Descrição de chapéu Financial Times

Principal cientista da UE renuncia por fraca reação dos países ao coronavírus

Mauro Ferrari, do Conselho Europeu de Pesquisa, critica a ação descoordenada contra a Covid-19

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Clive Cookson Michael Peel
Paris e Bruxelas | Financial Times

O presidente do Conselho Europeu de Pesquisa —o principal cientista da Europa— renunciou depois de não conseguir convencer Bruxelas a montar um programa científico em grande escala para combater a Covid-19.

O professor Mauro Ferrari, que iniciou um mandato de quatro anos como líder da principal instituição científica da Europa em 1º de janeiro, apresentou sua renúncia à presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na tarde de terça-feira (7).

"Fiquei extremamente decepcionado com a reação europeia à Covid-19", disse ele em um comunicado ao Financial Times. "Cheguei ao ERC como um fervoroso defensor da UE, [mas] a crise da Covid-19 mudou completamente minha opinião, embora eu continue apoiando com entusiasmo os ideais de colaboração internacional."

O Conselho Europeu de Pesquisa (ERC na sigla em inglês) foi criado em 2007 para financiar os melhores cientistas europeus e tornou-se um dos órgãos de financiamento mais prestigiosos do mundo, com um orçamento anual de aproximadamente 2 bilhões de euros (cerca de R$ 11,3 bilhões).

Mauro Ferrari fala no encontro anual do Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça - Faruk Pinjo - 21.jan.2020 / World Economic Forum

O professor Ferrari, um ítalo-americano pioneiro em nanomedicina, disse que sua rixa com a Comissão Europeia começou no início de março, "quando ficou evidente que a pandemia seria uma tragédia de proporções possivelmente sem precedentes".

Ele disse que propôs criar um programa especial do ERC para combater a Covid-19. "Pensei que num momento como este os melhores cientistas do mundo deveriam ter recursos e oportunidades para combater a pandemia, com novas drogas, novas vacinas, novas ferramentas de diagnóstico, novas abordagens comportamentais dinâmicas baseadas na ciência, para substituir as intuições muitas vezes improvisadas dos líderes políticos", disse ele.

Mas o Conselho Científico do ERC, seu órgão governante, recusou por unanimidade a ideia, disse ele, alegando que sua alçada só permite que financie pesquisas "de baixo para cima" propostas por cientistas, e não programas maiores "de cima para baixo" com objetivos definidos por líderes da UE.

"Eu afirmei que este não é o momento para a governança científica se preocupar excessivamente com as sutilezas das distinções entre pesquisa de baixo para cima ou de cima para baixo", disse o professor Ferrari, que passou a maior parte de sua carreira como um importante pesquisador de câncer nos Estados Unidos.

Ele disse que teve uma segunda chance quando Von der Leyen lhe pediu sua opinião sobre a abordagem da pandemia. Então ele desenvolveu um plano "para o qual ela contribuiu com diretrizes substanciais".

"O próprio fato de que eu trabalhei diretamente com ela gerou uma tempestade política interna", disse ele.

"A proposta foi passada por diferentes camadas da administração da Comissão Europeia, onde acredito que se desintegrou com o impacto."

A comissão confirmou que Ferrari se demitiu, mas não respondeu a um pedido de comentários.

O professor lamentou "a completa ausência de coordenação de políticas de saúde entre os países membros, a oposição recorrente a iniciativas de apoio financeiro coeso, os constantes fechamentos unilaterais de fronteiras" na UE.

A pandemia instigou as tensões no bloco e causou críticas de que alguns países deixaram de cooperar ou mostrar solidariedade aos mais atingidos pelo coronavírus.

Janez Lenarcic, comissário de gestão de crises da UE, disse na terça que os países membros inicialmente não ofereceram a ajuda necessária à Itália conforme crescia o número de mortos.

"Houve uma resposta inadequada ao pedido de ajuda da Itália por parte de outros países membros da UE", disse ele a repórteres em Bruxelas na terça, ao revelar um plano para enviar médicos e enfermeiras da Romênia à Noruega e à Itália. "Mas as coisas mudaram agora."

Com o acordo da comissão, Ferrari permaneceu como professor-adjunto em tempo parcial na Escola de Farmácia da Universidade de Washington, em Seattle, depois que se tornou presidente do ERC. Agora ele pretende montar uma iniciativa internacional de pesquisa para combater a Covid-19 a partir dos EUA.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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