Piñera admite descumprimento de regras de uso da força em protestos no Chile

Anistia Internacional denuncia política de ataques contra manifestantes

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Santiago

O presidente Sebastián Piñera reconheceu nesta quinta-feira (21) que as forças de segurança do Chile descumpriram os protocolos de uso da força, e a Anistia Internacional denunciou uma "política deliberada" para castigar manifestantes.

O líder chileno afirmou, no entanto, que a Justiça será responsável por determinar se houve violação a direitos humanos. 

Enquanto aumentam as denúncias sobre o uso excessivo da força na repressão dos atos que começaram há um mês, o presidente reconheceu que em alguns casos não foram cumpridas as regras estabelecidas nos protocolos revisados e aprovados por organismos de direitos humanos em março.

Policiais da tropa de choque puxam cabelo de manifestante enquanto ele é detido em Santiago, no Chile
Policiais da tropa de choque puxam cabelo de manifestante enquanto ele é detido em Santiago, no Chile - Pablo Sanhueza - 21.nov.19/Reuters

"Se esses protocolos não foram cumpridos, e eu acho que é possível que em alguns casos não tenham sido cumpridos, isso será investigado pela Procuradoria, será objeto de sanções pelos tribunais de Justiça. Assim funciona uma democracia, assim funciona um Estado de direito", disse Piñera.

Os protestos no Chile começaram em 18 de outubro e já deixaram 22 mortos. O Instituto Nacional de Direitos Humanos aponta cerca de 2.000 feridos. Organizações da saúde afirmam que mais de 280 pessoas tiveram dano ocular grave por disparos de balas de borracha.

Nenhum policial morreu nas manifestações, mas a instituição contabiliza cerca de 1.600 agentes feridos.

O Ministério Público informou que até 31 de outubro foram abertas cerca de 1.090 investigações penais em todo o país por denúncias de violência institucional, entre as quais 24 por supostas torturas e nove por denúncias de abuso sexual ou estupro.

Na noite desta quinta-feira, manifestantes saquearam e incendiaram o shopping Arauco, no bairro de Quilocura, no norte de Santiago, após um protesto contra supostas torturas praticadas por policiais contra menores de idade.

Os bombeiros chamados para combater o incêndio foram hostilizados pelos manifestantes, que queriam ver o shopping ser totalmente queimado.

Na Praça Itália, no centro de Santiago, dezenas de encapuzados enfrentaram a polícia, que respondeu com bombas de gás lacrimogêneo e jatos d'água.

Em Antofagasta, no norte do país, um motorista atropelou um grupo de manifestantes e foi perseguido pela multidão, em um incidente que não deixou vítimas fatais, segundo os Carabineiros, a polícia chilena

Em Valparaíso, porto do litoral central chileno, ocorreram violentos confrontos e saques a lojas, enquanto o metrô foi fechado. 

Em Concepción, ao sul, centenas de pessoas ocuparam o centro da cidade e foram dispersadas pela polícia.

Balas de borracha em casos extremos

Segundo Piñera, as regras do uso da força no Chile indicam que o restabelecimento da ordem pública e a garantia da segurança dos cidadãos têm que ser feitos primeiro pela simples presença dos carabineiros.

"Se com diálogo, dissuasão e convencimento não for suficiente, usando elementos dissuasivos como veículos com jatos de água e bombas de gás lacrimogêneo."

"Somente quando a vida das pessoas está em risco, dos carabineiros ou dos civis, se pode usar escopetas que disparam balas, que têm que ser de borracha", explicou o mandatário.

Os carabineiros suspenderam o uso dessa arma não letal para controlar as manifestações depois que médicos denunciaram uma "epidemia de lesões oculares", com mais de 200 casos registrados nas primeiras três semanas dos atos, número que supera os dados de feridos em zonas de conflitos no mundo.

Além disso, outro relatório divulgado por organizações chilenas apontou que a munição não letal usada pela polícia chilena é feita com somente 20% de borracha.

Ataques generalizados

Piñera falou sobre os protocolos depois da publicação de um relatório da Anistia Internacional (AI), no qual se afirma que as forças de segurança chilenas estão cometendo "ataques generalizados" e usando a força "de maneira desnecessária e excessiva" para castigar os manifestantes no Chile.

"A intenção das forças de segurança chilenas é clara: lesionar quem se manifesta para desincentivar o protesto, inclusive quando chega ao extremo de usar a tortura e a violência sexual contra manifestantes", afirmou o relatório da AI, que contém as conclusões preliminares de uma visita de inspeção que documentou 23 casos de violações aos direitos humanos em todo o país.

"Não são fatos isolados ou esporádicos, mas que correspondem a um padrão consistente no tipo de violação e no modus operandi implementado ao longo de todo o país, principalmente por parte dos carabineiros. O grau de coordenação requerido para sustentar a repressão violenta aos protestos durante mais de um mês leva razoavelmente a pensar na responsabilidade do comando ao mais alto nível, seja porque ordenou ou porque tolerou a repressão", denunciou a ONG.

A subsecretária para os Direitos Humanos, Lorena Recabarren, rejeitou categoricamente a acusação de que o governo "pretenda estabelecer uma política deliberada para prejudicar os manifestantes".

A polícia chilena assegura que não teve a intenção de machucar os participantes dos protestos.

Já as Forças Armadas afirmam que "não existe e não existiu qualquer política" interna para "dirigir ataques generalizados ou sistemáticos contra a população civil".

"A extensa denúncia da Anistia Internacional não traz qualquer prova direta ou indireta de ordem, acordo ou sequer insinuação das Forças Armadas neste sentido", destaca o comunicado.

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