Paredes de post-its expõem vozes de honcongueses contra a China

Manifestantes protestam contra aumento do controle de Pequim sobre o território semiautônomo

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São Paulo

Um post-it colorido e uma caneta: dois simples materiais de escritório bastam para milhares de manifestantes em Hong Kong.

Ao ocuparem as ruas do território na recente onda de protestos, muitos ativistas vêm fazendo de paredes públicas murais nos quais expressam sua oposição à proposta de lei que prevê o envio de suspeitos para serem julgados pelos tribunais da China continental.

Muros em diversos pontos da cidade e de distritos ao redor estão sendo preenchidos, do chão ao teto, por post-its rosas, amarelos, azuis e roxos com mensagens como “não à extradição para a China”, “nós amamos Hong Kong”, “lute por Hong Kong” e “abaixo à brutalidade da polícia”.

As paredes são chamadas de “Lennon Walls” (muros de Lennon), nome tirado de um muro situado próximo à embaixada francesa em Praga, na República Tcheca. No final dos anos 1940, o local foi usado como tela para a juventude do país vociferar contra a instauração do comunismo na então Tchecoslováquia.

Com a morte de John Lennon, em 1980, a parede passou a receber grafites, pinturas e trechos de letras do ex-beatle —além de frases de apoio às mais diversas causas.

Em Hong Kong, a primeira Lennon Wall apareceu nos protestos pró-democracia de 2014: uma grande escadaria na entrada de um dos prédios do governo foi coberta por bilhetes multicoloridos escritos à mão pedindo eleições diretas e a renúncia do então chefe do executivo local, CY Leung.

As notas traziam ainda palavras de encorajamento para o Movimento dos Guarda-Chuvas, assim chamado porque os ativistas usavam o item para se proteger das bombas de gás jogadas pela polícia.

“As ruas de Hong Kong são cheias de sinais e pôsteres, mas quase todos são comerciais. O Movimento dos Guarda-Chuvas deu às pessoas a oportunidade de se expressarem verdadeiramente no espaço público”, diz Cristopher DeWolf, autor de livro sobre a cultura urbana moderna de Hong Kong.

Embora sob o domínio de Pequim, a ex-colônia do Reino Unido dispõe de relativa autonomia garantida pelo tratado firmado entre chineses e britânicos em 1997, quando o território voltou a pertencer à China.

Após um mês de protestos, que teve inclusive uma invasão ao Parlamento, a chefe-executiva Carrie Lam afirmou que o projeto de lei de extradição estava “morto”, porém se negou a anunciar a retirada total do texto.

Há uma diferença entre os protestos de hoje em comparação aos de 2014: a proporção. Neste ano, os post-its estão sendo espalhados por muros, passagens de pedestre e pontes por todo o território, ultrapassando a escadaria original, que também está colorida. 

Isso inclui redutos favoráveis ao Partido Comunista, como a ilha de Cheung Chau, e vizinhanças próximas à fronteira com a China continental.

As manifestações estão “mais fluidas” e “esparramadas”, afirma DeWolf, atingindo mais pessoas e saindo do núcleo dos protestos: o entorno dos prédios que sediam o Executivo de Hong Kong, no distrito de Admiral. Para se ter ideia da dimensão do fenômeno, basta buscar a hashtag #lennonwall nas redes sociais. 

Encontra-se um vídeo de uma estação de metrô no distrito de Tai Po cujas paredes estão tomadas de post-its, e também o chão, onde foram colados cartazes com o rosto de Carrie Lam e de outros políticos para que sejam propositalmente pisados por quem passa.

Até agora, não houve confrontos entre manifestantes e polícia devido aos post-its, embora as forças de segurança tenham removido das paredes cartazes com informações pessoais de alguns policiais.
As brigas se dão, isto sim, entre os ativistas e os cidadãos pró-Pequim que querem descolar os bilhetes, numa tentativa de “limpar” as paredes. 

Três homens de meia-idade foram detidos por tentarem impedir a colocação de novas notas, segundo o jornal South China Morning Post.

As colagens de papeizinhos coloridos têm ainda uma característica peculiar: a organização. “Os manifestantes sabem que estão sob os holofotes, então eles querem dar um bom exemplo, e ao mesmo tempo mandar uma mensagem sobre qual Hong Kong desejam —uma que seja democrática, mas também pacífica e ordenada”, afirma DeWolf.

“Acho que isto é em parte subconsciente, mas também uma atitude deliberada.”

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