Relatório final da OEA aponta manipulação em eleição na Bolívia

Documento cita queima de atas e falsificação de assinaturas

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Washington | AFP

Quase 45 dias depois de um pleito marcado por idas e vindas e acusação de fraude, a OEA (Organização dos Estados Americanos) concluiu que houve “ações deliberadas para manipular os resultados das eleições" de 20 de outubro na Bolívia, incluindo alteração e queima de atas de votação e falsificação de assinaturas.

As conclusões estão detalhadas no relatório final da entidade, divulgado nesta quarta-feira (4), segundo o qual uma série de “ações e omissões” durante o processo eleitoral “impactaram a certeza, a credibilidade e a integridade dos resultados”.

Entre as “ações deliberadas” para interferir no resultado final do pleito, o texto aponta a “paralisação intencional e arbitrária” do sistema eletrônico de divulgação da contagem de votos, o uso de servidores não previstos na infraestrutura tecnológica, aos quais foram desviados dados de “maneira intencional”, e a queima de atas e “mais de 13.100 listas de eleitores” que estavam aptos a votar —o que impede a conferência e a contagem dos votos.

O ex-presidente boliviano Evo Morales, que está asilado no Cidade do México
O ex-presidente boliviano Evo Morales, que está asilado no Cidade do México - Ginnette Riquelme/Folhapress

O documento lista ainda uma série de “irregularidades graves”, que os auditores classificam como ações em que “não está claro se houve ou não intenção de manipular” a eleição, mas que certamente causaram “sérias violações” à integridade do processo.

Essas irregularidades incluem a falta de conservação adequada de documentos e o acesso pouco controlado ao sistema eletrônico de dados.

Além desses problemas, os auditores apontam, separadamente, os erros “sem indícios de intencionalidade” e os “indícios” de “comportamentos anormais” que podem também ter comprometido os resultados divulgados.

“As manipulações e irregularidades não permitem ter certeza sobre a margem de vitória [de Evo Morales em relação a Carlos Mesa]. Ao contrário, a partir da esmagadora evidência encontrada, é possível afirmar que houve uma série de operações dolosas destinadas a alterar a vontade expressa nas urnas”, escrevem os auditores.

Pelo Twitter, o ex-presidente Evo Morales, que está asilado na Cidade do México, citou uma análise feita por estatísticos de várias universidades, incluindo as de Harvard e Massachusetts, que, segundo ele, “negam a existência de fraude na Bolívia”, “exigem que a OEA retire suas declarações enganosas” e pedem que a União Europeia “investigue o organismo e rechace o golpe e as violações de direitos humanos” no país.

Na mesma rede social, a autoproclamada presidente interina, Jeanine Añez, escreveu que o relatório final da OEA “comprova as razões pelas quais tivemos que cancelar as eleições e convocar novas”.

O direitista Luis Fernando Camacho, uma das principais lideranças a pressionar pela renúncia de Evo, foi o mais enfático na comemoração: “Confirmado! Hoje foi um dia cheio de bênçãos! Quem disse que seria fácil? Mas o que resta é fé!", publicou ele, também em uma rede social. 

Na semana passada, Camacho anunciou formalmente sua intenção de concorrer à Presidência nas próximas eleições, que ainda não foram marcadas pelo governo interino de Añez.

Em novembro, após uma auditoria preliminar, o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, já havia pedido a anulação do pleito que deu vitória (e o quarto mandato) a Evo Morales.

Na época, ele instou o governo a convocar novas eleições —mas o então presidente renunciou no dia seguinte, pressionado pelos militares e pelas manifestações nas ruas.

Evo foi substituído pela então senadora Jeanine Añez, que se declarou presidente interina, aproveitando o vácuo de poder, mas sem votação formal no Congresso.

Desde as eleições, o país enfrenta uma onda de protestos que deixaram pelo menos 33 mortos e centenas de feridos.


Principais problemas apontados pela OEA

Ações deliberadas de manipulação 
Atos dolosos com objetivo de fraude.
Relatório cita atas de votação queimadas, assim como listas de eleitores habilitados, o que impediu a comparação entre os votos de cada eleitor e o que foi computado na contagem

Irregularidades graves  
Dolo não é claro, mas atos viabilizam fraudes.
Houve desvio de algumas atas no percurso entre a seção e o centro de apuração 

Erros 
Equívocos ou negligência que podem ter facilitado a manipulação.
Em ao menos 37 atas, o número de votos era diferente do número de pessoas que votaram

Indícios 
Análises estatísticas que apontam resultados improváveis.
Na apuração dos 5% finais, o número de votos a favor de Evo Morales aumentou de forma ‘massiva e inexplicável’

 
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