Torturador que dava aulas na Sorbonne volta à Argentina para ser julgado

Mario Sandoval vai responder pelo sequestro e desparecimento de estudante em 1976

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Buenos Aires

Terminou nesta segunda-feira (16) a viagem de volta para a Argentina de Mario Sandoval, 66, um conhecido torturador que fez parte da repressão durante a ditadura militar (1976-1983). Ele será julgado dentro do processo que investiga e condena crimes cometidos no centro de detenção clandestino da ESMA (Escola Mecânica da Armada).

Ao deixar o país, fugindo da perseguição aos repressores, Sandoval refugiou-se na França, onde se tornou professor do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Sorbonne, em Paris. Exerceu essa função desde 1985, ao chegar na universidade, até 2005. 

O ex-agente argentino Mario Sandoval é escoltado por policiais na chegada ao aeroporto em Buenos Aires
O ex-agente argentino Mario Sandoval é escoltado por policiais na chegada ao aeroporto em Buenos Aires - Ronaldo Schemidt/AFP

Sua situação se complicou quando um colega professor passou a desconfiar que ele talvez fosse o homem conhecido como “Churrasco” —porque era tão cruel no manejo dos aparelhos de eletrochoque, que acabou matando vários prisioneiros. 

Sandoval é suspeito de participar do assassinado de dezenas de pessoas, mas será inicialmente julgado pelo sequestro e desaparecimento do estudante Hernán Abriata, em 1976, no auge dos anos de chumbo da ditadura argentina.

Há evidências de que, após ser torturado, Abriata foi jogado no rio da Prata em um dos chamados “voos da morte”. Neles, os considerados “subversivos” eram atirados vivos na água, sob o efeito de sedativos e com pesos nos pés —assim, mesmo que tentassem reagir, iam parar no fundo do rio.

Até hoje, continuam aparecendo restos desses corpos. Estima-se que a ditadura argentina tenha desaparecido com mais de 20 mil pessoas.

Em abril de 2014, Beatriz Cantarini de Abriata, mãe de Hernan Abriata, segura uma foto de seu filho em frente à embaixada da França, em Buenos Aires
Em abril de 2014, Beatriz Cantarini de Abriata, mãe de Hernán Abriata, segura uma foto de seu filho em frente à embaixada da França, em Buenos Aires - Daniel Garcia - 9.abr.2014/AFP

A Sorbonne emitiu um comunicado dizendo que o fato de Sandoval ter feito parte de seu corpo docente colocava uma nuvem negra sobre a instituição e que, por conta disso, deseja colaborar com a Justiça.

A luta por sua extradição durou oito anos e foi dificultada pelo fato de Sandoval ser cidadão francês. Como os crimes foram cometidos antes de ele obter a cidadania, porém, a Justiça francesa aceitou extraditá-lo para ser julgado na Argentina. A denúncia contra Sandoval se baseia no testemunho de outros presos da ESMA que o viram atuar, inclusive na tortura de Abriata.

Desde 2003, quando o ex-presidente Néstor Kirchner derrubou os indultos e anistias concedidos após a ditadura e passou a adotar a interpretação do Estatuto de Roma de que crimes de Estado contra a humanidade não prescrevem, os julgamentos contra repressores ganharam novo impulso. Hoje, há mais de 700 condenados. 

A chancelaria argentina emitiu nesta segunda-feira (16) um comunicado declarando que Sandoval havia chegado à Argentina nesta manhã e agradecendo o esforço da Justiça francesa em extraditá-lo. 

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