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'Matei minha irmã com um disparo acidental'

Sean Smith matou sua irmã pequena com disparo acidental quando tinha dez anos; três décadas depois, ele fala à BBC sobre o impacto do acidente em sua vida e na de sua família

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"Atirei nela; não foi minha intenção", diz a voz infantil e angustiada na gravação do 911, o serviço de emergência dos Estados Unidos.

"Minha irmã está sufocada", acrescenta o menino.

Operador: "Ela está sufocada?"

"Está morta".

"Está morta?"

"Sim, por favor, chame minha mãe e meu pai. Oh, meu Deus!"

Sean Smith matou sua irmã pequena, Erin, com um disparo acidental quando tinha dez anos
Sean Smith matou sua irmã pequena, Erin, com um disparo acidental quando tinha dez anos - Arquivo pessoal

Era a tarde de 5 de junho de 1989, em um subúrbio de Fort Lauderdale, na Flórida (EUA), quando as vidas de Sean Smith e de sua família mudariam para sempre.

Sean e sua irmã, então com 10 e 8 anos, chegaram da escola, alguns minutos antes da mãe.

Sean foi procurar seus videogames e, por algum motivo, olhou nas gavetas do quarto de seus pais. Ele encontrou o que ele pensou ser uma arma de brinquedo e decidiu brincar com ela.

"Mesmo tendo acontecido 30 anos atrás, lembro como se fosse ontem", diz Sean à BBC.

Pistola carregada

Na noite anterior, houve um assalto no bairro. "A área ficou cheia de policiais, os cães latiam agitados", lembra Lee Smith, mãe de Sean.

O pai de Sean tirou a arma da gaveta e carregou-a. "Foi a arma do meu sogro ou da minha sogra, de alguns dos dois. Eles a deram ao meu marido para livrar-se dela", conta Lee.

Por volta das três da manhã, o pai foi dormir e deixou a arma carregada na gaveta.

No dia seguinte, Sean a encontrou.

O menino pegou a arma com a mão esquerda —ele é canhoto — e apontou para a janela. De acordo com Sean, Erin não queria entrar em apuros, se assustou e correu.

Infelizmente, a menina atravessou no momento em que Sean fez um disparo acidental. A bala atravessou o coração de Erin.

"A última imagem que tenho é da minha irmã morrendo no meu colo", diz Sean. "É uma imagem que definitivamente nunca vou apagar da minha cabeça."

30 anos depois, Sean Smith lembra da morte da irmã como "se fosse ontem"
30 anos depois, Sean Smith lembra da morte da irmã como "se fosse ontem" - BBC News Brasil

Tragédia e repercussão

Quando Lee chegou em casa, viu que a polícia estava em toda parte.

"Aconteceu tão rápido, os acidentes acontecem rapidamente", diz.

A família não só precisou se recuperar da tragédia, mas também das reações dos outros.

"No começo as pessoas nos apoiavam, nós éramos o centro das atenções, sem dúvida, mas não era como se elas se importassem conosco; queriam tomar partido", diz Lee.

"Havia pessoas que perguntavam se ele havia feito isso de propósito", disse ele. "Essa foi a parte mais difícil, as pessoas emitiram suas opiniões sobre coisas que não sabiam."

Lee observa que Sean estava muito preocupado em proteger sua irmã. "Se você vê alguma foto de Sean e Erin juntos, eles sempre estão se abraçando."

Mas para Sean a vida após a morte de Erin foi muito mais difícil.

Roubo e drogas

"Me lembro de querer voltar para a escola só para me sentir normal de novo", explica. Rapidamente, ele descobriu que os outros estavam mais interessados em saber o que ele havia feito.

Quando entrou na adolescência, as coisas pioraram. Sean confessa que muitos anos se passaram sem ele falar com seu pai, ou porque todos se culparam pelo que aconteceu ou porque culpavam um ao outro.

"Estava carregando toda essa culpa, me tornei autodestrutivo, perdendo todas as oportunidades que conseguia", reconhece.

Então, as drogas entraram em sua vida.

Mas tudo mudou quando ele descobriu que seria pai. "Tinha de ser responsável, não só por mim, mas porque eu tinha responsabilidade sobre outra pessoa", diz ele.

Finalmente, deu entrada em uma clínica para dependentes químicos e iniciou um processo de recuperação.

Sean diz que reza todas as manhãs à procura de perdão e encontrou serenidade indo à praia de manhã cedo, quando há poucas pessoas.

"Tive o prazer de ver o sol nascer várias vezes e isso definitivamente me conectou com ela (minha irmã)", revela.

Nos Estados Unidos, cerca de 4,6 milhões de crianças vivem em casas onde há armas em locais não seguros.

Três em cada quatro sabem onde essas armas são guardadas.

Na mesma semana em que Sean matou sua irmã, duas crianças morreram e outras duas ficaram feridas em acidentes semelhantes na Flórida.

"As crianças sempre terão curiosidade em armas; por isso, tê-las em casa é incentivar essa curiosidade", diz Lee Smith.

"Aconteceu em um milésimo de segundo e muda a sua vida para sempre", conclui.

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