatorial da agricultura, levaram a uma epidemia de fome. Dependendo de quem faz as contas, morreram entre 600 mil e 2 milhões de pessoas. No típico duplipensar da dinastia Kim, o período recebeu um nome poético: a “Árdua Marcha”.

Vista da cidade norte-coreana de Rason, próxima à fronteira da China e da Rússia - Ed Jones - 21.nov.2017/AFP

Duas décadas depois, o país está longe de ter uma economia normal. Não há dados oficiais. Os poucos números vêm de estimativas sul-coreanas. 

Com base na luminosidade noturna, um grupo de pesquisa do World Data Lab, citado pela Economist, estimou que o padrão de vida norte-coreano, por pessoa, custaria, nos EUA, o equivalente a R$ 5,6 mil anuais. Isso faz da Coreia do Norte um dos dez países mais pobres do mundo.

Em setembro passado, numa visita de 11 dias ao país, foi possível ver de perto o (não) funcionamento da economia do reino de Kim Jong-un.

Nos bairros mais novos de Pyongyang, mostrados com empenho pelos três guias que nunca saem de perto, há lojas com produtos de marcas internacionais, que provavelmente entram no país, por contrabando, da China. As lojas normalmente ficam anexas a restaurantes de luxo (para o padrão local).

Almoçando nesses lugares, apenas homens de negócio chineses e/ou a elite do partido único do país. Isso quando há alguém. Nas lojas, ficam só as vendedoras, tão sorridentes quanto desocupadas.

Em um comércio de utilidades domésticas, há, logo na entrada, pequenos geradores a diesel, essenciais para driblar as frequentes quedas de energia —para quem pode pagar. 

Nas janelas dos apartamentos de Pyongyang, destacam-se na paisagem pequenos captadores de energia solar, outra fonte de energia alternativa. Imagina-se que sejam baratos, por existirem em grande número, apesar do poder aquisitivo modesto da população.

Esses coletores são vendidos em mercados semi-informais, os “jangmadang”. São aglomerados de tendas montadas nas ruas, surgidos na época da fome dos anos 1990. 

Foram primeiro tolerados, depois violentamente reprimidos, e hoje funcionam de modo quase oficial. A maioria dos produtos é contrabandeada de China e Rússia.

Outros tipos de pequeno comércio são permitidos, ainda que de modo muito informal. Em um passeio, um de nossos guias parou para comprar de uma vendedora de rua um saco dos famosos vôngoles da região. Comércio puro e simples, sem sinal de intervenção estatal.

Mais recentemente, começaram a proliferar em Pyongyang quiosques de rua, vendendo água, refrigerantes, doces e salgadinhos. 

As sanções cada vez mais duras, lideradas pelos EUA, deixam a economia norte-coreana sem alternativas.

E, além disso, o país enfrenta hoje sua pior seca em 37 anos. Até o fim deste mês, não há chuvas previstas. 

Duas agências da ONU informaram nesta semana que 10 milhões de norte-coreanos, ou 40% da população, estão sofrendo com uma “grave falta de comida” e que ajuda internacional é necessária com urgência.

A “Árdua Marcha” ainda não terminou.

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