Descrição de chapéu The Washington Post

Venda de armas é crucial para negócios da Walmart, palco de massacre no Texas

Companhia é tida como maior comerciante mundial do produto no varejo

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Derek Hawkins Morgan Krakow
Washington | Washington Post

A violência armada recente em lojas da Walmart, com pelo menos 20 pessoas mortas por um atirador em El Paso, Texas, no sábado (3) e duas no Mississippi alguns dias antes, chama a atenção para a história complexa da empresa no que diz respeito às vendas de armas.

As armas de fogo sempre foram um elemento crucial dos negócios da empresa. Além de ser a maior rede varejista do mundo, a Walmart frequentemente é descrita como a maior vendedora mundial de armas no varejo.

O fundador da Walmart, Sam Walton, usava e apreciava armas. Adepto da caça esportiva, abriu sua maior loja, em Bentonville, no Arkansas, especificamente para estar perto do rancho de seus sogros, onde caçava codornas.

Sua arma favorita era a espingarda Remington, como destacou certa vez a revista de caça e pesca Field & Stream. Ele era um fã tão devoto que, quando morreu, a Remington lançou um modelo comemorativo com seu nome.

Mas o relacionamento da Walmart com as vendas de armas virou inconstante nos últimos 26 anos, desde que a empresa tomou a decisão histórica de parar de vender armas de pequeno porte.

Com a mudança no rumo dos ventos econômicos e políticos, a política da companhia em relação às armas também variou, se bem que a tendência geral tenha sido de intensificar as restrições.

Em julho, quando uma nova lei entrou em vigor no estado do Novo México, a empresa anunciou que deixaria de vender armas nesse estado.

A lei requer verificações de antecedentes para quase todas as vendas de armas a particulares, excetuando antiguidades e vendas feitas a parentes. A legislação autoriza empresas com licença federal para vender armas, como é o caso da Walmart, a realizar as verificações de antecedentes.

A Walmart deixou de vender armas porque não tinha meios de realizar essas verificações no caso de vendas a particulares.

Como divulgou a agência de notícias Associated Press, um cenário em que indivíduos pudessem entrar numa loja da rede portando suas armas e solicitar uma verificação de antecedentes poderia criar uma situação confusa ou perigosa.

No ano passado a companhia anunciou que elevará a idade mínima para a compra de armas e munições de 18 para 21 anos e deixará de vender produtos que se assemelham a fuzis de assalto, como armas de brinquedo e espingardas de ar, como noticiou o Washington Post.

A empresa disse em comunicado que tomou a decisão “à luz de acontecimentos recentes”, numa alusão evidente ao massacre recente numa escola de segundo grau em Parkland, Flórida, que deixou 17 mortos.

Foi um reconhecimento incomum por parte da rede, que em muitos momentos atribuiu suas mudanças de postura sobre vendas desses itens a fatores do mercado, mesmo quando havia outras questões presentes.

Quando decidiu deixar de vender armas de pequeno porte, em 1993, a companhia foi uma das últimas grandes varejistas a fazê-lo.

Outras como Sears e J.C. Penney já haviam tirado os produtos de suas prateleiras anos antes, como destacou o New York Times na época.

Neste ano, segundo o instituto de pesquisa Pew Research Center, os índices nacionais de homicídios e crimes violentos com armas de fogo atingiram níveis recordes.

Representantes da Walmart disseram que a empresa decidiu deixar de vender armas pequenas em suas 2.000 lojas porque pesquisas de marketing mostraram que as pessoas se sentiam incomodadas ao ver revólveres expostos ao lado de roupas e objetos domésticos.

As lojas continuaram a vender espingardas e rifles, mas algumas pessoas temeram que a eliminação das armas menores enfraqueceria o legado de Sam Walton, que havia morrido no ano anterior, em 1992.

“As armas eram algo que Sam gostava, eram um reflexo dele. As pessoas vão achar que isso enfraquece a tradição da Walmart”, disse ao New York Times Walter Loeb, presidente da firma de consultoria Loeb Associates Inc.

Outra grande iniciativa foi tomada em 2006, quando a Walmart anunciou que deixaria de vender qualquer arma de fogo em dois terços de suas lojas nos EUA. Na época, eram cerca de 3.000.

Mais uma vez a empresa disse que a decisão foi motivada pelo mercado, citando a “relevância menor para os consumidores” das áreas suburbanas e urbanas para onde a Walmart estava se expandindo.

E, novamente, entusiastas da caça esportiva e das armas de fogo acharam que a empresa estava se afastando de suas raízes esportivas, como destacou a Associated Press.

Dois anos mais tarde a Walmart dificultou a aquisição de armas de fogo em suas lojas que ainda as vendiam. A empresa aderiu a um plano liderado pelo então prefeito de Nova York Michael Bloomberg, que criou um banco computadorizado de aquisições dos itens, introduziu controles rígidos de estoques e criou sistemas para filmar todas as vendas.

O site The Trace, da Bloomberg, que cobre armas de fogo nos EUA, diz que a iniciativa deixou as políticas da Walmart mais rígidas que as verificações de antecedentes feitas pelo governo federal.

Mas as vendas da empresa caíram com a chegada da recessão econômica, em 2009. E, após um hiato de cinco anos na maioria de suas lojas, a Walmart voltou a vender espingardas, rifles e munição, como noticiou o Wall Street Journal em 2011.

Foi parte de um esforço maior para recuperar categorias de mercadorias vistas como “tradicionais”, como costura e equipamentos para atividades ao ar livre, depois do fracasso das tentativas da empresa de vender produtos mais “sofisticados”, segundo o Wall Street Journal.

E as vendas de armas estavam em alta na época, em parte devido ao medo de que a administração democrata as regulamentasse. Metade das quase 4.000 lojas da Walmart, incluindo algumas em áreas urbanas, começaram a vender armas de fogo novamente.

Em 2012, após o massacre em Newtown, Connecticut, a Walmart resistiu aos apelos para que deixasse de vender rifles como o Bushmaster AR-15, que o atirador Adam Lanza usou para matar crianças e professores na escola de primeiro grau Sandy Hook.

Mas, em um gesto de delicadeza para com as vítimas, disse um porta-voz da empresa à rede de televisão CNN na época, a companhia tirou a arma de seu catálogo online.

Enquanto isso, nas semanas seguintes ao ataque, os estoques de fuzis semiautomáticos em lojas Walmart em todo o país se esgotaram. A empresa chegou a ser obrigada a racionar as vendas de munições após a reeleição do presidente Barack Obama.

Porém, três anos e vários massacres mais tarde, a rede parou de vender o AR-15 e armas semelhantes.

Segundo a agência Reuters, o anúncio foi feito no mesmo dia em que uma jornalista de TV e seu cinegrafista foram baleados e mortos durante uma transmissão ao vivo na Virgínia. A companhia disse que sua decisão não teve relação com esse incidente ou qualquer outra chacina.

“Ela foi tomada unicamente com base na demanda dos consumidores”, disse à Reuters um porta-voz da empresa, Kory Lundberg. “Em vez disso estamos enfocando as armas de fogo usadas por caçadores e atiradores esportivos.”

Alguns especialistas no varejo reagiram com ceticismo, entre eles o consultor Burt Flickinger. Ele disse à Reuters que a decisão de deixar de vender armas de assalto refletia uma liderança que estava mais atenta para as questões sociais.

“Isso mostra que a Walmart de hoje é diferente da empresa das quatro décadas anteriores”, comentou na época.

O diretor-executivo Doug McMillan, que chefia a Walmart desde 2014, já destacou que quer atender o público que usa armas para caçar e para fins esportivos, o que Sam Walton gostava de fazer.

Essa mensagem foi reiterada no ano passado. Em fevereiro de 2018, dois meses após o massacre em Parkland, a Walmart anunciou em comunicado: “Aproveitamos a oportunidade para rever nossa política de armas de fogo".

“Nossa tradição como empresa sempre foi a de atender esportistas e caçadores. Vamos continuar a fazê-lo de maneira responsável.”

Não está claro ainda se a Walmart de El Paso vendia armas de fogo quando ocorreu o massacre nem onde o atirador suspeito obteve sua arma.

Tradução de Clara Allain 

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