Protestos levam dezenas de milhares às ruas em Hong Kong

Houve conflitos pontuais com a polícia no maior ato desde a vitória eleitoral da oposição, no domingo passado

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Hong Kong

Um dos principais efeitos da vitória da oposição nas eleições locais de Hong Kong, no domingo passado (24), foi trazer uma relativa tranquilidade às ruas do centro financeiro asiático após seis meses de protestos contínuos. Não mais, aparentemente.

Neste domingo (1º), dezenas de milhares de pessoas tomaram as ruas do movimentado distrito comercial de Tsim Sha Tsui, na parte sul da porção continental da cidade, Kowloon.

Houve confronto com a tropa de choque, mas apenas pontualmente.

Multidão de manifestantes vestidos de preto e branco atravessa ponte
Manifestantes participam de protesto contra o governo de Hong Kong na região de Kowloon, parte continental da cidade - Igor Gielow/Folhapress

Majoritariamente vestidas de preto e mascarados, símbolo dos atos deste ano, elas começaram a se concentrar às 15h na frente do Centro Cultural de Hong Kong.

 

A polícia acompanhava à distância, uma vez que a marcha foi requisitada por uma entidade de direitos humanos e autorizada.

Não há estimativa oficial de presentes, mas é seguro falar na casa de poucas dezenas de milhares. Antes de a marcha começar, o ativista Joshua Wong falou em um microfone improvisado que agora “é a hora de mantermos a luta”.

A paz que imperou nesta semana em Hong Kong, com exceção de uma confusão ao final de um comício na quinta (28) e escaramuças na hora do almoço em alguns pontos da cidade, tornou-se um dilema para a oposição.

Sair da rua seria abdicar do momento positivo alcançado no pleito em que abocanhou 17 de 18 conselhos locais da cidade, que vive sob um sistema capitalista liberal mesmo sendo regida pela China comunista —o acerto dura oficialmente até 2047, segundo o combinado com os antigos donos do pedaço, os britânicos.

“Acho que temos de resistir”, afirmou Theresa, uma jovem que acompanha Wong em todos seus eventos, mas oficialmente é apenas uma simpatizante da causa.

A massa andou por dois quilômetros, até o ponto de dispersão do Coliseu de Hong Kong, ao lado da estação de metrô Hung Hom.

Ao longo do caminho, pequenos grupos tentavam sair da rota combinada ou atiravam pedras, e era atacados com spray de pimenta e, em ao menos duas ocasiões, gás lacrimogêneo.

Houve algumas prisões relatadas. Mas foram altercações isoladas, apesar do clima de tensão constante, com gritos e provocações de lado a lado. 

Os manifestantes mantinham a mão espalmada, símbolo das suas cinco demandas: o arquivamento de uma lei que facilita a extradição para a China comunista (o que já ocorreu), inquéritos sobre violência policial, anistia aos quase 6.000 presos desde junho, fim do enquadramento como baderneiros e eleições universais para Executivo e Legislativo.

O parcial comedimento policial decorre do fato de que o governo local ainda não absorveu o sentido da vitória eleitoral da oposição, a julgar pelas manifestações opacas da executiva-chefe, Carrie Lam.

Apertar a repressão, o que melhor ela sabe fazer, pode tirar tudo do controle novamente —a semana anterior ao pleito havia sido a mais violenta deste ano.

Na dispersão, ao final da avenida Salisbury, a polícia de choque forçou manifestantes para dentro de um shopping, o Fortune, num dos momentos mais tensos.

A Folha foi empurrada na base de golpes de cassetetes e ameaças de uso de spray de pimenta com outros repórteres, participantes do protesto e até dois funcionários da Cruz Vermelha que davam apoio local. Era pouco mais de 18h.

Alguns dos integrantes do protesto aproveitaram para fazer um lanche na praça da alimentação, enquanto famílias inteiras observavam algo entediadas o movimento. 

Perto dali, um último grupo de cerca de cem ativistas foi encurralado por policiais, prometendo levar a disputa noite adentro.

Acabaram dispersados e vandalizaram duas lojas de redes que são vistas como próximas de Pequim: a Yoshinoya (conveniências) e a Best Mart 360 (lanches rápidos e conveniências).

Hung Hom é próxima da Politécnica de Hong Kong, instituição que passou dez dias sob cerco policial após uma batalha campal com ativistas —a universidade declarou que, dos 1.100 presos nos atos por lá, apenas 46 eram alunos.

Uma das curiosidades da marcha, e também de outra que havia ocorrido mais cedo do outro lado da baía, na ilha de Hong Kong, foi a prevalência de bandeiras americanas e faixas de agradecimento a Donald Trump.

Na quarta (27), o presidente dos EUA sancionou dois projetos que integram o Ato de Democracia e Direitos Humanos de Hong Kong, que prevê formas de punir autoridades envolvidas com repressão policial na região e veta a exportação de itens como gás lacrimogêneo à cidade.

“Eu tirei essa foto só para mostrar para meus amigos democratas. Eles vão pirar”, brincou o turista americano David, que passava pela praça Chater Garden quando foi estendida uma faixa com a tipologia da campanha presidencial de Trump e uma versão de seu slogan: “Presidente Trump, faça Hong Kong grande de novo”.

No mesmo lugar, as provocações contra a China continental eram bastante explícitas, o que combinado com as bandeira americanas traz uma sensação de Guerra Fria rediviva.

No caso, na forma da disputa comercial entre as duas maiores economias do mundo.

Um boneco de soldado das SS nazistas segurava uma bandeira do Partido Comunista, e um manifestante trazia enforcado um ursinho Pooh —o personagem da Disney que é comparado com Xi Jinping, para grande desgosto e pedidos de censura por parte do líder chinês.

No sábado, um protesto de menor escala também no centro financeiro de Hong Kong, na ilha homônima, acabou com gás lacrimogêneo sendo lançado contra manifestantes.

O próximo grande teste será no domingo que vem, quando já está marcado um grande ato na cidade.

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