Em uma extensão da crise italiana que parece não ter fim, o presidente do país, Sergio Mattarella, estabeleceu a próxima terça-feira (27) como o fim do prazo para que os partidos se articulem e formem um novo governo.
"Esta crise deve ser resolvida em um curto espaço de tempo", disse Mattarella em pronunciamento nesta quinta-feira (22). Se, dentro de cinco dias, as siglas não chegarem a uma definição, uma nova eleição será convocada.
Desse intervalo poderá sair um novo governo formado pelo Movimento 5 Estrelas (crítico à elite política) e o Partido Democrático (a centro-esquerda tradicional), adversários no passado e que teriam maioria no Parlamento para definir um novo premiê.
O objetivo dessa manobra, segundo integrantes das duas siglas, seria barrar a ascensão do radicalismo do vice-premiê e ministro do Interior, o populista Matteo Salvini. Ele é um dos articuladores da crise deste governo italiano, iniciado há 14 meses, e que viu o primeiro-ministro, Giuseppe Conte, renunciar na terça (20).
Como o país é um regime parlamentarista, o presidente Sergio Mattarella é uma espécie de árbitro que tem funções decorativas e não participa do governo. Mattarella, no entanto, tem de definir o rito do processo. Caso não tivesse encontrado uma solução até a tarde desta quinta-feira, o Parlamento seria dissolvido, e novas eleições seriam convocadas —três anos e meio antes do programado.
A antecipação do pleito não é uma perspectiva atraente, uma vez que a Itália encontra-se altamente endividada e com crescimento estagnado. Em caso de novas eleições, elas seriam realizadas no mesmo momento que o país elaborará o orçamento para 2020.
O processo de consulta aos partidos com representação no Parlamento foi iniciado na quarta-feira (21), depois de o presidente italiano aceitar a renúncia de Conte.
Ao se encontrar com Mattarella nesta quinta-feira, Luigi Di Maio, líder do Movimento 5 Estrelas, não mencionou o Partido Democrático, mas reforçou que seu partido está trabalhando para evitar o retorno às urnas.
“Nas últimas horas, todos os contatos necessários foram acionados para encontrar uma maioria sólida”, afirmou.
Já o líder do Partido Democrático entregou ao presidente uma lista com dez pontos de um eventual programa de governo, que inclui propostas de defesa para o meio ambiente e reformas para a Justiça, o Trabalho e o Parlamento.
De antemão, Nicola Zingaretti, líder do Partido Democrático, exigiu que o próximo governo não seja liderado pelo premiê Conte, que não teria feito oposição às ambições anti-imigratórias de Salvini.
Mudanças nas políticas de imigração estão entre as condições estabelecidas por Zingaretti para chegar a uma união que envolva a centro-esquerda. Além desse ponto, o pedido por uma adesão leal à Europa, crescimento com sustentabilidade ambiental e maior redistribuição de investimentos estão na lista de pedidos.
Ainda que uma série de obstáculos esteja colocada para a concretização da aliança entre os dois partidos, o mercado italiano já sinaliza sua preferência pelo acordo.
A renúncia de Conte no início da semana foi o desfecho de uma crise que eclodiu no dia 8, quando Salvini, líder do partido de ultradireita Liga, apresentou uma moção de desconfiança contra o premiê.
O partido de Salvini, a Liga, compunha a aliança com o populista Movimento 5 Estrelas que dava sustentação a Conte.
Para Salvini, o objetivo é se tornar o próximo primeiro-ministro da Itália. Se houver eleição até novembro, como deseja o líder da Liga, não parece haver outro adversário capaz de derrotá-lo nas urnas.
No último ano, ele se transformou no político mais popular do país e tem cerca de 36% das intenções de voto. Se a atual crise for resolvida no Parlamento, no entanto, seu partido não tem maioria.
Para o cientista político Giovanni Orsina, diretor da Escola de Governo da Luiss, “provavelmente Salvini errou no tempo e não calculou as reações contrárias, mas não sabemos se essas reações contrárias vão prevalecer”.
“A política na Itália é sempre maquiavélica e psicótica.”
A crise na Itália
mar.2018Os partidos A Liga (extrema-direita) e Movimento 5 Estrelas (anti-sistema) conquistam votação expressiva nas eleições e debatem formar uma coalizão
jun.2018 Os líderes dos dois partidos, Matteo Salvii (Liga) e Luigi di Maio (5 Estrelas) chegam a um acordo para formar o governo e Giuseppe Conte, um independente, toma posse como premiê
mai.2019A Liga é o partido mais votado (34%) nas eleições para o Parlamento Europeu. O 5 Estrelas (17%) fica em terceiro lugar, num sinal de perda de força
jul.2019A Liga é alvo de processo pela acusação de receber doações de campanha da Rússia de modo ilegal
7.ago.2019Senado aprova nova linha de trem para a França. A Liga defende o projeto, mas o 5 Estrelas tenta barrá-lo, por envolver questões ambientais
8.ago.2019A Liga convoca uma moção de desconfiança contra o governo e Salvini pede novas eleições
20.ago.2019Conte renuncia ao cargo
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