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Coronavírus

Depoimento: Em Milão, minha filha de 5 anos olha o céu azul lá fora e não aceita

Mesmo explicando os perigos do coronavírus, a nova regra não entra na cabeça dela

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Milão

Proibido andar na calçada sem justificativa de trabalho ou saúde. Proibido entrar em parques e jardins. Proibido brincar nos parquinhos infantis. O uso do espaço público, um dos pilares da rotina em Milão, nunca esteve tão limitado.

É proibido até se sentar nos bancos das praças, lacrados com fitas iguais àquelas das cenas de crimes das séries de TV.

Até sexta (20), a lista de regras impostas pelo governo italiano para barrar a difusão do coronavírus ainda era imprecisa sobre a prática de atividades esportivas nas ruas.

Mas, diante de uma legião de corredores que, das primeiras horas da manhã às primeiras da noite, passou a tomar conta da cidade deserta, isso também passou a ser controlado.

Uma nova ordem determina que correr só é consentido a quem estiver nas redondezas da própria casa e sozinho. Se alguém passar por perto, conhecido ou não, que seja respeitada a distância mínima de um metro por pessoa.

Para que não haja dúvida: “Não é consentido realizar atividade lúdica ou recreativa ao ar livre”. Sob pena de multa e prisão. Assinado, Ministério da Saúde.

A quarentena total que vigora na Itália há duas semanas transformou minha vida familiar de muitas formas. As crianças não podem mais ir à escola, não existem mais museus nem qualquer outra atividade cultural em funcionamento. Restaurantes, bares, cafés e sorveterias estão fechados. Tudo foi cancelado.

Mas uma das decisões mais difíceis é essa que impede a gente de ir a praças e parques da vizinhança. Isso faz (fazia) parte da nossa programação nas tardes depois da escola e, obrigatoriamente, nas manhãs de sábado e de domingo.

Como a imensa maioria dos predinhos residenciais de Milão, o nosso não tem espaço recreativo. O verde de parques e praças é entendido como uma extensão das casas, a ser ocupado. A maioria dos parquinhos é bem cuidada e inclusiva, e muitos têm sinalização em braile e brinquedos para quem tem mobilidade reduzida. Grátis.

É um espaço em que as crianças alargam os seus vínculos sociais, fazendo amizades de ocasião com quem estiver ali.

Eu entendo por que não é mais possível ir aos parques e às pracinhas. Mas e minha filha de cinco anos? Mesmo explicando os perigos do coronavírus, mostrando que não se trata de um castigo pessoal, que nenhuma criança atualmente pode sair de casa, não entra na cabeça dela essa nova regra. Ela olha para o céu azul lá fora e não aceita.

Acostumada a ir para a escola de patinete ou bicicleta, Rosa hoje não tem permissão nem para fazer isso no entorno do quarteirão. O parquinho, a duas quadras de casa, está trancado.

A emergência que aflige a Lombardia já dura um mês. Quando começou, os dias eram bem frios. Estávamos acostumados a ficar entocados em casa. Mas a cada dia fica mais difícil. Vai ser duro ver a primavera chegar atrás das janelas.

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