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The Washington Post Eleições EUA 2020

Áudio reproduzido por Trump expõe problema de Michael Bloomberg com política de minorias

Atos de candidato democrata quando era prefeito de Nova York passam por escrutínio

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Aaron Blake
Washington Post

Mike Bloomberg está fazendo uma campanha eleitoral heterodoxa e sem precedentes, em que ele pula as prévias nos quatro primeiros estados, mas bombardeia o resto do país usando uma verba de US$ 250 milhões.

Essa tática permitiu a ele movimentar sua campanha praticamente sem desafio, ganhando impulso.

Resultado: uma pesquisa na segunda-feira (10) mostrou que Bloomberg consegue 15% dos votos em nível nacional. A conclusão: maior escrutínio de seus atos.

Os adversários começaram a divulgar a gravação em áudio de um discurso de 2015 em que o ex-prefeito de Nova York fala em termos rudes sobre a política da cidade de parar e revistar minorias.

O básico do que Bloomberg disse foi: as minorias são responsáveis pela vasta maioria dos crimes violentos. Portanto, suas comunidades foram o alvo lógico de buscas sem mandado judicial.

E agora não só os adversários democratas de Bloomberg estão divulgando a gravação, mas também o presidente Donald Trump.

O ex-prefeito de Nova York e candidato democrata Michael Bloomberg, em campanha em Michigan - Jeff Kowalsky/AFP

​Trump, que segundo relatos estaria preocupado em ficar lado a lado com Bloomberg e seus recursos aparentemente ilimitados, publicou no Twitter o clipe na manhã de terça-feira (11), dizendo: "PUXA, BLOOMBERG É UM VERDADEIRO RACISTA!".

Trump tem telhado de vidro neste ponto. Não apenas seu histórico em questões raciais é o que é —notadamente em relação a Charlottesville—, como ele apoiou claramente a política de parar e revistar, a exemplo de um debate em 2016 e mais recentemente em 2018.

Esse é o dia que a campanha de Bloomberg devia saber que chegaria, e as perguntas a respeito são totalmente válidas.

Bloomberg, afinal, renegou a política de parar e revistar quando lançou sua candidatura à Presidência, mas antes ele a havia defendido até o limite.

Não é irracional considerar esse o maior obstáculo à nomeação democrata, dada a importância que os eleitores minoritários têm depois da primária desta terça em New Hampshire.

A gravação de 2015 de um discurso que Bloomberg fez no Instituto Aspen pode ser o exemplo mais evidente. Não é novidade —a gravação foi divulgada na época por um repórter do Aspen Times—, mas é novamente relevante.

O que Bloomberg disse:

"Queremos gastar muito dinheiro, colocar muitos policiais nas ruas, colocar esses policiais onde o crime está, que é nos bairros das minorias. Então, uma das consequências indesejadas disso é que as pessoas dizem: 'Oh, meu Deus, você está prendendo jovens por causa de maconha, e são todos de grupos minoritários'. Sim, é verdade. Por quê? Porque colocamos todos os policiais em bairros de minorias. Sim, é verdade. Por que fazemos isso? Porque é lá que o crime está."

"E a primeira coisa que você pode fazer pelas pessoas é impedir que elas sejam mortas. Nós fizemos um cálculo de quantas pessoas estariam mortas se não tivéssemos reduzido o índice de assassinatos e tirado as armas das ruas. E o modo de tirar as armas das mãos dos garotos é empurrá-los contra o muro e revistá-los. Então eles começam... Eles dizem: 'Eu não quero ser preso'. Aí eles não saem com a arma. Eles ainda têm a arma, mas a deixam em casa."

Bloomberg disse anteriormente: "É polêmico, mas o principal é, todos os... 95% dos assassinatos, assassinos e vítimas de assassinato se encaixam num 'modus operandi'. Você pode simplesmente pegar a descrição, xerocá-la e distribuir para todos os policiais. São homens de minorias, de 15 a 25 anos. Essa é a verdade em Nova York. É verdade em quase todas as cidades. E é onde está o crime real. Você tem que tirar as armas das mãos das pessoas que estão sendo mortas".

A equipe de Bloomberg tentou evitar que o discurso circulasse bloqueando as gravações, segundo o Aspen Times.

Bloomberg se retratou na véspera de entrar na disputa para 2020, em novembro, dizendo a uma igreja negra: "Eu estava errado, e sinto muito".

Um dos problemas do pré-candidato é que o momento de sua evolução pessoal sobre a questão foi totalmente conveniente. Talvez não seja inédito, mas praticamente salta aos olhos.

O outro grande problema é como ele defendia essa política com ênfase. Não é uma situação em que ele simplesmente continuou uma política de seu antecessor e a aproveitou ao máximo; ele disse diversas vezes que era a coisa certa a fazer.

Ainda em janeiro de 2019, em um discurso na Academia Naval, Bloomberg respondeu a uma pergunta sobre como essa política visava as minorias: "Nós nos concentramos em manter os garotos fora do sistema correcional... Garotos que andavam por aí parecendo que podiam ter uma arma, tirar a arma de seus bolsos e parar com isso".

Ele acrescentou que outros departamentos de polícia simplesmente não admitem que acabam policiando desproporcionalmente as comunidades de minorias.

"Eu acho que também é verdade que a maioria dos departamentos de polícia do mundo faz a mesma coisa; eles simplesmente não o relatam ou usam essa terminologia", disse ele.

Essa justificativa passa por cima do fato de que a política era polêmica não somente devido a quem ela visava, mas também pela constitucionalidade de revistar pessoas que não eram acusadas de crimes. Um juiz a derrubou em 2016 por esse motivo.

Mas a última frase citada revela a maior responsabilidade de Bloomberg nisso. Uma coisa é a política ter como consequência visar as minorias; outra é ele admitir que ela fazia isso e dizer que se justificava por esse motivo específico.

Bloomberg está contando fortemente com um grande público nas prévias da Super Terça, quando vários Estados com grande população negra votarão.

A mesma pesquisa citada acima mostrou que ele fica em segundo lugar entre os eleitores negros em todo o país, com 22%. Se isso se confirmar, será uma grande vantagem.

Mas agora ele terá que realmente defender seu histórico de uma maneira que não fez até este ponto da corrida. É o momento que sabíamos que chegaria, e é a hora de descobrir se ele é um candidato real.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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