Washington Post reintegra repórter após afastá-la por tuíte sobre Kobe Bryant

Jornalista compartilhou em rede social reportagem sobre acusação de estupro contra ex-jogador, morto no domingo (26)

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Washington

A decisão de um dos maiores jornais dos EUA de suspender uma repórter após a publicação de um tuíte sobre a acusação de estupro contra o astro da NBA Kobe Bryant ganhou grandes proporções na imprensa americana.

Na segunda (27), o Washington Post afastou a repórter de política Felicia Sonmez depois de ela compartilhar, no domingo (26), dia da morte do jogador, uma notícia de 2016 sobre um relato de assédio sexual envolvendo Bryant.

O afastamento causou protestos de centenas de profissionais de dentro e de fora do jornal. Nesta terça (28), Sonmez foi reintegrada à equipe, após o diário divulgar comunicado no qual diz ter concluído que a funcionária não violou a política de mídias sociais da empresa.

O ex-jogador de basquete Kobe Bryant antes de jogo contra o Boston Celtics
O ex-jogador de basquete Kobe Bryant antes de jogo contra o Boston Celtics - Jessica Rinaldi - 7.fev.13/Reuters

"Depois de realizar uma avaliação interna, determinamos que, embora consideremos os tuítes de Felicia inoportunos, ela não violou clara e diretamente nossa política de mídias sociais", afirmou a diretora da publicação, Tracy Grant, ressaltando que o jornal se arrependera de ter tratado publicamente da suspensão da funcionária.

"Os repórteres nas mídias sociais representam o Washington Post, e nossa política afirma: devemos estar sempre atentos a preservar a reputação do Washington Post por excelência jornalística, imparcialidade e independência", continuou Grant.

"Nós sempre pedimos moderação, o que é particularmente importante quando há mortes trágicas."

Logo após a morte de Bryant, num acidente de helicóptero, Sonmez publicou em seu Twitter uma reportagem de 2016 do site Daily Beast. 

Intitulada "O perturbador caso de estupro de Kobe Bryant: as provas de DNA, a história da acusadora e a meia confissão", o texto, que não era de autoria da repórter, trazia detalhes da acusação de estupro contra o jogador.

Em 2003, uma recepcionista de 19 anos de um hotel no estado americano de Colorado relatou à polícia local ter sido estuprada por Bryant, mas desistiu de depor à Justiça, e o caso foi encerrado com um acordo extrajudicial. 

O atleta insistia que a relação entre os dois havia sido consensual, mas chegou a dar uma declaração dizendo reconhecer que a mulher "não viu nem vê o incidente da mesma forma" que ele.

Depois de compartilhar a história, a repórter do Washington Post recebeu uma enxurrada de mais de 10 mil mensagens —a maioria negativa— e relatou ameaças de morte contra ela. 

Até mesmo o presidente Donald Trump tuitou: "Vocês, repórteres do Washington Post, não conseguem realmente se aguentar, não é mesmo?".

A direção do jornal afirmou que Sonmez estava "minando o trabalho dos colegas" ao publicar algo fora de sua área de cobertura e decidiu afastá-la temporariamente para, segundo os editores, avaliar se a repórter havia ou não violado as regras para mídias sociais da empresa.

Mais de 300 jornalistas do Washington Post assinaram uma carta, via associação de funcionários, expressando "alarme e desânimo" com a decisão de suspender a colega. 

Afirmavam que a medida abriu um precedente ruim ao endossar as críticas recebidas pela repórter nas redes sociais e que a empresa não ofereceu a proteção necessária à jornalista. 

Para eles, a política do diário para as mídias é "arbitrária e abrangente." 

"Felicia recebeu uma rajada de mensagens violentas, incluindo ameaças que continham seu endereço residencial, a reboque de um tuíte a respeito de Kobe Bryant. Em vez de proteger e apoiar sua repórter diante do abuso, o Post a colocou em suspensão administrativa enquanto os chefes da Redação avaliavam se ela tinha violado a política de redes sociais [da empresa]. Felicia teve de deixar sua casa com medo por sua segurança e recebeu orientação insuficiente do Post a respeito de como se proteger", diz a carta assinada endereçada aos editores-chefes da publicação.

O crítico de imprensa do jornal, Erik Wemple, por sua vez, publicou um longo artigo na segunda-feira (27), no próprio Washington Post, classificando o afastamento de Sonmez como equivocado.

"Se jornalistas do Post estiverem sujeitos a suspensão por tuitarem histórias fora de suas áreas de atuação, toda a Redação deveria estar de licença administrativa", escreveu Wemple.

A repórter relatou ao colega que, devido à publicação de seu endereço residencial em um dos comentários, precisou passar a noite de domingo num hotel.

Na mesma noite, ela deletou os tuítes, mas antes havia justificado sua decisão de divulgar a notícia sobre o caso de estupro contra Bryant afirmando que "figuras públicas precisam ser lembradas em sua totalidade".

"O fato de as pessoas estarem respondendo com raiva e ameaças contra mim (alguém que nem escreveu a reportagem, mas a achou bem relatada) fala muito sobre a pressão que as pessoas sofrem para ficar caladas nesses casos", escreveu Sonmez.

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