Em evento natalino na Argentina, Evo desiste de ato na fronteira com a Bolívia

Ex-presidente diz que agentes dos EUA poderiam prendê-lo se ele se aproximasse do território boliviano

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O ex-presidente da Bolívia Evo Morales se reúne com crianças da comunidade boliviana na Argentina, em evento no dia de Natal, em Buenos Aires - Sylvia Colombo/Folhapress
Buenos Aires

Refugiado na Argentina após renunciar à Presidência da Bolívia, Evo Morales chegou às 8h desta quarta-feira (25) de Natal a um campo de futebol em Puerto Madero, em Buenos Aires, para um evento com crianças da comunidade boliviana.

Depois de fazer dezenas de selfies com pais e filhos, Evo conversou com a imprensa, na qual afirmou ter desistido da ideia de realizar, no próximo domingo (29), uma assembleia na fronteira da Argentina com a Bolívia, onde foi emitida uma ordem de condução coercitiva contra ele.

"Não vou poder fazer isso, os Estados Unidos vão encontrar um jeito de me prender se eu chegar próximo à Bolívia. Fomos desaconselhados por questões de segurança", disse ele. "O encontro será aqui em Buenos Aires, no mesmo dia."

No ato, pretende ouvir líderes para decidir quem será o candidato do MAS (Movimento para o Socialismo, partido do qual faz parte) nas eleições bolivianas que devem ocorrer no próximo semestre.
 
Entre os cotados estão o líder cocaleiro Andrónico Rodríguez e os ex-chanceleres Diego Pary e David Choquehuanca, além do ex-ministro de Economia Luis Arce. O escolhido não deve ser anunciado neste dia, mas o evento servirá para afunilar a lista de possíveis candidatos.

Questionado sobre a rapidez com que o governo brasileiro reconheceu Jeanine Áñez como presidente interina da Bolívia —após a então segunda vice-presidente do Senado se proclamar no comando do país—, Evo disse lamentar a atitude do presidente Jair Bolsonaro.

"Mas eu o entendo, porque há uma força muito perigosa atuando contra nós, que é a OEA [Organização dos Estados Americanos], e os países se sentem na obrigação de seguir o que a OEA diz, que houve uma fraude, o que não é verdade." 

Evo disse ainda que o Brasil é um país amigo e que, quando seu partido voltar ao poder, as relações entre os países vizinhos seguirão "boas e democráticas". 

Afirmou que uma das primeiras atitudes que o MAS tomará caso vença o novo pleito será pedir uma investigação sobre as mortes decorrentes das manifestações que se seguiram após ele deixar o país, em 11 de novembro, quando renunciou em meio a uma onda de protestos ante as denúncias de fraude na disputa que lhe daria um quarto mandato. Evo partiu para o México, onde ficou asilado durante um mês, e de lá foi para a Argentina.

O ex-presidente conta que tem estado mais à vontade na Argentina, cujo novo governo, do kirchnerista Alberto Fernández, é visto como um aliado. Evo vive no bairro de classe média alta de Colegiales, em Buenos Aires. Por isso, anda com menos seguranças e corre na Reserva Ecológica, vizinha de Puerto Madero. "Ainda estou gordo, mas estou entrando em forma", brinca.

No café da manhã natalino, havia panetone, "buñuelos" bolivianos e chocolate quente. O ex-presidente conversou com as crianças e depois foi ao vestiário para pôr uma camisa com o número 10 e seu nome atrás, as cores da bandeira da Bolívia e a wiphala, símbolo de resistência indígena boliviana.

Evo já disse que não será o candidato, mas atua como chefe de campanha e pretende voltar à Bolívia para transmitir "aos novos governantes do MAS minha experiência política".
 
Sobre Áñez, fez críticas duras. "Hoje é Natal, e Natal para mim é a data que celebra Jesus Cristo, que é um sinônimo de reconciliação e de ajuda aos pobres. O que esta senhora faz com a Bíblia é o contrário, é danificar a sociedade, dividindo-a, tratando com discriminação outros credos que existem num país tão pluricultural como é a Bolívia", disse.

Declarou, também, que são duas as coisas que mais doem sobre estar longe do poder. "Primeiro, os massacres, que são inaceitáveis. Tantas mortes não têm justificativa. Depois, o massacre ao nosso projeto econômico, que vinha levantando a Bolívia, diminuindo a pobreza, e agora nosso crescimento vai voltar a ser pífio em 2019. Meu projeto era diversificar exportações, fazer o país mais forte em outras áreas. O da direita é apenas explorar o lítio." 

Ele afirma que, no fundo, esse período tem sido bom em apenas um sentido. "Os jovens estão se dando conta do que é viver em ditadura, do que é viver num país dominado pela direita. E, com isso, até aqueles que não acreditavam em nós antes passaram a acreditar agora", afirmou. 

Sylvia Colombo

Correspondente em Buenos Aires, foi editora da Ilustrada e participou do programa Knight-Wallace da Universidade de Michigan.

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