Em Madri, governo quer tirar multa por poluição defendida por moradores

Novo prefeito, de direita, busca suspender iniciativas criadas pela antecessora

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São Paulo

Na última semana, manifestantes e a prefeitura de Madri viveram uma queda de braço sobre uma multa. Mas as posições fogem do usual: o governo quer suspender a punição, enquanto os ativistas a defendem.

A multa em questão faz parte do projeto Madrid Central, que bloqueou o acesso de carros poluentes ao centro da cidade com o objetivo de melhorar a qualidade do ar.

Manifestantes protestaram contra fim de multas em Madri em 29 de junho - Juan Medina/Reuters

O veto entrou em vigor em novembro de 2018, durante o governo de Manuela Carmena. Há várias regras: veículos a gasolina feitos antes de 2000 ou a diesel produzidos antes de 2006 pagam a punição máxima, de 90 euros (R$ 390). Modelos elétricos são liberados, assim como carros de moradores, entre outras exceções.

Carmena, 75 (do Más Madrid, de esquerda), não conseguiu formar maioria no Parlamento local após as eleições de maio, sendo ultrapassada pela coalizão de direita, liderada por José Martínez-Almeida, 44 (PP). Entre as promessas de campanha de Almeida estava o fim do Madrid Central. 

Ele tomou posse em 15 de junho e determinou o fim das multas a veículos poluentes que entrassem no centro entre 1º de julho e 30 de setembro, enquanto revisa o programa.

O anúncio revoltou ativistas ambientais, políticos de esquerda e parte dos moradores. Eles se uniram e criaram a Plataforma em Defesa de Madrid Central, que junta 80 entidades. No último dia 29, um protesto no centro madrilenho reuniu 10 mil pessoas, segundo a polícia, e 60 mil, de acordo com os organizadores.

Pesquisa feita em abril pela prefeitura apontou que o Madrid Central tinha aprovação de 60% dos madrilenhos.

A semana foi marcada por uma guerra de versões. Grupos contrários divulgaram informes e relatos de motoristas de ônibus de que o trânsito piorou, o que também foi constatado pela imprensa local.

Já o novo prefeito publicou dados dizendo que, quatro dias após a liberação, o ar da cidade havia ficado mais limpo e que o trânsito havia caído em algumas vias. No entanto, a comparação foi feita com a semana anterior, quando as férias não haviam começado. 

Na quarta (3), a Federação de Taxistas de Madri aderiu à Plataforma e pediu coerência. Forçados pelas novas leis, taxistas compraram carros elétricos e híbridos para poder rodar na área central. A possibilidade de uma reviravolta traz a sensação de que o gasto pode ter sido em vão.

 

Na sexta (5), uma liminar determinou a volta das multas e deu três dias úteis para a prefeitura apresentar seus argumentos. Depois disso, haverá uma nova sentença. 

A restrição no centro de Madri segue iniciativas semelhantes de cidades como Londres e Paris e busca adequar o ar da cidade aos padrões da União Europeia, algo que a capital espanhola nunca atingiu.

Ativistas apontam que a poluição na cidade baixou em 15 das 24 estações na rede, na comparação entre 2019 (com a restrição em vigor) e 2018. A única estação dentro da área de bloqueio teve queda de 32% nos níveis de contaminantes desde o ano passado. 

 

Já o governo afirma o contrário: o veto está piorando a poluição. Almeida divulgou em redes sociais que houve piora na qualidade do ar em 19 das 24 estações desde o início da restrição —embora os pontos onde houve melhora fiquem justamente na área de veto aos carros. O prefeito não deixou claro o período de comparação, e politizou o assunto. “Não aceitarei uma só lição da esquerda na luta pela qualidade do ar.”

Como estratégias para combater a poluição, Almeida defende estimular a compra de carros mais modernos, renovar a frota de ônibus e ampliar o uso de bicicletas. 

O novo governo também toma medidas para atingir outras bandeiras ligadas à esquerda, como o fechamento de um escritório municipal de direitos humanos e memória. 

 

Eleita em 2015, Carmena fez um mandato marcado pela redução da dívida da cidade. Na hora de montar as coligações em busca da reeleição, houve um desentendimento entre seus aliados. O Podemos, segundo maior partido de esquerda, negociava entrar na chapa, mas foi surpreendido por um de seus membros, Íñigo Errejón, que anunciou parceria com a então prefeita e a criação de uma nova legenda, o Más Madrid.

A sigla de Carmena foi a mais votada, com 30%, mas Madri segue modelo parlamentarista: partidos precisam formar maioria para assumir a prefeitura. Assim, PP e Cidadãos, que juntos atingiram 43%, conquistaram o governo.

Após a vitória, houve um racha na direita. PP e Cidadãos não possuem maioria para aprovar medidas, e precisam chegar a um acordo com o Vox, da direita nacionalista. O Cidadãos se recusa a permitir a presença desse partido no Executivo, por discordar de suas propostas radicais. 

A esperança da esquerda é que o racha ajude a travar os planos de desmontar projetos da esquerda dos últimos anos e a manter os carros poluentes longe do centro da capital. 

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