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Entenda por que o Iraque está no centro da disputa entre o Irã e os EUA

Tensão entre os países é bastidor do ataque à embaixada em Bagdá

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Adam Taylor
Washington Post

A tensão entre os Estados Unidos e o Irã aumentou ao longo de 2019, e uma nova imagem dramática na véspera de Ano-Novo ilustra bem isso: a embaixada dos EUA em Bagdá sitiada.

O ataque das milícias à embaixada no Iraque não foi surpresa. Para os Estados Unidos, que não têm relações diplomáticas com o Irã, o país se tornou um foco de conflito com o regime iraniano e as milícias iraquianas que se alinham a ele.

Membro das forças de segurança iraquianas protege a entrada da embaixada dos EUA em Bagdá
Membro das forças de segurança iraquianas protege a entrada da embaixada dos EUA em Bagdá - Ahmad Al-Rubaye/AFP

Um ataque com foguete na sexta-feira a uma base que abriga tropas americanas na cidade de Kirkuk, no nordeste do Iraque, matou um empreiteiro americano. Os Estados Unidos culparam um grupo apoiado pelo Irã pelo ataque e, em resposta, no domingo lançaram ataques aéreos contra bases ao longo da fronteira com a Síria, usadas pelo grupo Kataib Hezbollah, matando 25 milicianos e ferindo mais de 50.

Os ataques aéreos foram condenados não apenas por Teerã, mas também por Bagdá, sugerindo que eles foram uma violação da soberania iraquiana. Quando centenas de pessoas, muitas delas armadas, atacaram o complexo da embaixada dos EUA em Bagdá, na terça-feira, eles gritavam "morte à América".

1. Por que os Estados Unidos e o Irã estão em conflito?

O Irã foi um aliado próximo dos Estados Unidos durante a maior parte do reinado do xá Mohammad Reza Pahlavi. Mas Pahlavi foi derrubado pela revolução iraniana de 1979 e substituído por uma República Islâmica liderada pelos xiitas. Naquele mês de novembro, militantes iranianos levaram cerca de 70 americanos como reféns da embaixada dos EUA em Teerã e os mantiveram presos por 444 dias. A relação do Irã com os Estados Unidos deteriorou-se rapidamente e permaneceu tensa desde então.

Alguns apontam a intromissão dos EUA no Oriente Médio e a aliança com Israel e as forças sunitas rivais como justificativa para as suspeitas dos iranianos, enquanto outros argumentam que o próprio Irã é um poder expansionista, ansioso por pressionar a influência do ramo xiita do Islã no Oriente Médio. Washington e seus aliados no Oriente Médio também suspeitam que o Irã esteja buscando desenvolver um programa de armas nucleares.

Ambos os lados tentaram intermitentemente diminuir as tensões, enfatizando que seus problemas estão com os respectivos governos e não com o povo da nação. Negociações morosas resultaram em um acordo em 2015 entre o Irã e várias potências mundiais, incluindo os Estados Unidos, que buscou impor restrições ao programa nuclear do Irã.

2. Por que os Estados Unidos e o Irã estão interessados no Iraque?

O Iraque é vizinho do Irã. As duas nações compartilham uma fronteira de 1.500 km de comprimento. Historicamente, o Iraque fazia parte da Pérsia há centenas de anos. Aproximadamente 70% de sua população é xiita, com a maioria da população remanescente sunita (no Irã, mais de 90% da população é xiita), embora o Irã tenha quase quatro vezes o território do Iraque.

Na era moderna, os dois países mantiveram um relacionamento tenso: o ditador iraquiano Saddam Hussein invadiu o Irã em 1980, iniciando uma guerra de oito anos que deixou centenas de milhares de mortos. No entanto, depois que o governo de Saddam, dominado por sunitas, foi derrubado pela invasão do Iraque liderada pelos EUA em 2003, o Iraque passou a ser dominado por grupos políticos xiitas, alguns dos quais aliados ao Irã.

Os Estados Unidos se opuseram ao governo baathista de Saddam, mas deram apoio ao Iraque durante sua guerra com o Irã. Mais tarde, depois que o Iraque invadiu o aliado dos EUA, o Kuwait, em 1990, as forças de Saddam foram derrotadas na Guerra do Golfo Pérsico. O governo do presidente George W. Bush classificou o Iraque e o Irã como parte do "eixo do mal" em um discurso de 2002, apesar do antagonismo entre os dois países.

A invasão do Iraque em 2003 derrubou Saddam, mas as tropas americanas permaneceram no país para combater uma insurgência violenta. Embora a administração do presidente Barack Obama tenha concluído a retirada de tropas em 2011, elas foram destacadas novamente para o país em 2014 para combater o Estado Islâmico, uma organização sunita extremista que surgiu da guerra civil síria.

3. Que efeito a ascensão do Estado Islâmico na Síria e no Iraque teve na relação entre os EUA e o Irã?

O Estado Islâmico tem suas origens no Iraque, mas ganhou destaque no caos da guerra na vizinha Síria, que começou em 2013 e ainda está em andamento. No seu auge, no final de 2014, o califado autoproclamado controlava uma área do tamanho da Grã-Bretanha e a utilizava como base para convocar ataques aos interesses dos EUA e do Irã.

O Irã e os Estados Unidos estavam apoiando lados opostos na guerra síria. Teerã considerou o presidente sírio, Bashar al-Assad, um aliado essencial na região, enquanto os Estados Unidos e outras potências ocidentais apoiaram rebeldes que se opunham ao seu governo. Mas, para ambos, o Estado Islâmico apresentou-se como um problema mais premente.

Com os ataques aéreos dos EUA, bem como a intervenção de forças leais ao Irã e das forças armadas russas, o Estado Islâmico cedeu o último de seu território no início deste ano. No entanto, o fim dessa luta criou a possibilidade de um novo conflito entre o Irã e os Estados Unidos. O presidente Trump adotou uma visão crítica do Irã desde que assumiu o cargo em 2017.

A tensão entre os Estados Unidos e o Irã foi especialmente notória no Iraque, onde cerca de 5.000 soldados dos EUA estão destacados para ajudar na luta contra o Estado Islâmico. Milícias xiitas poderosas, muitas aliadas do Irã, expandiram seu alcance durante a batalha para libertar terras mantidas pelo Estado Islâmico como parte das Forças de Mobilização Popular, uma organização de milícias patrocinada pelo Estado.

4. Que relação o Irã tem com grupos no Iraque e na Síria?

O Irã tem sido acusado de administrar uma rede de intermediários em todo o Oriente Médio, usando milícias xiitas e partidos políticos para destruir governos rivais. Muitas vezes, é difícil avaliar a natureza exata de sua relação com esses grupos e o nível de autonomia de Teerã, o que, segundo os críticos, confere ao Irã um grau de negação plausível para as ações antiamericanas.

No Iraque, há uma variedade de milícias xiitas. Nem todas se formaram ao mesmo tempo, e elas não têm interesses idênticos, mas tiveram uma influência política crescente desde a batalha contra o Estado Islâmico, conquistando quase um terço dos assentos do parlamento do Iraque nas eleições de 2018.

No ano passado, ataques frequentes de foguetes contra bases usadas pelas tropas americanas no Iraque levaram a um aumento da tensão. Após os ataques contra o Kataib Hezbollah no domingo, um alto funcionário do Departamento de Estado dos EUA informou aos jornalistas que a culpa não era apenas do Irã, mas também do Iraque. "É responsabilidade deles nos proteger, e eles não tomaram as medidas apropriadas para fazê-lo."

A aparente facilidade com que apoiadores do Kataib Hezbollah e outras milícias xiitas conseguiram chegar à embaixada dos EUA, que fica na Zona Verde protegida de Bagdá, surpreendeu muitos observadores. No Twitter, Trump escreveu na terça-feira que esperava que o Iraque protegesse a embaixada.

5. Como o presidente Donald Trump mudou a relação com o Irã e o Iraque desde que assumiu o cargo?

Trump viu com suspeita o acordo nuclear da era Obama com o Irã e argumentou que o governo anterior não havia feito o suficiente para reduzir a influência iraniana na região. O presidente retirou os Estados Unidos do acordo em maio de 2018 e restabeleceu as sanções contra o Irã.

Desde então, os Estados Unidos têm como alvo específico o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, uma figura religiosa e política que é a autoridade máxima que toma decisões no país.

Apesar da pressão política e econômica sobre o Irã, não há indicação de que o apoio às milícias estrangeiras tenha sido suprimido. O Irã tem sido associado a ataques a instalações petrolíferas sauditas, bem como a navios estrangeiros no Golfo Pérsico. Embora a maioria das partes no acordo nuclear permaneça no mesmo, o Irã também começou a enriquecer e estocar urânio em um nível mais alto do que o permitido pelo acordo.

Ao mesmo tempo, as tensões entre os Estados Unidos e o Iraque aumentaram sob o governo Trump. No início de 2019, o presidente do Iraque, Barham Salih, disse que seu país rejeitaria a ideia de Trump de que os Estados Unidos poderiam manter as tropas americanas no Iraque para "observar" o Irã. Os iraquianos argumentaram que os ataques aéreos de domingo foram uma afronta à soberania de seu país e quebraram o acordo que permite a presença de tropas americanas no Iraque.

Mas a influência do Irã no Iraque também é um ponto de discórdia para muitos: enquanto milhares foram às ruas para protestar contra o governo neste outono, alguns visaram interesses iranianos, até mesmo incendiando o consulado do Irã em Karbala no início de novembro.

Tradução de AGFox

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