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Diário de confinamento: 'Redescobrindo o amor'

Ou, pelo menos, o amor por viajar: é o que espera o setor turístico espanhol pós-crise

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Barcelona

Dia #57 – Sábado, 9 de maio. Cena: a polícia de Sevilha desmantelou uma festa de 29 pessoas. Multas pra todo mundo, e uma especial de 10 mil euros (R$ 62 mil) pro organizador.

Quando eu cheguei a terras espanholas, uns quantos anos atrás, fui viver um tempo numa cidade mágica.

Do meu balcão no centro antigo —uma mescla de ruas medievais e vestígios romanos, arrebanhados por uma muralha de pedra monumental—, eu avistava o único arco remanescente do Fórum de Tarraco.

Nada mau.

A pouco mais de uma hora ao sul de Barcelona, Tarragona (seu nome muderno), na Catalunha, é uma cidade litorânea povoada de maravilhas.

Casal caminha pelo passeio de Salou, próximo a Tarragona
Casal caminha pelo passeio de Salou, próximo a Tarragona - Josep Lago - 12.mar.20/AFP

Parte estelar da chamada Costa Dourada, leva o crédito de haver sido a mais antiga e importante capital do Império Romano na Península Ibérica e é uma das 15 cidades espanholas que ostentam hoje o título de Patrimônio Histórico da Humanidade.

Pois esse grupo, que inclui outras joias nacionais, como Toledo, Córdoba e Santiago de Compostela, se uniu pra lançar nesta semana uma campanha internacional de apelo turístico, com um vídeo bunito que mostra os melhores ângulos históricos de seus monumentos e gente feliz passeando e tirando selfies.

O mote: "Cidades Patrimônio Contigo". Contigo, claro, no mundo cor-de-rosa pós-coronavírus, quando, esperam, esperamos, espera-se, retomaremos o direito de ir e vir —e de viajar.

Nesta semana, Reyes Maroto, ministra da Indústria, Comércio e Turismo, destacou que o setor turístico será "chave" para a recuperação econômica espanhola, assim como aconteceu durante a super crise de 2004-2011.

No âmbito doméstico, anunciou um "plano de relançamento do turismo" —uma série de protocolos e ajudas que será decidida em conjunto com o setor.

Mas também reiterou a preocupação por uma resposta europeia à crise. Com a iminente reabertura do espaço aéreo civil no continente, a coordenação internacional será fundamental.

Desde abril, as ilhas Canárias e as Baleares (que incluem, por exemplo, Ibiza, Mallorca e Formentera) vêm pressionando o governo espanhol pela reabertura internacional dos aeroportos locais. Os arquipélagos estão entre as áreas menos atingidas pelo vírus no país.

Fundada uns dois séculos a.C., na esteira da Guerra Púnica contra os cartaginenses, Tarragona conheceu seu primeiro momento-ilha-de-Caras por volta de 49 a.C., quando Júlio César e Augusto passaram uma temporadinha na colônia.

Depois, entre 27-25 a.C., teve outro instante de fama quando Augusto se mudou pra lá em persona e exército pra dirigir da bela fortaleza-no-alto-da-montanha-com-vista-pro-mar a campanha contra uns rebeldes (de onde hoje estão Cantábria e Astúrias).

Desde então, por ali passaram visigodos, berberes, mouros, cristãos, normandos, franceses, franquistas e outros muitos, deixando pra trás guerras, mortes, monumentos, lápides e –algumas– heranças arquitetônicas.

Antes do coronavírus, a cidade era um dos principais destinos turísticos da costa mediterrânea espanhola. Recebeu, em 2019, algo como 3 milhões de visitantes. Não só por terra: houve um boom de cruzeiros, com 98 mil viajantes, um aumento de 90% em relação ao ano anterior.

Como os moradores de Barcelona, muitos tarraconenses nutrem sentimentos controversos sobre o crescimento turístico da cidade: a economia sem dúvida se beneficia, mas babau paz de espírito.

Alguns balneários da província de Tarragona, como Salou e Cambrils, são tão famosos entre turistas ingleses e americanos que muitos estabelecimentos, menus e cartazes sequer utilizam a língua local.

No verão, discotecas e hotéis ficam coalhados de grupos de jovens estrangeiros naquele taquicárdico mode life-is-now.

Apartamentos de Airbnb estão por toda a parte (inclusive —voltando a Barcelona city— há um colado à minha parede), e durma-se com um barulho desses.

Como outras pessoas que conheço, já tive vááááários problemas com turistas sem corazón, que decidem montar festinha às 2h de uma quarta, só porque it’s Barcelowna.

Uma de minhas lembranças mais queridas em Tarragona, à parte os amigos, são dois shows que fiz num espaço ao lado do portentoso anfiteatro romano de Tarragona, diante do mar Mediterrâneo.

Pros tarraconenses talvez tenha sido um instantâneo prosaico de um fim de semana qualquer. Mas pra imigrante brasileña que vos fala foram Memorabile Temporis.

Já dá pra ver que sou fã da cidade. Não trabalho pra prefeitura. Mas recomendo. Quando der, tá? Logo menos.

“Músicas para Quarentenas” podem ser escutadas aqui.

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