Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Itamaraty veta livro com prefácio escrito por desafeto de Ernesto Araújo

Obra com texto de Rubens Ricupero foi escrita por um dos maiores historiadores da diplomacia brasileira

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São Paulo

O Itamaraty se recusou a publicar um livro de um dos maiores historiadores da diplomacia brasileira porque o prefácio foi escrito por um desafeto do chanceler Ernesto Araújo.

O embaixador Synesio Sampaio Goes Filho foi incumbido pela Funag (Fundação Alexandre de Gusmão), braço cultural e pedagógico do ministério, de escrever a biografia de Alexandre de Gusmão, que batiza a fundação.

Gusmão, conhecido como “avô da diplomacia brasileira”, foi um diplomata com papel crucial nas negociações do Tratado de Madri (1750), que determinou os limites territoriais das colônias portuguesas e espanholas na América do Sul.

Em julho deste ano, quando entregou à diretoria da Funag os originais de “Alexandre de Gusmão (1695-1753): O Estadista que Desenhou o Mapa do Brasil”, Goes Filho foi informado de que o livro só seria publicado se ele retirasse o prefácio escrito por Rubens Ricupero, ex-embaixador em Washington e também historiador da diplomacia.

Ricupero já fez muitas críticas ao chanceler e aos rumos da política externa no governo Bolsonaro.

Para Goes Filho, trata-se de censura. “Isso é censura, obscurantismo; desse jeito nenhum embaixador de prestígio vai poder publicar”, disse à Folha.

O prefácio escrito por Ricupero tratava exclusivamente da trajetória de Gusmão.

“É um assunto do século 18, e o autor foi vetado porque critica o ministro, não pelo que escreveu”, disse Goes Filho. “E o Itamaraty fica, perto dos 200 anos da Independência, sem um texto sobre o estadista.”

O diplomata Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda no governo Itamar e ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos
O diplomata Rubens Ricupero, ex-ministro da Fazenda no governo Itamar e ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos - Marlene Bergamo - 20.set.16/Folhapress

O Itamaraty afirmou que o livro havia sido aprovado pelo conselho editorial da Funag sem o prefácio de Ricupero, e que Goes Filho apresentou o texto apenas posteriormente.

 

“Obviamente achei que só iria enriquecer a obra, afinal Ricupero é autor de grandes livros sobre a história da diplomacia, como ‘A Diplomacia na Construção do Brasil (1750-2016)'.“ 
 
Entre as atribuições da Funag estão “apoiar a preservação da memória diplomática do Brasil” e a “edição e reedição de livros sobre história diplomática do Brasil, política externa brasileira e temas de relações internacionais relevantes para a diplomacia brasileira”. 

Goes Filho é autor de “Navegantes, Bandeirantes, Diplomatas: um Ensaio sobre a Formação das Fronteiras do Brasil (2001)”, livro que é um dos mais vendidos da Funag e considerado leitura essencial para diplomatas. 

A tendência de ideologização do Itamaraty começou nos governos do PT. Sob Lula e Dilma, diplomatas que não se alinhavam à ideologia petista foram escanteados, e privilegiaram-se temas como integração com países do hemisfério Sul e reforma das instituições multilaterais em detrimento da relação com os Estados Unidos, por exemplo.

No entanto, segundo fontes diplomáticas ouvidas pela Folha, a ideologização foi exacerbada durante o governo Bolsonaro, com diversos nomes e tópicos vetados, e ênfase em temas controversos como o globalismo.

A próxima conferência a ser realizada pela Funag, por exemplo, é “Política Educacional Globalista”, proferida por Charlotte Thomson Iserbyt.

Ela é autora do livro “The Deliberate Dumbing Down of America” (a idiotização proposital da América, em português).

Segundo o prefácio da obra, escrito por Sam Blumenfeld, o livro revela as mudanças realizadas no sistema educacional americano para “reduzir a influência dos pais das crianças (religião, moral, patriotismo) e transformá-las em membros do proletariado em preparação para um mundo socialista coletivista no futuro”.

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