Robôs entregadores viram protagonistas de cidade inglesa em quarentena

Máquinas acionadas por aplicativo levam comida e compras de supermercado

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Cade Metz Erin Griffith
The New York Times

Se algum lugar estava preparado para uma quarentena, esse lugar era Milton Keynes. Dois anos antes da pandemia de coronavírus, uma startup chamada Starship Technologies lançou uma frota de robôs entregadores na pequena cidade a 80 km ao noroeste de Londres.

Os robôs baixinhos se movem sobre seis rodas e levavam comida para delivery e compras de supermercado para casas e escritórios. Com a chegada do coronavírus, a Starship desviou a ênfase da frota ainda mais para as entregas de compras de supermercado.

Moradores da cidade, como Emma Maslin, podiam comprar da loja da esquina sem qualquer contato humano. “Não há interação social com um robô”, disse Maslin.

A utilidade repentina dos robôs para pessoas que não podem sair de casa traz um indício interessante do que as máquinas podem vir a realizar um dia, pelo menos sob condições ideais.

Robô entregador em Milton Keynes, no Reino Unido
Robô entregador em Milton Keynes, no Reino Unido - Andrew Boyers - 21.abr.20/Reuters

Com 270 mil habitantes e uma rede extensa de ciclovias, Milton Keynes é um lugar perfeitamente adequado para robôs sobre rodas. A demanda vem sendo tão alta nas últimas semanas que alguns moradores da cidade passaram dias tentando programar uma entrega.

Empresas de lugares desde o Vale do Silício até Somerville, Massachusetts, vêm injetando bilhões de dólares nos últimos anos no desenvolvimento de produtos que vão de carros autônomos, que prescindem de motoristas, até robôs para uso em armazéns. A tecnologia está sendo aprimorada rapidamente.

Os robôs podem ajudar com entregas, transporte, reciclagem e manufatura.

Mas mesmo algumas tarefas simples, como as entregas robóticas, ainda enfrentam obstáculos técnicos e logísticos. Os robôs de Milton Keynes, por exemplo, não conseguem transportar mais que duas sacolas de supermercado.

“Não dá para fazer uma compra grande”, explicou Maslin. “Os robôs não fazem entregas dos grandes supermercados.”

A pandemia pode ter intensificado a demanda, mas não mudou o que é possível fazer com robôs, disse Elliot Katz, que ajuda a administrar a Phantom Auto.

A startup ajuda empresas a controlar veículos autônomos a distância quando eles se deparam com situações que não conseguem driblar sozinhos.

“Há um limite ao que um robô de entregas pode levar a um humano”, disse Katz. “Mas você tem que começar de algum lugar.”

Fundada em 2014 com um investimento de mais de US$ 80 milhões (R$ 454,7 milhões), a Starship Technologies tem sua sede em San Francisco.

Ela já levou a maioria de seus robôs a campi universitários dos Estados Unidos. Equipados com câmeras, radares e outros sensores, eles se orientam verificando o lugar onde estão em relação a mapas digitais construídos pela empresa em cada local.

A empresa escolheu Milton Keynes para lançar os robôs de maneira mais ampla em parte porque é um lugar onde os robôs conseguem se deslocar com relativa facilidade.

Construída depois da Segunda Guerra Mundial, a cidade foi planejada cuidadosamente. Quase todas as ruas estão dispostas numa grade, e ciclovias e caminhos para pedestres, conhecidos como “redways”, correm em paralelo.

Quando os robôs da Starship primeiro chegaram a Milton Keynes, uma das cidades que cresce mais rapidamente no Reino Unido, Liss Page os achou bonitinhos, mas sem utilidade. “O primeiro robô que vi estava preso no meio-fio diante de minha casa”, conta ela.

Mas no início de abril ela abriu uma carta do Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS) recomendando que ela não saísse de casa porque sua asma e outras condições médicas a deixam especialmente vulnerável ao coronavírus.

Nas semanas seguintes, os robôs passaram a lhe servir como um vínculo muito necessário com o mundo externo.

Entregas pequenas são boas para Page, que vive sozinha. Vegana, ela pode encomendar leite de nozes e margarina para serem entregues em casa.

Mas, como as vans de supermercados que fazem entregas maiores em toda a cidade, os robôs da Starship enfrentam uma limitação –a disponibilidade real de produtos nas prateleiras.

“Você completa seu pedido com coisas que não precisa realmente, para que valha a pena pagar a taxa de entrega”, disse Page. “Na última entrega, só recebi as coisas que eu não precisava realmente.”

Funcionária de supermercado coloca sacolas de compras em um dos robôs entregadores de Milton Keynes, no Reino Unido - Andrew Boyers - 21.abr.20/Reuters

Moradores como ela fazem seus pedidos por meio de um aplicativo de smartphone. Normalmente pagam uma libra britânica (R$ 6,70) por cada entrega, mas, em Milton Keynes, a Starship aumentou o preço para até duas libras nos horários mais procurados, em um esforço para distribuir a demanda mais igualmente ao longo do dia.

Os robôs fazem entregas gratuitas a médicos, enfermeiros e outros profissionais do NHS. Eles chegam a participar da homenagem prestada todas as quintas-feiras à noite aos funcionários do NHS, piscando seus faróis enquanto os habitantes aplaudem de suas portas.

A frota de robôs vai aumentar em breve, passando de 80 para cem robôs.

Milton Keynes pode ser o lugar do mundo que mais utiliza robôs de entrega, mas outras cidades vêm seguindo seu exemplo nos últimos anos.

Em Christiansburg, no estado americano da Virgínia, Paul e Susie Sensmeier podem encomendar entregas de farmácia e padaria por drone voador. A Wing, uma subsidiária da Alphabet, empresa mãe do Google, vem oferendo entregas por drone na região desde o outono do ano passado.

Eles podem pedir penne, molho marinara e papel higiênico, mas não podem encomendar medicamentos vendidos com receita médica. Os drones da Wing são carregados com os produtos num armazém da Wing, não numa farmácia.

E, como os robôs de Milton Keynes, há um limite ao volume que conseguem transportar. “Só posso pedir dois muffins ou dois croissants”, disse Susie Seinsmeier, 81.

Modelo de drone da Wing usado para fazer entregas nos Estados Unidos - Wing Aviation LLC/Divulgação - 19.set.19/AFP

Empresas como a Wing e a Starship esperam poder ampliar esses serviços e aprimorar suas competências. Agora há um incentivo adicional.

“De uma hora para outra, as entregas passaram de conveniência para serviço vital”, explicou o executivo-chefe da Starship, Lex Bayer. “Nossos robôs estão em uso sem parar, 14 horas por dia.”

A empresa vem expandindo a área que atende em Milton Keynes, dobrando sua frota e formando parcerias com vários supermercados novos. Recentemente ela lançou um serviço em Chevy Chase, Maryland, não muito longe de Washington.

Analista comercial de 51 anos de idade que vive em Milton Keynes há mais de um quarto de século, Liss Page acha que o serviço de entregas por robô pode virar um negócio viável.

“Até agora a impressão era que se tratava de um projeto criativo inovador, mas sem grande aplicação concreta”, disse ela. “A pandemia deu à empresa uma plataforma para lançar um negócio real.”

Tradução de Clara Allain

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