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Lúcia Valentim Rodrigues

Quando soou a sirene do toque de recolher, já era possível sentir o medo no ar

Pesquisas mostram que a maior parte dos chilenos apoia medidas de confinamento

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Lúcia Valentim Rodrigues
Santiago

Minha família se mudou para Santiago em janeiro, portanto já sabendo da convulsão social que havia se instalado no país. Em outubro do ano passado, um protesto gigantesco mobilizou mais de um quarto da população rumo às ruas, quando a nossa vinda ao país já estava acertada e nos preparativos finais.

Num cenário de manifestações diárias desde então, era de se esperar atitudes repressivas e agressivas por parte do governo de Sebastián Piñera. E elas vieram, num reaparelhamento das forças de segurança e uma espécie de "carta branca" para os policiais.

Moradores usando máscaras andam em rua de Santiago após deixarem um hospital
Moradores usando máscaras andam em rua de Santiago após deixarem um hospital - Martin Bernetti/AFP

Pensando que o pior já tinha passado, eu não acreditei que vivenciaria um toque de recolher. Muito menos que ele seria decretado não para conter os manifestantes, mas por medo da Covid-19.

O domingo, primeiro dia da medida, teve um clima estranho. Durante a tarde, o Corpo de Bombeiros soou um alarme para pedir que a população ficasse em casa. Pediam apoio para seu trabalho e reforçavam as demandas por isolamentos voluntários. Quando a sirene tocou novamente, desta vez à noite, era para avisar o início da proibição de sair às ruas. Piñera decretou o toque de recolher das 22h às 5h.

Os chilenos obedeceram em grande parte. Já era possível sentir o medo no ar. Houve alguns carros quebrando a imposição e transitando durante a madrugada, mas nada que afetasse o sucesso da medida.

A população apoia o endurecimento das medidas sanitárias e de contenção dos casos. Uns poucos saíram às janelas para bater panelas.

Mas eram de se contar nos dedos.

Segundo a mais recente pesquisa Cadem, divulgada nesta segunda (23), mais de 80% apoiam o decreto de catástrofe nacional, além do fechamento de bares e shoppings no país.

O levantamento, feito através de pesquisa pelo telefone com 702 pessoas entre 18 e 20 de março, também apontou que 60% dos chilenos estão "muito ou bastante" preocupados com a chance de serem contaminados pelo vírus.

Isso representa uma alta de oito pontos percentuais em relação a pesquisa feita na semana anterior e de 39 pontos em relação ao primeiro levantamento, de 3 de março.

Pela manhã, contudo, houve caos no transporte público, com os empregados que não foram dispensados ou fazem parte do serviço essencial se aglomerando nas plataformas de metrô e ônibus. Para quem entrava às 7h, era pouco tempo. O sistema não deu conta.

O governo reconheceu o problema e pediu que as empresas façam um escalonamento das entradas dos funcionários. Também vai liberar que os motoristas de transporte público comecem a jornada mais cedo. O Metrô funcionará a partir das 6h30, indo até as 19h30. Já os ônibus rodam das 5h30 até bem próximo ao início do toque de recolher.

O subsecretário do Interior, Juan Francisco Galli, disse ter havido 146 pessoas detidas no primeiro dia da medida. Sem detalhar os números, afirmou que muitos tinham motivo para estar nas ruas, fazendo parte do serviço essencial. Já outros ficaram nas delegacias até depois das 5h, retornando a suas casas.

O último balanço divulgado pelo Ministério da Saúde chileno aponta um total de 746 infectados, dois mortos e 114 novos casos registrados no dia de ontem (22).

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