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O que você precisa saber sobre as novas leis de aborto nos EUA

Republicanos têm se articulado em estados americanos para se contrapor à legalização da prática

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Marisa Iati Deanna Paul
Washington | The Washington Post

A corrida dos estados controlados por republicanos para armar uma contestação à decisão histórica da Suprema Corte dos Estados Unidos no caso Roe vs. Wade, que legalizou o aborto em todo o país, provocou confusão sobre o que as novas leis realmente significam. Veja abaixo o que você precisa saber.

Dez estados enrijeceram as restrições ao aborto neste ano, e medidas semelhantes estão pendentes de aprovação em outros estados. As novas leis provocaram perguntas sobre se as mulheres que fizerem aborto poderão ser punidas e por que algumas partes da legislação são chamadas de "leis do batimento cardíaco", entre outros assuntos.

Ativistas protestam em Atlanta, na Georgia, contra lei que proíbe o aborto
Ativistas protestam em Atlanta, na Georgia, contra lei que proíbe o aborto - John Amis - 16.mai.19/AFP

Essas restrições geralmente se destinam a provocar contestações jurídicas que acabam levando a questão à Suprema Corte.

 

"Eu rezei para que essa lei fosse aprovada", disse a deputada republicana do Alabama Terri Collins, que patrocinou a proibição ao aborto no seu estado. "É assim que chegamos aonde queremos chegar."

Agora que dois juízes nomeados pelo presidente Donald Trump estão na Suprema Corte, os conservadores veem um potencial de reversão da histórica decisão judicial de 1973 —embora os tribunais tendam a fazer alterações incrementais em sua interpretação da lei, em vez de derrubar drasticamente os precedentes. Enquanto isso, os estados de Nova York e Vermont aprovaram proteções ao direito ao aborto.

Então por que todo mundo está falando sobre a nova lei do Alabama?

A lei assinada na quarta-feira (15) pela governadora Kay Ivey, republicana, proíbe o aborto em quase todas as circunstâncias e é considerada a mais restritiva do país. A legislação só abre exceções para preservar a saúde da mãe ou para fetos com "anomalias fatais" que tornam improvável sua sobrevivência fora do útero. Estupro e incesto não são exceções previstas na lei do Alabama.

- Que Estado aprovou mais recentemente uma lei sobre o aborto?

O Senado do Missouri, controlado por republicanos, aprovou no início da quinta-feira (16) a proibição ao aborto a partir da oitava semana de gravidez. A Câmara estadual aprovou a lei na sexta (17), e agora aguarda a assinatura do governador republicano Mike Parson. Ele já disse que a lei fará do Missouri "um dos estados pró-vida mais fortes do país".

Assim como no Alabama, estupro e incesto não serão exceções à proibição no Missouri.

- Uma mulher que fez aborto pode ser punida?

As leis do Alabama e do Missouri especificamente isentam as mulheres de responsabilidade criminal, segundo Katherine Kraschel, diretora-executiva do Centro Solomon para Lei e Políticas de Saúde na Escola de Direito de Yale.

A nova lei da Geórgia, segundo ela, é menos clara porque define um feto ou embrião como uma criança não nascida, mas outros dispositivos da lei da Geórgia protegem os direitos das mulheres grávidas.

- Um profissional de saúde que pratica um aborto pode ser punido?

A lei do Alabama afirma explicitamente que as mulheres estão isentas de responsabilidade civil e criminal. Mas ela visa os médicos, que podem ser processados por praticar um aborto, crime punível com até 99 anos de prisão.

Carol Sanger, professora na escola de direito da Universidade Columbia, disse que essas penas aos médicos são "apenas mais uma maneira de assustar as mulheres" e criar "mais desestímulos para que médicos e residentes adotem essa prática".

A lei da Geórgia também diz que os médicos que efetuarem aborto serão processados, mas ela é mais vaga sobre as mulheres.

A medida não poderá ser usada para processar mulheres, segundo Staci Fox, da organização Planned Parenthood. Mas se uma mulher sofrer um aborto espontâneo poderá ser alvo de uma investigação para ver se alguém praticou um aborto nela.

"Você não quer que uma mulher seja obrigada a provar como ela perdeu seu bebê", disse Sanger.

A lei da Geórgia não diz inequivocamente que as mulheres estão isentas, mas juristas apontam outras áreas do Código Penal da Geórgia que têm defesas específicas para as mulheres, incluindo as que sofrem aborto espontâneo.

- Por que algumas proibições ao aborto são chamadas de leis do "batimento cardíaco"?

Algumas leis, como a da Geórgia, proíbem o aborto depois da detecção do que as leis chamam de batimento cardíaco fetal, o que geralmente acontece com cerca de seis semanas de gravidez. Esse período é aproximadamente duas semanas depois que a mulher não teve menstruação, quando muitas não sabem ainda que estão grávidas.

Os defensores desse tipo de proibição ao aborto chamam a legislação de "leis do batimento cardíaco", enquanto muitos ativistas do direito ao aborto dizem que o termo é impreciso porque o coração do embrião ainda não está totalmente formado nessa fase.

Um exame de ultrassom geralmente mostra atividade elétrica no coração em formação do embrião com cerca de seis semanas de gravidez, diz a doutora Jen Villavicencio, membro do Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas.

A médica afirma que embora essa atividade não seja igual a um batimento cardíaco que bombeia sangue, ela costuma usar o termo "batimento cardíaco" com suas pacientes nessa altura, porque elas conhecem a terminologia.

Villavicencio diz que tecnicamente a descrição é imprecisa. "Acho que quando você está legislando biologia dessa maneira, precisa ser realmente preciso", afirma.

- Por que algumas pessoas são contra o recorte de seis semanas incluído nessas leis de "batimento cardíaco"? 

Os médicos datam a gravidez desde o primeiro dia da última menstruação da mulher, e não da data em que ela teve a relação sexual. A maioria das mulheres está com pelo menos quatro semanas de gravidez quando descobrem sua condição, diz Villavicencio.

Muitas mulheres não percebem até a quinta ou sexta semana, segundo ela, especialmente quando não esperam engravidar. As mulheres são ensinadas a suspeitar de gravidez quando não têm menstruação, mas outros fatores —como estresse, obesidade ou novos medicamentos— também podem interromper o ciclo menstrual.

- Qual a probabilidade de usar a contracepção de emergência para evitar a gravidez, como alternativa ao aborto?

As pílulas da "manhã seguinte" vendidas em farmácias evitam a gravidez quando tomadas em 72 horas após a relação sexual, segundo Villavicencio, mas são muito menos eficazes nas mulheres que pesam mais de 77 quilos. A contracepção de emergência que exige prescrição deve ser tomada em cinco dias após o contato sexual, diz a médica.

- A proibição do aborto reduz o índice de abortos?

Não de modo significativo. Os países que têm proibição total ou parcial têm índices de aborto de 37 a cada mil pessoas, enquanto nos países sem restrição há 34 abortos em cada mil, segundo o Instituto Guttmacher, organização de pesquisa e políticas que defende o direito ao aborto.

O maior acesso à contracepção, porém, está relacionado a menores taxas de abortos, segundo o instituto. Um estudo da universidade Washington em St. Louis descobriu em 2012 que dar às mulheres liberdade no controle natal reduz o índice de abortos em 62% a 78%, comparado com o índice nacional. 

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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