Lei de cidadania pode erodir pluralismo indiano, afirma acadêmica

Professora da Universidade Jawaharlal Nehru alerta para a formação de 'Estado etnonacionalista'

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São Paulo

A legislação que prevê religião como critério para cidadania representa um caminho sem volta para a formação de um “Estado etnonacionalista”.

É o alerta de Niraja Gopal Jayal, professora do Centro de Estudos do Direito e da Governança da Universidade Jawaharlal Nehru, uma das mais conceituadas da Índia.

Ativistas durante marcha em protesto contra a lei de cidadania do governo de Narendra Modi, em Guwahati, na Índia
Ativistas durante marcha em protesto contra a lei de cidadania do governo de Narendra Modi, em Guwahati, na Índia - Biju Boro - 9.dez.19/AFP

A lei de cidadania e outros itens da agenda nacionalista hindu são a maior ameaça que a democracia indiana já enfrentou? 

Vivemos um momento decisivo da democracia indiana. Houve uma suspensão total da democracia durante o estado de emergência nacional imposto por Indira Gandhi. Mas agora é diferente.

O uso de forças policiais e o bloqueio da internet para controlar protestos são uma violação dos direitos civis e políticos. Além disso, está em curso um ataque frontal contra as leis laicas e a Constituição. 

Ao introduzir a religião como critério para cidadania na Índia, essa legislação pode ser um caminho sem volta para a formação de um Estado etnonacionalista. A Índia está se transformando em uma nação hindu na qual a cidadania se baseia na religião.

Os protestos têm força para dissuadir Modi de implementar sua agenda? 

Certamente. São os protestos mais amplos que este governo já enfrentou. E a repressão policial é sem precedentes. Porém, apesar do dano à imagem da Índia, é pouco provável que o governo vá repensar sua agenda. 

A única medida que poderia aplacar a revolta seria suspender o Registro Nacional de Cidadãos. Mas mesmo que ele não aconteça agora, o governo pode manter isso em banho-maria até a próxima eleição, para manter o eleitorado hindu mobilizado.

Por que há protestos generalizados? A vitória avassaladora do BJP na eleição de maio não mostrou que há amplo apoio a Modi? 

A vitória do BJP foi contundente, com 37,4% dos votos, e com maioria expressiva na Câmara baixa do Parlamento. 

Mas a a magnitude dos protestos em vários estados mostra que a lei despertou reações muito fortes nos jovens. Eles foram para as ruas protestar contra essa política que promove divisão, reúnem-se em locais públicos e leem em voz alta a Constituição, falam sobre democracia.

Quais são as próximas medidas da agenda de Modi que causam preocupação?

A mais preocupante é o Registro Nacional de Cidadãos, que, na realidade, é irmão gêmeo da lei de cidadania. Juntos, os dois vão erodir o alicerce de pluralismo da nação indiana.

Até o momento, o sistema de freios e contrapesos do país têm funcionado?

A confiança no Judiciário e sua independência têm sido corroídas nos últimos anos.

E a mídia tradicional tem se rendido a pressões —as grandes empresas donas dos veículos e a preocupação com perda de anúncios são um fator—, embora existam exemplos de jornalismo independente, principalmente online. 

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