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Político que mais cresceu na Europa, líder populista italiano enfrenta futuro incerto

Matteo Salvini inspirou nacionalismo estilo Donald Trump no continente

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CHICO HARLAN
Roma | The Washington Post

Até recentemente, Matteo Salvini era o político que mais crescia no continente europeu. Ele foi o inspirador do nacionalismo no estilo Trump na Europa Ocidental.

Seu próprio partido, com a promessa de colocar os "italianos em primeiro lugar", estava triunfando em partes do país há muito dominadas pela esquerda. 

Salvini acreditava que seu tempo no poder estava apenas começando. "Governaremos pelos próximos 30 anos", havia dito.

Agora Salvini parece ter desperdiçado prematuramente seu poder sobre o governo —enquanto ameaça o impulso que ajudou a transformar a Itália na fortaleza da extrema direita na Europa Ocidental.

O político italiano está de terno e gravata sorrindo para a foto
Matteo Salvini, líder da direita nacionalista na Itália - Filippo Monteforte/AFP

A mudança abrupta decorre do que é geralmente visto como um sério erro de cálculo, no qual Salvini tentou neste mês derrubar a coalizão governamental existente, que incluía seu partido, a Liga, forçar novas eleições e tornar-se primeiro-ministro. 

Mas ele não conseguiu prever o que afinal aconteceu: que dois partidos rivais tentariam interromper seu conflito de anos, dar-se as mãos e tentar formar uma nova coalizão, com o objetivo de adiar as eleições e impedir a ascensão de Salvini.

É muito cedo para contar Salvini fora do jogo. Ele lidera o partido mais popular do país, e pode polir suas credenciais anti-establishment na oposição.

Existe até uma possibilidade de que a discussão entre o Movimento Cinco Estrelas, antissistema, e o Partido Democrata, de centro-esquerda, fracasse.

Eles já estão brigando enquanto discutem cargos no gabinete e uma plataforma.

Mas se essa nova coalizão ganhar forma deixará a Liga fora do poder e forçará Salvini a assumir o papel de outros nacionalistas na Europa Ocidental: agir como uma voz perturbadora nas coxias, em vez de uma força de formulação de políticas que rompe regras, a partir de dentro.

O potencial revés de Salvini agrava os desafios enfrentados pelo bando de nacionalistas da Europa, que obtiveram ganhos modestos —e não o aumento esperado— nas eleições parlamentares europeias em maio passado.

Vários meses atrás, um escândalo derrubou um partido de extrema direita do governo da Áustria.

Os governos nacionalistas da Hungria e da Polônia continuam tendo amplos poderes, mas Salvini foi quem mais se esforçou para criar um bloco de extrema direita mais unificado.

Muitos dos partidos de extrema direita da Europa apontaram a Itália —membro fundador da União Europeia— como exemplo de que os partidos nativistas e anti-imigrantes podem ascender das margens para a corrente dominante.

Hoje a Itália se tornou o exemplo de uma dinâmica diferente, mostrando que outros partidos podem encontrar maneiras de enfrentar as forças de extrema direita que consideram perigosas ou antidemocráticas.

Mas para algumas figuras de extrema direita proeminentes o aparente revés de Salvini representa uma oportunidade para reunir as forças populistas.

Em entrevista por telefone, Stephen Bannon, ex-estrategista-chefe de Trump que tentou formar um movimento nacionalista na Europa, disse que Salvini "subestimou os tipos de acordos" que seus oponentes fariam para detê-lo.

Bannon argumentou que o erro de Salvini não foi "fatal" e que os italianos continuarão a apoiá-lo à medida que seu próximo governo se aproximar da UE.

"Acho que Salvini só ficará mais poderoso", disse Bannon. "Ele estará em oposição. Para aqueles em Bruxelas que pensam que venceram isso —todos os órgãos do establishment—, acho que ainda não viram nada."

O próximo governo, caso seja finalizado, ainda será chefiado pelo primeiro-ministro Giuseppe Conte.

Mas provavelmente funcionaria para desfazer alguns dos movimentos chaves de Salvini. O Partido Democrata disse que quer que o próximo governo seja totalmente pró-europeu.

Ele também quer revogar um decreto de segurança que impõe multas pesadas a proprietários e capitães de barcos que levarem embarcações de resgate de migrantes para portos italianos sem autorização. 

O líder do Movimento Cinco Estrelas, Luigi Di Maio, sinalizou que prefere manter a política de imigração de Salvini como está —um ponto de discórdia entre os novos parceiros.

Em pelo menos duas ocasiões, quando Salvini  —em seu cargo de ministro do Interior— fechou os portos para esses navios, políticos do Partido Democrata foram ao mar e embarcaram neles em sinal de solidariedade.

Salvini havia dito que outros países europeus, bem como os formuladores de políticas em Bruxelas, estavam exacerbando o problema migratório do continente, recusando-se a ajudar a Itália a dividir o fardo dos recém-chegados.

"Essa foi toda a abordagem do que Salvini estava fazendo —representar a migração como uma batalha contra a UE e os Estados membros", disse Andrew Geddes, diretor do Centro de Políticas Migratórias do Instituto Universitário Europeu, em Florença.

"Acho que agora você verá uma abordagem muito menos conflituosa."

Analistas políticos e pesquisadores que estudam o populismo dizem que a Liga ainda tem uma força profunda —com uma nota de aprovação de 34%, a mais alta do país.

Ela ajudou a reformular as atitudes nacionais, particularmente em relação à migração.

Se relegado à oposição, Salvini poderia ficar fora das próximas negociações orçamentárias que poderão gerar cortes de gastos impopulares. 

Salvini disse na semana passada que a vida na oposição seria "provavelmente mais fácil e mais confortável".

"De certa forma, entrar e sair do governo pode ser muito bom para ele", disse Rosa Balfour, pesquisadora sênior do Fundo Marshall Alemão dos Estados Unidos.

"Ele pode criticar tudo e voltar ao cargo com uma votação anti-establishment. A volatilidade da política italiana serve muito bem a um populista como Salvini."

Outros estão otimistas com o futuro de Salvini por um motivo diferente: eles simplesmente pensam que a mistura entre o Movimento Cinco Estrelas e o Partido Democrata, se acontecer, não durará muito.

Ambos os partidos estavam interessados em formar uma coalizão, preocupados com um fraco desempenho numa nova eleição.

Mas a Itália também tem um histórico de agitação por meio de personalidades políticas.

Apenas alguns anos atrás, Matteo Renzi, do Partido Democrata, chegou ao gabinete do primeiro-ministro, impetuoso e jovial, com um pouco de energia populista própria; mas ele deixou o cargo após perder um referendo constitucional em 2016.

Também não está claro se Salvini poderá continuar controlando completamente os holofotes públicos.

Nos 14 meses de seu governo de Liga-Movimento Cinco Estrelas, em que também atuou como vice-primeiro-ministro, ele capturou o país em suas postagens no Facebook e no Twitter, com uma mistura de campanhas e ataques a migrantes, às vezes misturando uma foto da praia.

Salvini até agora tentou descrever a nova coalizão como um casamento arranjado em Bruxelas —o que seus aliados e outros membros de seu partido ecoaram.

A Liga anunciou uma manifestação em Roma em outubro, e Salvini disse que, uma vez que o governo fracasse, "a palavra retornará aos italianos".

"Ninguém pode deixar de ver que o governo nascente não tem um projeto político", disse Massimiliano Fedriga, político da Liga que governa a região de Friuli-Venezia Giulia.

"Ele nasceu contra a Liga e contra Salvini."

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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