Um levantamento da Anistia Internacional aponta que mais de cem manifestantes morreram no Irã durante o movimento desencadeado na sexta-feira (15) contra o aumento do preço da gasolina.
A entidade afirmou, em comunicado, ter a confirmação de ao menos 106 mortes em 21 cidades diferentes e disse que o número pode ser o dobro, pois restam denúncias a serem averiguadas.
“As autoridades devem pôr um fim imediato a essa repressão brutal e mortal”, disse Philip Luther, diretor de pesquisa da entidade para o Oriente Médio e Norte da África.
A ONG explicou que baseou suas informações em vídeos certificados como verdadeiros, testemunhos de pessoas e informações de ativistas de direitos humanos fora do Irã.
Esses registros mostram membros das forças de segurança usando armas de fogo, canhões de água e gás lacrimogêneo para dispersar os manifestantes. Também há imagens de cápsulas no chão e de atiradores de elite nos telhados de edifícios disparando contra a multidão.
“Embora a maioria dos protestos parecesse pacífica, em alguns casos, à medida que a repressão se intensificou, um pequeno número de manifestantes jogou pedras, causou incêndios e danificou bancos”, diz o relatório.
Segundo a ONG, as forças de segurança não entregaram os corpos das vítimas às famílias —em alguns casos, eles foram enterrados de forma apressada e sem a realização de autópsias independentes.
Mais cedo, a ONU disse que temia que dezenas de pessoas tenham sido mortas nos atos.
A imprensa local reportou que cinco mortes foram confirmadas oficialmente, incluindo a de três policiais.
A Anistia Internacional pediu ao regime que retirasse o bloqueio quase total da internet, “imposto para impedir o fluxo de informações sobre a repressão dos protestos para o mundo exterior”.
As manifestações começaram após o anúncio do aumento de pelo menos 50% do preço da gasolina, para os primeiros 60 litros comprados a cada mês, e de 300% para compras adicionais. Centenas de jovens e trabalhadores da classe média saíram às ruas para expressar sua raiva contra a piora do padrão de vida e o aumento da corrupção e da desigualdade social.
Segundo as autoridades iranianas, mais de mil pessoas foram presas nesses atos.
O regime justificou a medida argumentando que a alta na arrecadação irá beneficiar os 60 milhões de iranianos mais desfavorecidos —a população total do país é de 83 milhões de pessoas.
O líder supremo do Irã, aitolá Ali Khamenei, criticou os manifestantes. “Algumas pessoas estão contrariadas por esta decisão, [...] mas danificar e atear fogo não é algo de uma pessoa normal”, disse, no domingo (17).
Nesta terça (19), o líder afirmou que os protestos eram uma questão de segurança nacional e que não estavam sendo realizados pelos iranianos.
Ainda no domingo, a Casa Branca condenou Teerã pelo uso de força letal na repressão das manifestações. “Os Estados Unidos apoiam o povo iraniano em seus protestos pacíficos contra o regime que deve governá-lo”, afirmou uma porta-voz do governo americano.
Um porta-voz do Judiciário afirmou que os protestos haviam chegado ao fim. Mas vídeos publicados em redes sociais, mesmo durante o bloqueio da internet, mostram manifestantes em várias cidades na noite de segunda (18).
Mais cedo, o regime afirmou que gravações antigas estão sendo recicladas para perturbar a segurança nacional.
Os atos ocorrem em um cenário de crise, agravada pela retirada unilateral dos EUA em 2018 do acordo sobre o programa nuclear iraniano. Como consequência, Washington retomou a imposição de sanções econômicas, que afetam gravemente o país.
O Irã é um dos maiores produtores de petróleo do mundo, mas possui capacidade de refinamento limitada. As restrições americanas dificultam a manutenção das usinas de refinamento, estrangulando a oferta de combustíveis no mercado interno.
Os preços de produtos básicos, como pão e arroz, subiram fortemente nos últimos meses, alimentando a insatisfação dos iranianos.
A moeda local, o rial, registrou forte desvalorização. A inflação supera 40%, e o FMI prevê para este ano uma queda de 9,5% do PIB iraniano.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.