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The New York Times

Mike Pompeo: o último da classe em integridade

Atenção, todos os diplomatas dos EUA: cuidem de suas costas, porque Pompeo não cuidará

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Thomas L. Friedman
The New York Times

Parece que toda reportagem que você lê sobre o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, inclui a frase de que ele se formou "em primeiro lugar da classe" em West Point. Não é uma conquista pequena. Mas é ainda mais impressionante no caso de Pompeo, quando se considera que ele terminou em primeiro lugar apesar de provavelmente ter sido reprovado em todos os cursos de ética e liderança. Acho que ele era realmente bom em matemática.

Digo isso porque Pompeo acaba de violar uma das principais regras da ética e do comando militar americano: você cuida de seus soldados, não deixa seus feridos no campo de batalha e certamente não fica mudo quando sabe que uma oficial subalterna está sendo arrasada por um comandante mais velho, ou mesmo sendo atingida por um tiro nas costas.

O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, participa de entrevista coletiva depois de reunião em Bruxelas, na Bélgica
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, participa de entrevista coletiva depois de reunião em Bruxelas, na Bélgica - Zheng Huansong/Xinhua

As aulas de ética e liderança em West Point teriam ensinado tudo isso. Só posso supor que Pompeo falhou ou faltou a todas, ao observar seu comportamento covarde e pegajoso como chefe do Departamento de Estado. Eu nunca, jamais, gostaria de estar numa trincheira com esse homem. Atenção, todos os diplomatas dos EUA: cuidem de suas costas, porque Pompeo não cuidará.

Pompeo sabe muito bem que sua embaixadora na Ucrânia, Marie Yovanovitch, era uma destacada oficial no serviço exterior, cuja missão em Kiev havia sido prorrogada pelo Departamento de Estado dele próprio em março de 2019, até 2020, por causa do excelente trabalho dela. Mas, infelizmente, ela foi avisada para embarcar no primeiro avião no final de abril, depois que o presidente Donald Trump —embebido de teorias da conspiração sobre a Ucrânia derramadas sobre ele por Rudy Giuliani e seus corruptos aliados ucranianos— exigiu que ela fosse arrancada de lá.

Como disse Yovanovitch à Comissão de Inteligência da Câmara na sexta-feira (15): "Os indivíduos, que aparentemente se sentiram frustrados por nossos esforços para promover a política declarada dos EUA contra a corrupção —ou seja, cumprir a missão—, conseguiram conduzir com sucesso uma campanha de desinformação contra uma embaixadora em exercício, usando canais não oficiais. Como relataram várias testemunhas, eles compartilharam alegações infundadas com o presidente e o convenceram a retirar sua embaixadora, apesar do Departamento de Estado ter entendido perfeitamente que as denúncias eram falsas e as fontes, altamente suspeitas".

Sim, Pompeo sabia 100% que tudo era um esquema montado. Sabemos disso porque, quando o senador Bob Menendez perguntou ao vice-secretário de Estado de Pompeo, John Sullivan, sobre Yovanovitch —na audiência de confirmação de Sullivan no Senado em 30 de outubro para se tornar o próximo embaixador dos EUA em Moscou—, ele afirmou que ela havia servido "de maneira admirável e competente". Quando Menendez perguntou a Sullivan se Giuliani estava por trás da remoção de Yovanovitch, Sullivan declarou que Giuliani estava "tentando difamar a embaixadora Yovanovitch ou removê-la. Eu acreditei que ele estava, sim".

Essas foram as palavras do próprio vice de Pompeo!

Mas elas nunca saíram da boca de Pompeo. Embora ele supostamente tenha defendido em particular com o presidente a manutenção de Yovanovitch no posto, executou fielmente a ordem de Trump sem pronunciar uma palavra para defender a reputação de sua embaixadora em público.

Pompeo deixou que a embaixadora na Ucrânia —que dependia dele para proteção— fosse atacada pelas costas com uma faca no Twitter, empunhada pelo presidente, em vez de dizer a Trump: "Desculpe, senhor presidente, se você a demitir vou renunciar. Porque agir de outra maneira seria injusto e contra meus valores e caráter —e porque eu perderia a lealdade de todos os meus diplomatas se, silenciosamente, seguisse essa farsa da justiça contra uma distinta veterana com 33 anos de serviço exterior".

Trump, o valentão covarde que é, provavelmente teria recuado se Pompeo tivesse mostrado alguma espinha dorsal. Mas Pompeo não tentou isso, porque ele quer concorrer à presidência depois de Trump —e não quis se arriscar a alienar Trump. É simples assim, pessoal.

Ou é tão simples quanto isto: "Pois, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?" (Marcos 8:36).

Só me encontrei com Pompeo uma vez. Eu o achei, em particular, inteligente e envolvente —mas não discutimos ética. Muitos no Departamento de Estado perderam todo o respeito por ele —por um bom motivo. Seu comportamento é uma das coisas mais vergonhosas que já vi em 40 anos de cobertura da diplomacia americana.

Como pode Pompeo achar que tem condições de tomar as difíceis decisões necessárias para liderar uma nação como presidente e enviar soldados para a guerra, se ele não pode tomar uma decisão fácil e clara para proteger um de seus diplomatas de ser difamado por pessoas agindo fora do nosso sistema?

Dois antigos diplomatas aposentados do Departamento de Estado, Aaron David Miller e Richard Sokolsky, escreveram no site da CNN no sábado (16): "No mínimo, Pompeo permitiu que a campanha de difamação não fosse contestada, consentida no esforço paralelo de Giuliani com a Ucrânia, e não disse uma palavra em defesa de Bill Taylor, George Kent ou Marie Yovanovitch. São atos espantosos de covardia política e abaixo da dignidade de qualquer secretário de Estado".

Eu entendo o fato de que o deputado Devin Nunes e a senadora Lindsey Graham têm uma disputa em curso sobre quem consegue se rebaixar mais em público ao defender os atos indefensáveis de Trump. (Está pescoço a pescoço.) Mas eles são políticos do Partido Republicano, pessoas que hoje sabemos que farão de tudo para não perder seus salários de US$ 174 mil por ano e estacionamento grátis no Aeroporto Nacional.

Mas Pompeo é o secretário de Estado. Esse é um grande privilégio e uma responsabilidade. Thomas Jefferson foi a primeira pessoa a ocupar esse cargo. Pompeo não é Jefferson. Tudo o que ele está fazendo agora é tentar ao máximo se esconder da opinião pública, contando com a próxima indignação de Trump para lavar seu próprio comportamento indigno. Mas a marca de Caim em sua testa não será lavada. Ele nem teve a decência ou coragem de falar com Yovanovitch pessoalmente, olhá-la nos olhos e pelo menos dizer: "Ei, sinto muito".

Repórteres e colunistas precisam perguntar a Pompeo sempre que têm a oportunidade: "Que código moral você está usando para justificar esse comportamento?"

Eu queria ter certeza de que não estava sendo injusto com o secretário de Estado, então pesquisei a frase "Pompeo defende Yovanovitch" —só para garantir que não tinha perdido alguma informação. Estas foram as manchetes que surgiram: "Pompeo é um 'covarde' por não defender Marie Yovanovitch", "Pompeo não trata de preocupações levantadas por Yovanovitch", "Pompeo evita perguntas sobre falta de apoio do Estado a Yovanovitch" e "Assessor de Estado sênior: o silêncio de Pompeo sobre os ataques a Yovanovitch absolutamente mataram a moral".

Portanto, agora está claro que Pompeo não prestou o juramento de defender e proteger a Constituição. Ele fez um juramento de defender e proteger Donald Trump e a futura carreira política dele próprio —acima de tudo—, e é exatamente isso o que está fazendo. Que vergonha! 

Quanto a Yovanovitch, obrigado por seu serviço. Você é um crédito para a nossa nação e seus ideais —tudo o que seu chefe não era. Mantenha sua cabeça erguida. Jefferson teria ficado orgulhoso de você.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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