Segurança é principal tema de eleição presidencial no Uruguai

País vive aumento da taxa de homicídios; pesquisas indicam segundo turno entre Frente Ampla e candidato liberal

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Buenos Aires

Neste domingo (27), os uruguaios decidem se querem seguir com a coalizão de centro-esquerda Frente Ampla, no poder desde 2005, ou se optam por um dos dois candidatos liberais na disputa.

Pesquisas recentes indicam que a primeira opção é favorita, mas não o bastante para impedir a realização de um segundo turno, em 24 de novembro.

A seu favor, a Frente Ampla, do ex-presidente José “Pepe” Mujica, 84, e do atual, Tabaré Vázquez, 79, tem o crescimento ininterrupto do país por 15 anos e a renovação de seus quadros. Com os principais líderes com idade avançada, a coalizão apresenta agora Daniel Martínez, 62, engenheiro que foi senador e prefeito de Montevidéu.

Os números da macroeconomia favorecem a coalizão. A previsão de crescimento do PIB neste ano é de 3,1%, segundo o FMI, a inflação está em 7%, e o desemprego, em 6,8%.

“O mérito das transformações que fizemos é que foram estruturais, portanto permanecerão no tempo, se o país continuar sendo bem administrado”, disse Martínez à Folha.

Com a Frente Ampla no comando do país, o Uruguai redirecionou exportações agropecuárias —agora para Ásia e Europa, com certificado de qualidade, principalmente quando a carne argentina se viu atingida pela febre aftosa— e fez investimentos em energia renovável e na diversificação da produção, principalmente nas áreas de serviços e de tecnologia.

O candidato da Frente Ampla e líder nas pesquisas, Daniel Martínez, agita a bandeira do Uruguai durante comício em Montevidéu
O candidato da Frente Ampla e líder nas pesquisas, Daniel Martínez, agita a bandeira do Uruguai durante comício em Montevidéu - Pablo Porciuncula Brune - 23.out.19/AFP

Outro setor que recebeu atenção é o turismo, hoje responsável por 8% a 10% do PIB, de acordo com dados do governo.

Mas nem tudo saiu bem. Por conta da má administração e de acusações de corrupção, o Uruguai perdeu sua companhia aérea nacional, a Pluna.

Também devido à corrupção, Vázquez perdeu seu vice-presidente, Raúl Sendic, acusado de ter usado um cartão de crédito do governo para fazer compras pessoais no exterior.

Esse último episódio causou grande desgaste e marcou uma divisão na Frente Ampla. Vázquez hoje lidera a ala dos moderados, do qual Martínez faz parte.

Já a ala comandada por Mujica, a dos tupamaros, mostra-se mais radical, tem maioria no Congresso e é responsável pela formulação da política uruguaia para a Venezuela.

Para essa corrente, a melhor opção é a do diálogo, sem ceder às pressões do Grupo de Lima —posições que Martínez diz que pretende manter.

Outro ponto negativo da administração da Frente Ampla foi ter deixado que a violência crescesse de maneira muito rápida em um país tradicionalmente pacífico como o Uruguai.

A taxa de homicídios ainda é baixa —11,8 para cada 100 mil habitantes—, mas vem aumentando num ritmo maior que o de países conflagrados, como Honduras e El Salvador.

Por isso, as pesquisas mostram a segurança, e não a economia, como principal preocupação dos uruguaios nesse pleito. 

Segundo a sondagem mais recente, Martínez tem 38% das intenções de voto, contra 27% de Luis Lacalle Pou e 11% de Ernesto Talvi. Os dois últimos pertencem aos partidos mais tradicionais do Uruguai, Blanco e Colorado, respectivamente.

Ambas as legendas se desgastaram muito após o colapso de 2001 e 2002, causado pelo impacto da crise argentina.

Lacalle Pou, que já foi candidato na eleição passada, espera que no segundo turno conte com o apoio de Talvi.

Filho do ex-presidente Luis Alberto Lacalle (1990-1995), Lacalle Pou, 46, gosta de exibir sua “juventude” e costuma ser fotografado correndo e fazendo acrobacias no centro de Montevidéu.

Em termos de política econômica, é pró-mercado, e na área de segurança promete uma política mais linha-dura. 

Ao contrário de Martínez, cujas propostas focam prevenção e melhoria das condições carcerárias, Lacalle Pou fala em reforçar o combate ao crime.

Por outro lado, coincide com a Frente Ampla em relação a direitos civis —não pretende, por exemplo, retroceder em leis já estabelecidas como a da maconha e a do aborto.

Já o terceiro colocado, o economista Ernesto Talvi, 62, vem se destacando após ter desbancado um dos ícones do partido, o veterano ex-presidente Julio María Sanguinetti, 83.

Formado em Chicago, tem apoio da “juventude colorada”, grupo que tem feito com que o partido retome suas bandeiras de um liberalismo progressista, como era no início do século 20.

Em entrevista à Folha, em outubro, Talvi afirmou que, para seguir crescendo neste novo cenário internacional, o Uruguai tinha de mudar o foco de suas preocupações.

“O Uruguai não está em recessão, mas seu crescimento não está promovendo a criação de empregos. Ao contrário, perdemos 60 mil postos nos últimos anos, o que é muito para o tamanho do país [de 3,4 milhões de habitantes]”.

A solução, para ele, passa por dar mais demonstrações da credibilidade do país no exterior, como forma de atrair mais investimentos.

Assim como Lacalle Pou e Martínez, Talvi defende as conquistas na área de direitos civis, mas propõe ampliar o debate sobre legalização de drogas e políticas de contenção do número de dependentes químicos.

Além da disputa pela Presidência, haverá um plebiscito para uma reforma no sistema de segurança proposta pelo Partido Blanco. Não há pesquisas sobre essa votação, mas na última semana houve uma grande marcha em Montevidéu para rejeitá-la. A proposta, chamada de “Vivir Sin Miedo” (viver sem medo), torna mais duras as políticas de combate ao crime.

Um ano depois de renunciar, Pepe Mujica deve voltar ao Senado

Pouco mais de um ano após renunciar ao Senado alegando cansaço, o ex-presidente José “Pepe” Mujica tentará voltar a ocupar o cargo no Legislativo na eleição desta domingo (27). Conhecido pelo estilo de vida simples, ele é o primeiro nome na lista de candidatos da Frente Ampla (o eleitor vota apenas no partido e não diretamente no candidato). Assim, deve ser eleito com tranquilidade para um novo mandato de cinco anos. Na sexta, ele afirmou que seu principal objetivo será “ajudar os companheiros das novas gerações”, segundo o jornal local El Pais. 


Entenda a eleição

O que está em disputa? Estão em disputa a Presidência (a reeleição é proibida), as 99 cadeiras da Câmara e as 30 do Senado, além dos governos regionais. Todos são eleitos para mandatos de cinco anos, e o voto é obrigatório

Quem são os principais candidatos à Presidência? O ex-senador e ex-prefeito de Montevidéu Daniel Martínez tenta manter a Frente Ampla na Presidência (o grupo comanda o país desde 2005) e aparece em primeiro nas pesquisas. Seu principal adversário é o senador Luis Alberto Lacalle Pou, filho de um ex-presidente  e candidato pelo Partido Nacional, de centro-direita 

Há chance de 2º turno? É a hipótese mais provável, de acordo com as pesquisas. A votação para presidente é semelhante à do Brasil. Vence em primeiro turno o candidato que tiver mais de 50% dos votos e, caso isso não aconteça, há segundo turno entre os dois mais votados em 24 de novembro. 

E a eleição para o Congresso, como é? As duas casas usam o sistema de lista fechada, no qual o eleitor vota apenas nos partidos. As cadeiras são então divididas de acordo com a porcentagem de votos que cada sigla recebeu  

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