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Secretário de Justiça dos EUA ameaça renunciar se Trump continuar tuitando sobre investigações

William Barr alertou presidente que posts sobre casos criminais atrapalham seu trabalho

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Washington | The Washington Post

O secretário de Justiça dos EUA, William Barr, disse a pessoas próximas ao presidente Donald Trump que considera renunciar devido aos tuítes de Trump sobre investigações do Departamento de Justiça.

As informações são de três funcionários do governo, que prenunciam um possível confronto entre o presidente e seu procurador-geral a respeito da independência do Departamento de Justiça.

Até agora, Trump resistiu aos pedidos de Barr, tanto públicos quanto privados, para se calar sobre questões de aplicação da lei federal.

Não ficou claro na terça-feira (18) se Barr havia informado sua postura diretamente a Trump.

O secretário de Justiça, William Barr,
O secretário de Justiça, William Barr, durante entrevista coletiva na segunda-feira (10) - Sarah Silbiger - 10.fev.2020/AFP

Segundo funcionários do governo, Barr pareceu ter compartilhado sua posição com conselheiros na esperança de que o presidente recebesse a mensagem de que ele deveria parar de se pronunciar publicamente sobre as investigações criminais em andamento do Departamento de Justiça.

"Ele tem seus limites", disse uma pessoa próxima a Barr, falando sob condição de anonimato.

No final da semana passada, o secretário alertou publicamente o presidente em uma entrevista surpreendente à ABC News que seus tuítes sobre os casos do Departamento de Justiça "impossibilitam que eu faça meu trabalho".

Trump, segundo funcionários da Casa Branca, não é totalmente receptivo a telefonemas para mudar seu comportamento e disse às pessoas em seu entorno que não iria parar de tuitar sobre o Departamento de Justiça.

Eles disseram que Trump acredita que destacar a má conduta do FBI e do Departamento de Justiça seja uma boa mensagem política.

O impasse entre Trump e Barr se intensificou na terça, quando o presidente declarou em uma série de tuítes no início da manhã que ele poderia processar os envolvidos na investigação do assessor especial sobre sua campanha de 2016 e sugeriu que Roger Stone, seu amigo condenado por mentir ao Congresso nessa investigação, merecia um novo julgamento.

Horas depois, um funcionário do Departamento de Justiça revelou que os promotores entraram com uma moção homologada na Justiça argumentando o contrário, e que eles tinham a aprovação pessoal de Barr para fazê-lo.

Um porta-voz do Departamento de Justiça se recusou a comentar. Os representantes da Casa Branca não responderam às perguntas desta reportagem. Algumas pessoas próximas a Barr alertaram que ele não tomaria uma decisão precipitada de renúncia.

Foi há apenas uma semana que o tuíte de Trump sobre a recomendação dos promotores federais de que Stone deveria ser condenado de sete a nove anos de prisão levou o Departamento de Justiça à derrocada.

Depois desse tuíte, Barr passou a intervir e reduziu a recomendação. Os quatro promotores de carreira designados para o assunto desistiram do caso, sendo que um deixou o governo.

Barr insistiu que ele tomou a decisão de se envolver antes de Trump se pronunciar, mas enfrentou um ceticismo significativo dentro e fora do Departamento de Justiça.

No fim de semana, mais de 2.000 ex-funcionários do departamento assinaram uma carta pública pedindo que Barr renunciasse por causa do tratamento dado ao caso Stone e exortaram os funcionários atuais do departamento a denunciar qualquer conduta antiética.

Jan Miller, procurador dos EUA na região central de Illinois entre 2002 e 2005, sob o comando do presidente George W. Bush, disse que assinou em parte para lembrar aos funcionários do Departamento de Justiça que "eles não estão sozinhos".

"Tenho certeza de que é um momento muito difícil de ser promotor no departamento agora."

Roger Stone
Roger Stone chega a tribunal para audiência de seu processo - Yara Nardi - 15.nov.2019/Reuters

A assessora de imprensa da Casa Branca, Stephanie Grisham, minimizou o significado da carta, dizendo que há "obstrucionistas em todo o governo que estão trabalhando contra o presidente".

O líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, republicano do Kentucky, e o presidente do Judiciário, Lindsey Graham, do Partido Republicando da Carolina do Sul, também vieram em defesa de Barr em uma declaração conjunta.

"A nação tem sorte de o presidente Trump ter escolhido um funcionário público tão forte e altruísta para comandar o Departamento de Justiça", escreveram. "Esperamos que, como sempre, os esforços para intimidar o procurador-geral sejam profundamente insuficientes."

Nas semanas que antecederam a entrevista à TV, Barr também disse em particular ao presidente que parasse de falar publicamente sobre assuntos do Departamento de Justiça, segundo uma pessoa familiarizada com as discussões. Mas seus comentários aparentemente caíram no vazio.

No dia seguinte, Trump tuitou que tinha o "direito legal" de pedir a Barr para intervir em um processo criminal.

Trump disse na terça-feira que tem "total confiança" em Barr e admitiu: "Eu realmente dificulto o trabalho dele". Ele também afirmou, porém, que ele, e não seu procurador-geral, é "a principal autoridade da lei do país".

"O procurador-geral é um homem com grande integridade", disse Trump. "Eu escolhi não me envolver. Tenho autorização para me envolver. Eu poderia estar envolvido, se quisesse."

Há meses, Trump tem demonstrado raiva, de forma privada, com o fato de o Departamento de Justiça não ter acusado aqueles que ele considera inimigos políticos, e pessoas familiarizadas com o assunto dizem que ele está particularmente chateado com a decisão revelada na semana passada de não acusar o ex-diretor interino do FBI Andrew McCabe de mentir para os investigadores, explorando uma divulgação na imprensa.

McCabe autorizou o FBI a começar a investigar Trump pessoalmente em 2017, por possível obstrução da justiça em conexão com o inquérito sobre sua campanha estar ou não em coordenação com a Rússia, e sugeriu que ele poderia processar os envolvidos.

Esse caso foi, por fim, retomado pelo assessor especial Robert Mueller.

Trump também reclamou aos colaboradores que ele não pode ver as constatações do procurador dos EUA John Durham, a quem Barr encarregou de examinar as origens do inquérito sobre a Rússia.

A investigação de Durham está em andamento e ele ainda não preparou nenhum relatório detalhando suas conclusões.

Segundo pessoas familiarizadas com o assunto, Trump não tem planos de afastar Barr da procuradoria-geral, apesar de suas frustrações. Além de sua entrevista à ABC News, Barr tem sido um secretário de gabinete particularmente leal e eficaz, disposto a aceitar críticas políticas pelo presidente.

Barr aguentou críticas significativas sobre como ele selecionou as conclusões da investigação de Mueller de uma maneira que alguns consideraram excessivamente favorável a Trump e por encomendar análises internas do Departamento de Justiça sobre questões politicamente sensíveis, incluindo a investigação da Rússia, à qual Trump se opunha.

Mas Barr tem se mostrado persistentemente incomodado com os tuítes de Trump, e ele viu o comentário do presidente sobre Stone na semana passada como uma espécie de gota d'água.

Trump evitou falar sobre a aplicação da lei no fim de semana, antes de entrar em ação mais uma vez na manhã de terça-feira.

O presidente citou amplamente Andrew Napolitano, um ex-juiz do Tribunal Superior de Nova Jersey e comentarista da Fox News que, segundo o relato de Trump, argumentou que Stone deveria receber um novo julgamento baseado no "viés inequívoco e declarado do presidente do júri".

"Está bastante óbvio que ele deveria [ter um novo julgamento]", disse Trump citando Napolitano.

Trump também repetiu velhos ataques à investigação de Mueller.

"Todo o acordo foi uma farsa total. Se eu não fosse presidente, estaria processando todos", escreveu Trump. "MAS TALVEZ EU AINDA O FAÇA. CAÇA ÀS BRUXAS!"

Grisham disse na terça-feira que "o presidente está obviamente frustrado".

"Há três anos ele está sendo atacado de uma maneira ou de outra, e o relatório Mueller é outro exemplo disso", disse Grisham durante uma aparição no programa "Fox & Friends", durante o qual ela também abordou o caso Stone.

"Quero dizer que o primeiro jurado era alguém que falara abertamente sobre não gostar do presidente Trump ou de seus apoiadores. Isso é assustador."

Os tuítes foram publicados pouco antes de promotores e advogados de defesa se reunirem para uma audiência no caso Stone para determinar se o pedido de Stone para um novo julgamento precisava ser resolvido antes de sua sentença, marcada para quinta-feira (20).

A equipe de Stone exigiu o novo julgamento na sexta-feira (14), um dia depois de Trump sugerir que a primeira jurada no processo federal tinha "um viés significativo".

Trump estava se referindo a Tomeka Hart, ex-presidente do Conselho de Comissários de Escolas da Cidade de Memphis e uma mal sucedida candidata democrata ao Congresso.

Hart se identificou como a primeira jurada em um post no Facebook, dizendo que "não podia mais ficar calada" após uma ação do Departamento de Justiça para reduzir sua recomendação de sentença para Stone.

A juíza distrital dos EUA, Amy Berman Jackson, que está presidindo o processo de Stone, decidiu que ele será sentenciado na quinta-feira, embora a "execução da sentença possa ser adiada" enquanto ela decide se ele merece um novo julgamento.

O Departamento de Justiça é distintamente contra Stone nesse assunto —com a aprovação de Barr—, e um funcionário do Departamento de Justiça disse que a decisão "foi tomada independentemente da Casa Branca".

Trump disse a repórteres na terça-feira achar que Stone havia sido "tratado injustamente", mas que não havia pensado em perdoá-lo.

Trump concedeu perdão para outros políticos na terça-feira, incluindo Rod Blagojevich, o ex-governador de Illinois que foi condenado por acusações de corrupção em 2011, por tentar vender o assento desocupado do então presidente Barack Obama no Senado, e Bernard Kerik, ex-comissário de polícia de Nova York preso por oito acusações criminais, incluindo fraude fiscal.

Questionado se Stone merece algum tempo de prisão, Trump negou, dizendo: "Você vai ver o que acontece".

Stone é amigo e conselheiro de Trump desde a década de 1980 e foi uma figura importante em sua campanha de 2016, trabalhando para descobrir informações prejudiciais sobre a adversária democrata Hillary Clinton.

Um júri condenou Stone em novembro por adulterar testemunhos e mentir ao Congresso sobre suas ações para reunir informações prejudiciais sobre Clinton.

Sua condenação foi a última fixada por Mueller como parte de sua investigação sobre a interferência russa nas eleições de 2016.

A defesa de Stone pediu liberdade condicional, citando sua idade, 67 anos, e a inexistência de antecedentes criminais.

Tradução de AGFox

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