Durante sua visita a Caracas, há dez dias, a ex-presidente do Chile e hoje chefe do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, reuniu-se com vítimas da repressão da ditadura de Nicolás Maduro.
Entre elas, estava o jornalista Luis Carlos Díaz, 34, sequestrado e detido pelo Sebin, o serviço de inteligência do regime venezuelano, em março.
Díaz estava percorrendo a cidade de bicicleta para observar e reportar o apagão que atingiu o país naquela época.
Foi preso sob a acusação de ser um dos instigadores de um suposto complô que teria causado o próprio apagão.
Depois de 30 horas, foi solto, mas com diversas restrições sobre como deveria atuar e a obrigação de comparecer a cada oito dias ao Sebin para reportar seu paradeiro e ações.
O jornalista trabalha de forma independente mas tem milhares de seguidores. Mantém, com a mulher, a também jornalista Naky Soto, um site.
Com ela, produz podcasts e colabora com diferentes meios. Trabalhava para uma rádio, mas foi obrigado a deixá-la. Sua prisão causou comoção internacional e vários pedidos de organizações de jornalistas para que fosse liberado.
Até hoje, Díaz está impedido de falar sobre o que ocorreu nas horas em que esteve preso e sobre o andamento do processo.
Também está impedido de deixar o país para dar palestras, o que fazia com frequência e o ajudava no orçamento de sua família —sua mulher tem câncer e ambos precisam de dinheiro para o tratamento dela.
Em entrevista à Folha, por telefone, Díaz disse que considera a visita de Bachelet positiva.
“Ela não veio aqui para se convencer de nada, para verificar se era verdade que havia abusos. Ela sabe muito bem o que está ocorrendo”, afirma.
Nesse sentido, o jornalista vê a visita como “um gesto internacional que aponta para um problema grave”. “Além disso, ela conseguiu colocar aqui duas pessoas que vão estar o tempo todo vendo o que ocorre e um escritório da ONU dedicado a isso.”
Para Díaz, o fato de Bachelet ter se reunido com Maduro e com a cúpula chavista não quer dizer que ela os respalda.
“Ocorreu porque é parte do protocolo. Ela foi muito clara com as vítimas em sua posição de dar projeção e vigiar o que está acontecendo”, diz.
“Muitos criticaram, dizendo que sua visita não tinha levado a nada, mas há que se considerar que não é sua função hoje em dia fazer política. Sua missão era com os abusos de direitos humanos, e essa, falo como vítima, creio que a cumpriu.”
Perguntado sobre o desânimo que parece estar tomando conta da Venezuela, com menos protestos de rua, altos e baixos do apoio ao líder da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, Díaz disse que isso é natural.
“Ninguém aguenta marchar todos os dias, especialmente se há repressão, mas não há resultados. Não significa que a situação melhorou. O povo com cada vez mais fome pensa no mais imediato, que é como vai alimentar sua família, e não em derrubar um governo que reprime”, conta.
Díaz afirma que vai continuar fazendo jornalismo, “porque é preciso contar o que está acontecendo. E, veja, Caracas não está em uma situação tão ruim. Maracaibo e Zulia não têm luz, não têm gasolina, não têm comida. Não podemos deixar de reportar.”
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