O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ameaçou nesta quinta-feira (10) liberar mais de 3 milhões de refugiados para entrarem na Europa caso os países do continente sigam questionando a operação militar feita por Ancara contra a minoria curda no norte da Síria.
Em menos de 24 horas, a ofensiva turca matou 174 pessoas, segundo o Ministério da Defesa turco. Erdogan classificou as vítimas como combatentes e terroristas.
Os curdos, porém, afirmam que nove civis foram mortos, enquanto o Crescente Vermelho (versão islâmica da Cruz Vermelha) diz que são sete vítimas civis e que há crianças entre elas.
Outras seis pessoas, incluindo um bebê de nove meses, morreram do lado turco da fronteira após um ataque com morteiros disparado a partir da Síria.
Nesta quinta, o presidente americano, Donald Trump, disse que pretende atuar como um mediador. "Temos três opções: enviar milhares de tropas e vencer militarmente, atingir a Turquia financeiramente ou mediar um acordo entre a Turquia e os curdos."
Trump disse também que está conversando com os dois lados e insistiu que a Turquia será punida financeiramente se não “jogar pelas regras”.
As operações militares começaram dois dias depois de os EUA se retirarem da região e afirmarem que não se oporiam à ação —o que foi considerado uma traição aos curdos.
Na sequência, Trump recuou e disse que não os tinha abandonado.
A Turquia é o país com mais refugiados no planeta segundo dados da Acnur (a agência da ONU destinada ao assunto). São 3,6 milhões de pessoas nessa situação, muito à frente do segundo colocado nesse ranking, o Paquistão, com 1,4 milhão de refugiados.
Isso porque a Turquia fez um acordo com a União Europeia para manter no país os milhões de sírios que fugiam da guerra civil, diminuindo assim o fluxo deles para os países do bloco.
Entenda o acordo de 2016 sobre refugiados
Refugiados que chegam pela Grécia
Turquia passou a receber de volta migrantes e refugiados pegos cruzando ilegalmente o mar Egeu rumo à Grécia. Quem já estava em solo grego antes do acordo foi distribuído entre os países do bloco
Regra do ‘um por um’
A cada refugiado enviado à Turquia, outro que estivesse em acampamentos turcos deveria ser enviado à UE, com limite de 72 mil transferidos. Pessoas que não tinham tentado chegar ilegalmente à Europa teriam prioridade
Ajuda financeira
A Turquia receberia da UE ajuda de 3 bilhões de euros (R$ 13,6 bi no câmbio atual) para auxiliar no assentamento de refugiados. O país alega que Bruxelas tem demorado a pagar os valores
Entrada no espaço Schengen
A UE retomaria as conversas sobre a entrada da Turquia no bloco e abandonaria a exigência de visto para turcos, o que ainda não foi cumprido
É esse combinado que Erdogan ameaça romper. “Vamos abrir os portões e mandar 3,6 milhões de refugiados seguirem seu caminho”, disse ele.
Esse contingente não inclui as 64 mil pessoas que já deixaram suas casas fugindo dos ataques, de acordo com a ONG International Rescue Committee (comitê internacional de resgate). As cidades de Ras al-Ayn e Darbasiya estão praticamente desertas.
A ofensiva militar começou na quarta (9) com diversos ataques aéreos a algumas cidades sírias próximas da fronteira com a Turquia e foi seguida por uma invasão terrestre.
Segundo as SDF (Forças Democráticas da Síria), coalizão de milícias lideradas pelos curdos, as cidades de Ras al-Ayn e Tal Abyad estão cercadas pelo Exército turco e por seus aliados do Exército Livre da Síria.
Reunião de emergência
Depois das ofensivas turcas na Síria, o chanceler francês, Jean-Yves Le Drian, convocou uma reunião de emergência da coalizão criada para combater o Estado Islâmico.
Le Drian disse que o grupo, que reúne mais de 30 países, precisa discutir os riscos de o grupo terrorista tirar vantagem da operação militar.
O comando dos curdos no norte da Síria acusou a Turquia de atacar uma prisão onde estavam detidos ex-combatentes do Estado Islâmico, em Chirkin. Nessa cadeia, havia presos de mais de 60 nacionalidades diferentes.
Um dos temores gerados pela ação turca é a de que ela abra caminho para que os integrantes do EI escapem e se reorganizem. A facção perdeu os territórios que chegou a dominar na Síria e no Iraque, mas não foi completamente derrotada.
As SDF mantêm presos milhares de ex-combatentes do EI, além dos familiares deles.
“O número de agentes protegendo as prisões diminui conforme as batalhas se intensificam. Isso gera um grande perigo [de fugas]”, disse Badran Jia Kurd, membro da cúpula das forças curdas.
Na quarta, França, Reino Unido e mais três países europeus pediram uma reunião no Conselho de Segurança da ONU para debater a ação turca. Os dois países, assim como Alemanha e Itália, criticaram o ataque. A reunião, que estava prevista inicialmente para quinta, deve ocorrer nesta sexta-feira (11).
Nesta quinta (10), o chanceler da Itália, Luigi Di Maio, classificou a operação como “inaceitável” e disse que outras ações similares no passado geraram mais terrorismo.
Erdogan considera os curdos terroristas e diz que a ação contra eles visa a proteger seu país e também abrir espaço para que os refugiados abrigados na Turquia possam ser realojados na Síria.
O presidente turco também criticou países do Oriente Médio, como Arábia Saudita e Egito. “Eles não são honestos, eles apenas maquiam palavras. Nós, contudo, fazemos ações, e essa é a diferença entre nós e eles”, afirmou.
A pedido do Egito, a Liga Árabe fará uma reunião no sábado (12) para discutir a operação turca na fronteira.
O Irã também condenou a operação e defendeu que ela seja suspensa imediatamente. A Rússia, aliada do regime sírio, disse que também planeja atuar como mediadora no diálogo entre a Síria e a Turquia.
O premiê israelense Binyamin Netanyahu, aliado dos Estados Unidos, também atacou a ação turca. “Israel condena fortemente a invasão turca de áreas curdas na Síria e alerta contra a limpeza étnica dos curdos pela Turquia e seus aliados. Israel está preparado para estender a ajuda humanitária ao valente povo curdo”, publicou Netanyahu em uma rede social.
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