Taleban oferece reduzir violência no Afeganistão antes de acordo com os EUA

Concessão pode firmar acordo preliminar de paz entre insurgentes e Estados Unidos

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Nova York | The New York Times

O Taleban ofereceu um período breve de redução da violência no Afeganistão durante as negociações em curso com diplomatas americanos, segundo três funcionários familiarizados com as discussões. A concessão é vista como importante para a finalização de um acordo preliminar de paz entre os insurgentes e os Estados Unidos, com vistas a encerrar a guerra entre eles que já dura 18 anos.

Dois soldados fardados sentados no chão, com um mato ralo. Ao fundo, uma paisagem de montanhas.
Soldados observam colinas durante visita do comandante das forças estadunidenses e da OTAN no Afeganistão, general Scott Miller, ao posto militar da província de Wardak - Thomas Watkins/AFP

Se o lado americano aceitar a oferta, isso pode ser o fato mais significativo nas negociações desde que foram retomadas após o presidente Donald Trump ter afundado o processo de paz na véspera de um acordo, em setembro passado.

Embora a promessa de reduzir a violência fique aquém do cessar-fogo amplo e de longo prazo buscado pelo governo afegão, diplomatas ocidentais disseram que seria difícil conseguir que o Taleban concordasse com mais do que uma redução pequena nos ataques antes de a retirada das forças estrangeiras começar a acontecer.

Os detalhes da oferta –confirmada por representantes ocidentais e do Taleban familiarizados com as negociações —não ficaram claros, mas o Taleban já disse no passado que uma redução na violência significaria reduzir o número de ataques lançados nas maiores cidades e rodovias.

Também não ficou claro por quanto tempo a redução vai durar –embora um representante do Taleban tenha sugerido que ela vigoraria por um prazo de sete a dez dias—ou se o lado americano aceitou a proposta do Taleban, apresentada na quarta-feira (15). Na quinta-feira os dois lados continuaram a negociar.

Em um sinal de que as discussões podem ter alcançado uma etapa importante, o comandante maior das forças dos EUA e da Otan no Afeganistão, general Austin Miller, juntou-se à equipe negociadora dos EUA em Doha.

A questão de concordar ou não com um cessar-fogo antes da saída dos 13 mil militares americanos e milhares de tropas da Otan do país é uma questão existencial para o Taleban, que enxerga a violência como sua maior fonte de influência. Os insurgentes passaram mais de um mês deliberando sobre a exigência de Washington.

Membros da equipe de negociadores do Taleban viajaram várias vezes de Doha, no Qatar, onde as discussões são realizadas, para consultar os líderes e comandantes do Taleban no Paquistão, país onde eles têm refúgio seguro. No final, eles voltaram aos americanos com a proposta de reduzir a violência por um período breve. Alguns representantes sugeriram que o arranjo pode essencialmente representar um cessar-fogo –em que não são lançados ataques —sem o uso explícito do termo, que alguns líderes do Taleban creem que dividiria suas fileiras.

A disposição do Taleban de reduzir a violência provavelmente levará à assinatura do acordo entre os insurgentes e os Estados Unidos, que prevê uma retirada gradual das tropas americanas no Afeganistão em troca da promessa do Taleban de que o solo afegão não será usado por organizações terroristas internacionais para lançar ataques contra os EUA e seus aliados. A assinatura do pacto então levaria o processo de paz para sua etapa seguinte, em que os insurgentes se sentariam para um diálogo com o governo afegão, algo até agora excluído das negociações, e com outras facções políticas, para negociar a futura partilha do poder.

O Taleban se recusou a negociar com o governo afegão no passado, descrevendo-o como fantoche americano. Mas em setembro, antes de Trump ter derrubado um acordo de paz que estava quase assinado, uma rodada de negociações prevista para incluir alguns membros da administração do presidente Ashraf Ghani tinha sido planejada para Oslo para logo após a assinatura de um acordo entre o Taleban e os Estados Unidos. O governo afegão ainda parecia estar buscando um cessar-fogo extenso. O assessor de segurança nacional Hamdullah Mohib disse em conferência em Nova Déli na quarta-feira (15) que os líderes afegãos encaram um cessar-fogo como sinal da disposição séria do Taleban de buscar uma paz genuína e de que o Taleban (que o governo afegão vê há anos como representante das forças armadas paquistanesas) é capaz de cumprir o que prometer quando firmar o acordo.

“Para o nosso povo, a paz significa o fim da violência”, disse Mohib. “É por isso que insistimos que um cessar-fogo é necessário para criar um ambiente propício às conversações.” Um cessar-fogo, ele acrescentou, “vai provar para o povo e o governo afegãos que nossos inimigos têm intenções sérias em relação à paz e têm condições de cumprir com sua parte de um acordo futuro.”

Quando Trump abandonou as negociações, a política dos EUA no Afeganistão ficou em estado de confusão, levando ao receio de que Trump, que há muito tempo falava publicamente sobre seu cansaço com a guerra, poderia retirar as tropas americanas do país sem sequer um acordo. Mas também abriu uma janela de reflexão sobre um processo de paz que muitos consideravam estar ocorrendo com pressa excessiva.

Os líderes afegãos, que temiam que seus aliados americanos os estivessem abandonando, enxergaram uma oportunidade para corrigir seu rumo e pediram que os parâmetros das negociações fossem totalmente redesenhados, enfatizando um cessar-fogo como condição prévia à retomada das negociações.

O Taleban aproveitou esse período para tentar solucionar divisões em suas próprias fileiras, especialmente as desconfianças de muitos membros das forças armadas em relação a qualquer acordo com ele. O mulá Abdul Ghani Baradar, o vice-líder do Taleban que liderou as discussões, viajou ao Paquistão e promoveu vários grandes encontros, alguns com até 300 comandantes e lideranças de níveis sênior e médio, para conseguir a adesão deles ao que descreveu como sendo o melhor acordo que ele poderia negociar.

Depois de cerca de um mês de suspensão das negociações, diplomatas americanos liderados pelo negociador chefe Zalmay Khalilzad começaram a estudar medidas de fortalecimento de confiança que pudessem levar à retomada das negociações. Estas incluíram a libertação da prisão de vários líderes seniores do Taleban, iniciativa que as autoridades americanas esperam que os negociadores do Taleban possam usar para incentivar seus próprios militares a concordar com uma redução da violência.

Em sua primeira visita ao Afeganistão, em novembro, Trump anunciou a retomada das negociações. Disse que o Taleban estava interessado em um cessar-fogo. Suas declarações, que pareciam ecoar o desejo do governo afegão, parecem ter pego de surpresa tanto o Taleban quanto seus próprios assessores. Mas os dois lados retornaram à mesa de discussões, na esperança de encontrar maneiras de reduzir significativamente o derramamento de sangue, de modo que o acordo possa avançar.


Tradução de Clara Allain

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