Um terço dos membros das Farc retomou armas após acordo de paz, aponta relatório

Documento militar aponta em 2.300 o número de combatentes; eram 300 na ocasião de acordo

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Bogotá | Reuters

Aproximadamente um terço dos combatentes do antigo grupo rebelde Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) pegaram em armas novamente depois do acordo de paz em 2016, representando um crescente risco para a segurança no país andino, segundo relatório de inteligência militar confidencial visto pela agência Reuters.

O relatório interno calcula em cerca de 2.300 o número de combatentes de grupos dissidentes das Farc, contra aproximadamente 300 na época do polêmico acordo de paz.

Com a assinatura do acordo, quase 13 mil membros das Farc, incluindo mais de 6.000 combatentes, entregaram suas armas para serem destruídas e encerraram sua participação em uma guerra de cinco décadas que matou mais de 260 mil pessoas e deslocou milhões. 

Ex-rebelde das Farc em zona de treinamento e reincorporação de guerrilheiros, em Icononzo, na Colômbia - Raul Arboleda - 12.jun.18/AFP

O relatório disse que havia 31 grupos dissidentes das Farc em operação em regiões de plantio de coca —a matéria-prima da cocaína— e em áreas de mineração ilegal de ouro. A Colômbia é o maior produtor mundial de cocaína.

A estimativa dos combatentes dissidentes mostrou um aumento de aproximadamente 30% da contagem oficial anterior, em dezembro. 

"Se você olhar onde esses grupos armados organizados estão ou onde eles apareceram, está associado ao crime: onde há uma grande presença de tráfico de drogas ou mineração ilegal, ou em áreas de fronteira, especialmente perto da Venezuela", disse o general Luis Fernando Navarro, comandante das forças militares da Colômbia. 

O partido político Farc, que se formou depois do acordo de paz, disse que além da pressão para se unir a grupos dissidentes envolvidos em atividades ilícitas ex-combatentes estão pegando em armas devido à frustração pela falta de oportunidades econômicas e raiva sobre a estigmatização e a violência contra eles. 

O presidente Iván Duque tentou modificar os acordos com os grupos —que deram o Prêmio Nobel da paz ao ex-presidente Juan Manuel Santos— porque ele os considera brandos demais com as Farc, que durante décadas se envolveram em sequestros, tráfico de drogas, extorsão e assassinatos.

Uma tentativa de extraditar o ex-comandante das Farc Jesús Santrich para os Estados Unidos sob a acusação de tráfico de drogas fracassou até agora, mas causou irritação entre outros líderes das Farc que dizem que Duque quer prendê-los a qualquer custo, apesar dos acordos.

Sergio Guzmán, diretor da Colombia Risk Analysis, consultoria de risco baseada em Bogotá, disse que as tentativas do governo de "reinserir" ex-rebeldes na vida civil foram contidas pela violência, a discriminação e o fracasso de alguns projetos de emprego criados em conjunto com o acordo de paz. 

"Não ajuda o caso do governo para reinserção o fato de que muitos projetos produtivos não estão conseguindo decolar, seus ex-camaradas continuam sendo estigmatizados pelo partido governante e um número recorde de mortes de ex-membros das Farc continua sem investigação e punição", disse Guzmán.

O governo afirma que apoia 186 projetos individuais e coletivos que beneficiam 1.404 ex-combatentes com investimentos de mais de US$ 4 milhões. Alguns dos projetos são em áreas onde as Farc já tiveram presença armada.

Líderes da Força Alternativa Revolucionária do Comum, que compartilha a sigla Farc e é o partido político formado depois da assinatura do acordo de paz, advertiram que a morte de 139 ex-combatentes também impeliu o aumento na dissidência. 

Eles culparam grupos paramilitares de extrema direita por muitas das mortes.

O documento militar também mostrou que o número de combatentes do Exército de Libertação Nacional (ELN), de esquerda, aumentou quase 8%, para 2.400, desde o final do ano passado. 

O ELN realizou negociações de paz com o governo de Santos, mas Duque os cancelou indefinidamente depois de um ataque a bomba em janeiro em Bogotá reivindicado pelo grupo.

Hoje, segundo o relatório de inteligência militar, 45% dos combatentes do ELN —incluindo seus comandantes— estão escondidos na vizinha Venezuela e recebem proteção do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, de esquerda. 

O governo socialista da Venezuela admitiu ao longo dos anos que o ELN entra no país, mas nega apoiar o grupo rebelde. 

"O ELN considera os estados venezuelanos na fronteira com a Colômbia sua retaguarda estratégica", disse Navarro, acrescentando que o crescimento do ELN e das Farc é "um risco e temos de contê-lo".

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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