Ofensiva turca mata ao menos 26 na Síria; EUA sairão do norte do país

Ataque atinge comboio com jornalistas, e centenas de parentes de membros do EI fogem de instalação curda

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Beirute | Reuters e AFP

A ofensiva da Turquia contra os curdos no norte da Síria chegou ao quinto dia.

Bombardeios aéreos disparados por Ancara em uma importante cidade controlada pelos curdos neste domingo (13) geraram confrontos que possibilitaram a fuga de centenas de familiares de combatentes do Estado Islâmico (EI).

Os ataques mataram ao menos 26 civis, segundo informou o Observatório Sírio de Direitos Humanos.

Cerca de 950 pessoas —249 mulheres e 700 filhos de combatentes— escaparam de um campo na cidade de Ain Issa após atacarem os guardas do estabelecimento, segundo os curdos que governam a região.

Combatente apoiado pela Turquia deixa a cidade turca de Akcakale em direção à Tal Abyad, na fronteira do país com a Síria, no quinto dia da ofensiva de Ancara contra os curdos da região - Bulent Kilic/AFP

O campo em Ain Issa abrigava 13 mil deslocados pelas lutas contra a organização terrorista, e fica a 35 km da fronteira da Turquia com a Síria. Menos de 10% eram mulheres, viúvas e filhos de combatentes do EI —o campo não abrigava homens ligados à organização.

As autoridades curdas alertaram diversas vezes nos últimos dias que não teriam recursos para garantir as prisões e campos onde estavam combatentes do EI e seus parentes.

Quatorze estavam em um comboio que transportava civis e jornalistas de sete nacionalidades —incluindo supostamente um brasileiro— nas proximidades da cidade de Ras al-Ain. Procurado, o Itamaraty disse que a embaixada do Brasil em Damasco ainda estava apurando a informação, mas não havia nenhuma confirmação.

No momento do ataque, o comboio se dirigia para Ras al-Ain vindo de Qamishi, com o objetivo de mostrar apoio aos locais em meio aos bombardeios.

Uma autoridade curda afirmou que a bandeira do EI foi hasteada a meio do caminho entra Ain Issa e a fronteira com a Turquia, no que seria mais um sinal de que os curdos estão perdendo o controle da região para um grupo extremista que eles ajudaram a combater.

Os ataques contra a minoria curda no norte da Síria começaram na quarta (9), após o governo de Donald Trump anunciar a retirada das tropas americanas do país. Os EUA eram aliados dos curdos, que ajudaram soldados norte-americanos na luta contra o EI.

A fuga em massa neste domingo reacende o temor de que a organização possa ganhar força novamente numa região em que havia sido praticamente derrotada, e ocorreu horas antes de os EUA afirmarem que retirariam suas tropas remanescentes da área nas próximas semanas.

Segundo o Secretário de Defesa norte-americano, Mark Esper, mil tropas devem deixar o local nas próximas semanas. Cinquenta batalhões já saíram da Síria antes de os ataques turcos começarem.

Em entrevista para um programa da rede CBS, ele chamou a escalada de tensão na região de "uma situação muito terrível", acrescentando que os EUA se encontram no meio de uma batalha de dois exércitos opostos.

Esper falou também que as autoridades curdas estão negociando com os governos sírio e russo para formar uma aliança contra os turcos.

Dois oficiais ouvidos pela agência Reuters afirmaram que a saída das tropas será em questão de dias, um prazo mais curto do que o inicialmente previsto.

Até o momento, 109 quilômetros quadrados da área até então dominada pelos curdos foram conquistadas pelos turcos, segundo o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan.

Em entrevista para jornalistas em Istambul, ele afirmou que a incursão na Síria se estenderá de Kobani, no oeste, até Hasaka, no leste, adentrando cerca de 30 km no território do país. A área é maior do que a inicialmente prevista.

Na noite deste domingo, uma autoridade curda disse ter chegado a um acordo com o regime do ditador Bashar al-Assad para que as tropas governistas se posicionem ao longo da fronteira para impedir novas incursões turcas.

O objetivo da Turquia é controlar o norte da Síria para estabelecer uma "zona de segurança" de 32 quilômetros de extensão que separe sua fronteira dos territórios curdos. 

“O estabelecimento de uma zona de segurança é essencial para que sírios possam ter uma vida segura”, disse o ministério turco de Defesa, aludindo ao plano do presidente Erdogan de reassentar até 2 milhões de refugiados sírios no nordeste da Síria, área atualmente ocupada pelos curdos.

Desde que as ofensivas começaram, mais de 130 mil pessoas já foram forçadas a deixar suas casas, e o número de mortos cresce a cada dia. 

O saldo de óbitos é desigual. Até agora, dois soldados turcos e 16 rebeldes sírios apoiados por Ancara morreram. 

Do lado dos curdos o número é maior: 440 óbitos de combatentes da SDF (Forças Democráticas da Síria) foram registrados. As SDF foram a espinha dorsal da campanha liderada pelos EUA contra o Estado Islâmico.

As milícias curdas responderam lançando projeteis em direção ao sul da Turquia, matando 18 e ferindo 100, todos civis, e homens do Exército sírio estão se dirigindo para o norte do país para "confrontar uma agressão turca", informou a mídia estatal do país.

Líderes europeus demonstram preocupação. Em um telefonema na manhã de domingo com o presidente turco, a chanceler alemã Angela Merkel pediu a ele que interrompa imediatamente a operação militar no norte da Síria.

Emmanuel Macron, o presidente francês, afirmou que a ofensiva pode criar uma situação humanitária insustentável e ajudar o EI a se reerguer. O mandatário fará uma reunião emergencial para debater a situação.

Colaborou a Sucursal de Brasília

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