Descrição de chapéu The New York Times

Estado Islâmico volta a ganhar força no Iraque e na Síria

Grupo terrorista está reorganizando suas redes financeiras e recrutando novos combatentes

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Eric Schmitt Alyssa J. Rubin Thomas Gibbons Neff
Washington | The New York Times

Cinco meses depois de forças apoiadas pelos EUA terem expulsado o Estado Islâmico (EI) do último pequeno território que controlava na Síria, o grupo terrorista está ganhando força novamente.

O EI está lançando ataques em pontos do Iraque e da Síria, reorganizando suas redes financeiras e até mesmo convocando novos recrutas num campo de refugiados comandado por aliados. A informação é de autoridades militares e de inteligência dos EUA e do Iraque.

O presidente Donald Trump anunciou a derrota total do EI este ano, mas autoridades de defesa na região dizem que o que restou do grupo terrorista está ali para ficar.

Um relatório do inspetor-geral divulgado neste mês avisou que a redução das tropas americanas na Síria ordenada por Trump, de 2.000 militares para menos da metade desse número, obrigou as forças americanas a reduzir seu apoio a forças aliadas sírias que combatem o Estado Islâmico.

Por enquanto, o único que as forças americanas e internacionais podem fazer é tentar garantir que o EI fique contido e longe de áreas urbanas.

Não há grande receio de que o EI recupere seu território físico anterior, um califado que chegou a alcançar uma superfície equivalente à da Grã-Bretanha e a controlar a vida de até 12 milhões de pessoas. 

Mas o grupo terrorista já mobilizou até 18 mil combatentes que permaneceram no Iraque e na Síria. Essas “células dormentes” já lançaram ataques com atiradores, emboscadas, sequestros e assassinatos de forças de segurança e líderes comunitários.

O Estado Islâmico ainda tem acesso a uma reserva de até US$ 400 milhões, dinheiro que ficou escondido no Iraque e na Síria ou foi levado clandestinamente a países vizinhos para ser guardado em segurança.

A organização também teria investido em negócios, incluindo a piscicultura, revendedoras de carros e plantações de maconha.

E o grupo recorre à extorsão para financiar operações clandestinas: agricultores no norte do Iraque que se recusam a pagá-lo tiveram suas plantações incendiadas.

Nos últimos meses o Estado Islâmico ganhou força em um grande campo de refugiados no nordeste da Síria, e não há nenhum plano pronto para lidar com os 70 mil moradores do campo, que incluem milhares de familiares de combatentes do EI.

Agentes de inteligência americanos dizem que o campo de Al Hol está se convertendo em terreno fértil para a propagação da ideologia do Estado Islâmico e a multiplicação de futuros terroristas. O campo é administrado por aliados curdos da Síria que contam com pouca assistência ou segurança.

A força curda síria, apoiada pelos EUA, também mantém mais de 10 mil combatentes do Estado Islâmico, incluindo 2.000 estrangeiros, em prisões improvisadas separadas do campo.

Em Al Hol, “a incapacidade dos curdos sírios de garantir mais do que segurança mínima no campo criou condições para a difusão inconteste da ideologia do Estado Islâmico”, disse o relatório do inspetor-geral, que foi redigido para o Pentágono, o Departamento de Estado e a Usaid (Agência para o Desenvolvimento Internacional dos EUA).

O Comando Central militar americano disse aos autores do relatório que “o EI provavelmente está aproveitando a falta de segurança para recrutar novos membros e reengajar os membros que deixaram o campo de batalha”.

Uma avaliação recente feita pela ONU chegou à mesma conclusão, dizendo que familiares de membros do EI que estão vivendo em Al Hol “podem acabar representando uma ameaça se não forem corretamente contidos”.

Descritas por funcionários de inteligência e militares iraquianos, americanos e de outros países ocidentais e documentadas em uma série recente de relatórios governamentais e da ONU, essas tendências revelam um Estado Islâmico em ascensão outra vez, não apenas no Iraque e na Síria mas também em suas filiais espalhadas da África ocidental ao Sinai.

Esse ressurgimento gera ameaças a interesses e aliados dos EUA, no momento em que a administração Trump reduz as tropas americanas na Síria e desloca sua atenção no Oriente Médio para a possibilidade de um confronto com o Irã.

“Por mais enfraquecido que o EI possa estar agora, ainda é um movimento verdadeiramente global, e nós estamos globalmente vulneráveis”, disse Suzanne Raine, ex-chefe do Centro Conjunto de Análise do Terrorismo, um organismo britânico, entrevistada neste mês no Centro de Combate ao Terrorismo da academia militar de West Point. “Nada do que vier a acontecer a seguir deve nos surpreender.”

Para os iraquianos das províncias do norte e oeste onde o Estado Islâmico foi ativo no passado, o clima de ameaça nunca desapareceu. Os ataques diminuíram, mas nunca chegaram a parar.

Nos seis primeiros meses deste ano houve 139 ataques nessas províncias —Níneve, Salahuddin, Kirkuk, Diyala e Anbar—, que deixaram 274 mortos.

Os mortos foram na maioria civis, mas também incluíram membros das forças de segurança iraquianas e de forças de mobilização popular, segundo relatos de forças de segurança iraquianas e civis compilados pelo New York Times.

No início deste mês, o sargento de artilharia Scott A. Koppenhafer, 35, morreu no norte do Iraque em uma operação com forças locais.

Quando atuam no Iraque, os marine raiders, que são forças de Operações Especiais, frequentemente combatem ao lado de peshmergas (combatentes curdos) ou de forças de operações especiais iraquianas.

Koppenhaffer foi o primeiro americano morto em combate no Iraque neste ano. Quatro americanos morreram em janeiro numa explosão suicida em Manbij, na Síria.

Relatos como esses fazem parte de várias novas avaliações feitas sobre a resiliência e o poder do Estado Islâmico.

Um relatório de julho redigido por analistas da ONU para o Comitê de Contraterrorismo do Conselho de Segurança disse que, apesar da derrota militar que sofreram na Síria e no Iraque, os líderes do EI estão “se adaptando, consolidando e criando condições para um eventual ressurgimento” nesses países.

Um novo relatório do inspetor-geral que avaliou as atividades do EI entre abril e junho concluiu que o grupo está “se reerguendo na Síria” e que já “fortaleceu sua capacidade de insurgência no Iraque”.

Não obstante esses relatórios, Trump continua a declarar que derrotou o Estado Islâmico completamente, contradizendo avisos reiterados de seus próprios setores de inteligência e contraterrorismo, para os quais o EI continua a representar uma força letal.

“Fizemos um ótimo trabalho”, disse Trump no mês passado. “Temos 100% do califado e estamos nos retirando da Síria rapidamente. Daqui a pouco estaremos fora desse país. E eles que cuidem de seus próprios problemas. A Síria pode cuidar de seus próprios problemas com o Irã, com a Rússia, com o Iraque, com a Síria. Nós estamos a 11 mil quilômetros de distância.”

Com 5.200 soldados no Iraque e pouco menos de mil na Síria, o papel militar dos EUA nesses dois países mudou pouco, não obstante a derrota territorial do Estado Islâmico em ambos.

Após a queda de Baghuz, o último ponto de resistência do Estado Islâmico na Síria, perto da fronteira do Iraque, os remanescentes dos combatentes da organização se dispersaram pela região, dando início a algo que autoridades americanas agora preveem ser uma insurgência duradoura.

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