Junta militar e oposição chegam a acordo de transição no Sudão

Impasse sobre liderança civil ou militar até eleições foi resolvido, afirma mediador

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Cartum (Sudão) | AFP

Os militares no poder no Sudão e os líderes do movimento de oposição civil chegaram a um acordo na sexta-feira (5, quinta à noite no Brasil) sobre a instância que dirigirá o futuro período de transição, anunciou o mediador da União Africana (UA), Mohamed El Hacen Lebatt.

"As duas partes concordaram com a instauração de um Conselho Soberano com alternância de poder entre militares e civis, durante um período de três anos ou um pouco menos", afirmou Lebatt, após semanas de queda de braço política entre os dois lados. 

O mediador não detalhou o mecanismo, mas, segundo o plano de transição estabelecido por delegados da UA e da Etiópia, o Conselho Soberano deverá ser presidido inicialmente por um militar, durante 18 meses. Ao fim desse período, ele será substituído por um civil, que permanecerá na liderança até o final da transição.

Graças à mediação de Etiópia e UA, os dois lados voltaram a negociar na quarta-feira (3), focando principalmente a questão da chefia da instância de transição. 

A retomada dos diálogos ocorreu em um contexto tenso, após a repressão violenta a um protesto diante do Quartel-General do Exército na capital, Cartum, no dia 3 de junho, que deixou dezenas de mortos.

Dois dias depois, médicos ligados à oposição anunciaram a retirada de 40 corpos do rio Nilo na cidade. Segundo o Comitê de Médicos Sudaneses, houve mais de cem mortos —não foi divulgado um número oficial. 

As duas partes também concordaram com "uma investigação minuciosa, transparente, nacional e independente sobre todos os incidentes violentos das últimas semanas no país", disse Lebatt.

Instabilidade política

País africano de língua árabe localizado ao sul do Egito, o Sudão vive desde 19 de dezembro uma onda de protestos que inicialmente pediam a queda do ditador Omar al-Bashir. Ele foi deposto no início de abril pelas Forças Armadas sudaneses.

Bashir chegou ao poder em 1989 por meio de um golpe militar que derrubou Sadiq al-Mahd, eleito democraticamente.

Um dos motivos que deram início aos protestos foi a crise econômica —a inflação subiu para 70% nos últimos anos. O país perdeu importantes receitas com petróleo após a independência do Sudão do Sul, conquistada em plebiscito em 2011. 

O estopim das manifestações foi o aumento do preço do pão, cujos subsídios haviam sido cortados pelo governo.​ Apesar dos protestos, o regime de Bashir era apoiado por países da região. Seu partido, o Movimento Islâmico, é alinhado ideologicamente com a Turquia e o Qatar. 

Desde abril, o país é controlado por uma Junta Militar, que é contestada pelos manifestantes, que exigem que o período de transição (até a realização de nova eleições) seja liderado por civis. 

​Bashir no poder

Em 1996, o Sudão teve eleições presidenciais e parlamentares contestadas. Havia 40 candidatos concorrendo para tirar Bashir do poder, mas grupos de oposição consideravam as eleições injustas. Devido à guerra civil no sul do país, não houve votação em 11 regiões. 

De acordo com o resultado final da apuração dos votos do restante do Sudão, Bashir saiu vencedor naquela ocasião e declarou que o governo continuaria seguindo preceitos islâmicos e que não haveria retorno a uma política de partidos durante seus próximos anos no poder.

​O regime de Bashir foi acusado de alienar as comunidades não muçulmanas do Sudão, cuja população é de 40 milhões de habitantes. Além disso, recaem contra ele acusações de massacres e estupros coletivos cometidos pelo Exército em Darfur, na região sudoeste, em um conflito que já deixou mais de 300 mil mortos (a maioria não-árabe) desde 2003.

Bashir é considerado foragido pelo Tribunal Penal Internacional, em Haia (Holanda), responsável por julgar crimes contra a humanidade.

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