'Meu nome gerava curiosidade no Brasil e no Japão'

Em depoimento, jornalista da Folha discute sua ascendência e período como decasségui no país asiático

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Fernando Itokazu
São Paulo

“Origem da luz” é o significado dos kanjis (ideogramas) que formam meu nome em japonês: Motomitsu.

Escolhido por meus pais, brasileiros, primordialmente por sua definição, Motomitsu me deixa bastante satisfeito: acho sonoro, diferente e com kanjis simples e elegantes.

Mas nem sempre foi assim. Moleque, não queria ser diferente a ponto de virar um alvo para a tiração de sarro. Coleguinhas sempre acharam divertido brincar com aquela estranheza. “Moto o quê?” e algo do tipo “fala, Mizumoto” eram comuns.

Sempre aceitei meio resignado, afinal, vivia em uma espécie de faroeste juvenil, no qual só os fortes sobreviviam.

Também era frequente eu ter que explicar que não, Motomitsu não era o nome da família da minha mãe, assim como Itokazu é o da do meu pai.

Quando comecei a assinar reportagens, resolvi não incluir o nome japonês: achei que ficaria muito grande.
Mas, se no Brasil o Motomitsu chamava a atenção das pessoas, no Japão era Itokazu que despertava a curiosidade.

Fui decasségui na década de 1990 em Utsunomiya, cidade que fica em Honshu, maior ilha do arquipélago japonês.

Itokazu é um nome de Okinawa, pequena província insular no extremo sul do Japão da qual saíram meus quatro avós no início do século passado. “Itokazu? Ah, seus avós são de Okinawa...”, ouvia de japoneses curiosos sobre a origem do nome não tão comum.

Como descendente de okinawanos, faço parte de uma minoria étnica e cultural perante os japoneses do arquipélago principal (formado por quatro grandes ilhas).

A literatura nos informa que Okinawa, que na língua nativa da ilha é “uchina” (pronuncia-se utiná), foi reino independente, tributário da China e Satsuma (Kagoshima), entre os séculos 15 e 19 até ser anexado pelo Japão, que tratou de impor seu idioma, suas tradições e seus valores culturais.

É por isso que entre os descendentes de okinawanos é comum o orgulho de ser “uchinanchu” (cidadão de Okinawa, em tradução livre).

E, se entre os imigrantes japoneses havia a predileção para que seus filhos se unissem com membros da comunidade, pois a intenção era um dia retornar ao Japão, na família uchinanchu também era melhor não se relacionar com “japonês estrangeiro”.

Felizmente, essa predileção ficou para trás. Minha filha, além de ser uchinanchu, tem ascendência grega.
E, diferentemente do pai, desde pequena conhece os significados de seu Sofia (sabedoria) Akie (cujos kanjis também foram escolhidos pelos avós e significam “iluminada”).

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