Séries reveem morte de político cercada de mistério no México

Mandantes do assassinato de Luis Donaldo Colosio não foram descobertos até hoje

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Buenos Aires

Vinte e cinco anos após o assassinato do candidato presidencial Luis Donaldo Colosio (1950-1994), um crime que escandalizou o México, duas produções tentam explicar o episódio até hoje envolto em mistério.

Enquanto “1994”, do jornalista Diego Enrique Osorno, é um documentário equilibrado, com boa pesquisa de imagens e amplo panorama dos fatos, “Crime Diaries: The Candidate” é uma ficcionalização, mais maniqueísta, fazendo clara sugestão de quem seriam os bons e os maus na história.

Luis Colosio discursa em seu último evento de campanha antes de ser assassinado 
Colosio discursa em seu último evento de campanha antes de ser assassinado  - 1994/La Razón

As obras, disponíveis na Netflix, são didáticas e geram reflexão sobre o período.

Luis Donaldo Colosio, então aos 44 anos, foi assassinado em 23 de março de 1994, em Lomas Taurinas, Tijuana, em meio a uma multidão que o acompanhava num comício. 

As imagens são fortes. Vê-se, de costas, o assassino apontando uma arma contra a cabeça de Colosio e disparando. Ele cai, também ferido por outro tiro no abdômen, e morre algumas horas depois.

Embora o atirador, Mario Aburto, tenha sido condenado a 42 anos de prisão, os mandantes do crime nunca foram descobertos. 

Obstáculos surgiram na investigação, como mostram as produções. Entre eles, desvios na apuração por razões políticas, sumiço de provas, corrupção e até uma suposta troca de identidade do agressor preso, que em fotos diferentes parece não ser a mesma pessoa.

O mérito de ambas as séries é voltar a debater Luis Donaldo Colosio, figura que divide opiniões no México. 

Há quem veja no carismático líder alguém que de fato havia se comprometido a mudar o PRI (Partido Revolucionário Institucional), o principal do país. A sigla vinha de mais de 60 anos de hegemonia no poder, a chamada “ditadura perfeita”, nas palavras do Nobel peruano Mario Vargas Llosa.

Eleições eram mera formalidade. Cada presidente escolhia quem herdaria o poder —o chamado “dedazo”, ou seja, escolhia-se um preferido nas filas do próprio partido.

As votações eram manchadas de irregularidades. Como diz na série o irmão do presidente Carlos Salinas de Gortari, Raúl, “as portas de Los Pinos [palácio presidencial] se abrem por dentro”. Ele seria preso posteriormente por corrupção e homicídio.

Colosio assustava o establishment falando em democratizar o sistema, acabar com os “dedazos” e pôr fim aos compromissos com o empresariado governista.

Por outro lado, Colosio também tem, até hoje, seus críticos. Se era tão honesto, como subiu tão rapidamente até a candidatura? Se estava em desacordo com os modos do PRI, por que integrava o partido?

Os críticos creem que o assassinato acabou canonizando um político que, no fundo, não era tão diferente.

Em “1994”, temos um relato jornalístico do período. São ouvidos apoiadores, críticos, ex-magistrados, e há um bom depoimento de Carlos Salinas de Gortari, o então presidente, que escolheu Colosio para sucedê-lo.

Ele é apontado por muitos como possível mandante do crime —o sucessor poderia revelar os modos pouco democráticos do partido.

Outros possíveis mandantes são Raúl, irmão de Salinas de Gortari, pois Colosio se negava a trocar favores com empresários; parte da oposição, cansada da homogeneidade do PRI; cartéis de narcotráfico, a quem o PRI fazia olho gordo; e até um rival interno do partido, Manuel Camacho, que também almejava a Presidência.

Mostra-se, ainda, o México em ebulição em 1994, ano em que foi assinado o Nafta, o tratado de livre-comércio da América do Norte, e no qual estourou a revolução dos indígenas de Chiapas contra o governo.

Já “Crime Diaries” assume tom mais novelesco e pessoal. Seu fio-condutor é a viúva de Colosio, Diana Laura, que em seus últimos meses de vida, lutando contra um câncer, dedicou-se a desvendar o crime.
Pelos seus olhos, desvela-se a corrupção da Justiça e os conchavos na política.

A envolvente série, porém, pesa um pouco a mão ao apontar Salinas de Gortari como o mais provável interessado na morte de Colosio e ao celebrar demais o policial que tentou conduzir a investigação de modo honesto e foi assassinado.

O certo é que as séries mostram que esta ainda é uma ferida aberta na memória recente dos mexicanos. Depois da morte de Colosio, o país não seria mais o mesmo.


1994 e Crime Diaries: The Candidate estão disponíveis na Netflix
 

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