Entre a angústia e a confusão, cerca de dez migrantes brasileiros acordaram hoje na mexicana Ciudad Juárez, para onde autoridades americanas lhes enviaram para esperar a resposta de seus pedidos de asilo.
A administração Trump havia anunciado na quarta (29) que brasileiros que tentarem atravessar a fronteira sudoeste dos EUA para pedir asilo no país serão enviados de volta para o México. Washington está ampliando a estratégia para frear o fluxo de migrantes sem documentação regular.
O grupo de sul-americanos, que inclui quatro menores de idade, chegou à cidade fronteiriça na tarde de quarta. "Não explicaram para a gente, não sabemos por que voltamos para cá", disse Tânia Costa da Silva, de 32 anos, que foi devolvida ao México com seu marido, Jones Silva de Brito, de 35, e sua filha Isabella, de 6.
Em 2019, os Estados Unidos selaram com o México os Protocolos de Proteção ao Migrante (MPP), nos quais se estipula que os solicitantes de asilo que cheguem à fronteira comum devem esperar neste país até o fim da tramitação de seus pedidos.
Segundo o Departamento de Segurança Interna dos EUA, o número de brasileiros que chegaram à fronteira sul aumentou 11 vezes entre 2018 e 2019, até o mês de setembro.
Tânia, Jones e Isabella saíram de Minas Gerais em 21 de janeiro e, uma vez em Ciudad Juárez, cruzaram o rio Bravo e se entregaram aos agentes da Patrulha Fronteiriça, com esperança de ficar nos EUA, embora tenham sido presos.
Contudo, os cinco dias em El Paso, Texas, foram difíceis, entre superlotação, comida fria e muito ruim, relataram eles. "A cela era para 14 pessoas, tinha 32. Todos no chão. Trinta e dois no lugar de 14, o excesso de gente é muito alto", denuncia o pai de família.
As autoridades americanas registraram seus rostos e impressões digitais antes de devolvê-los ao México junto de outros sete compatriotas.
Quatro deles, um casal com dois filhos, hospedaram-se em um hotel, enquanto os Costa Silva junto a outra família de três, igual a sua, foram acolhidos na Casa do Migrante, um albergue local.
Ali, homens, mulheres e crianças dormem separados. Após a primeira noite, eles se reuniram na manhã de quinta-feira (30) no pátio local, ansiosos para se sentarem sob o sol, pois a cidade amanheceu com 1ºC.
Enquanto as duas meninas rezavam em frente a uma imagem da Virgem de Guadalupe, Tânia lia e relia sua carta de retorno, que explica, em português, que eles fazem parte do MPP e devem esperar no México até 22 de abril.
"É muito tempo! E não temos como voltar para o Brasil", diz Tânia. Ela afirma ter fugido pois temia por sua vida. "Temos dívidas e estamos sem emprego. Como estávamos ameaçados de morte, viemos", acrescentou.
O Itamaraty disse nesta quinta-feira que foi informado por Washington da aplicação do MPP e que seus cidadãos podem solicitar assistência consular brasileira. "Trata-se de brasileiros que ingressaram regularmente no México e que poderão permanecer no território daquele país pelo tempo estabelecido pela legislação mexicana", disse a instituição em nota à AFP.
Para o departamento de Segurança, os protocolos com o México são "uma das muitas ferramentas para garantir que aqueles que têm solicitações de refúgio meritórias sejam atendidos oportunamente e que as solicitações fraudulentas sejam identificadas".
Segundo a Liga de Congressistas Latinos, os protocolos com o México são uma política "perigosa e às vezes mortal".
"Expandir esse programa a imigrantes brasileiros seria devastador, já que essas famílias não falam espanhol e ficarão mais vulneráveis no México", escreveu no Twitter a associação, que costuma criticar as políticas migratórias de Donald Trump.
O número de migrantes detidos na fronteira sul chegou a quase um milhão no ano fiscal de 2019, quase o dobro do período anterior, o que gerou fortes tensões entre Washington e os países do sul — principalmente México, Honduras, Guatemala e El Salvador—, que foram forçados a assinar acordos para reduzir o fluxo.
Depois de atingir, em maio de 2019, 144 mil detenções, em dezembro o fluxo totalizou 40 mil migrantes.
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