Descrição de chapéu Brexit

Boris Johnson rejeita adiar brexit e eleva pressão sobre acordo

Reino Unido anuncia que prazo para saída do bloco está mantido para o final do ano

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Bruxelas

O governo britânico anunciou nesta sexta (12) que rejeita oficiamente a opção de estender o período de transição para o brexit.

Assim, a separação final da união de 47 anos entre Reino Unido e União Europeia (UE) será no dia 31 de dezembro deste ano, o que aumenta a pressão para aprovar as novas regras do relacionamento entre as duas partes.

Desde o divórcio, ocorrido em 31 de janeiro, britânicos e europeus têm patinado nas discussões.

O Reino Unido quer um tratado comercial que reduza as tarifas, sem se comprometer em seguir outras regras da União Europeia, enquanto os europeus rebatem que não aceitarão um acordo em que os britânicos possam “escolher as cerejas”, ou seja, pegar só as partes que lhe interessam.

O prazo agora definitivamente apertado aumenta o risco de condições comerciais com a UE menos vantajosas, dizem analistas, o que afeta o planejamento e o custo das empresas britânicas que têm negócios com o bloco.

O vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic, durante entrevista coletiva em Bruxelas
O vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic, durante entrevista coletiva em Bruxelas - Kenzo Tribouillard/Pool/AFP

Sob críticas de setores que consideram o prazo de adaptação muito apertado, o governo britânico afirmou que o controle total das mercadorias que entram no Reino Unido só acontecerá em julho de 2021.

A decisão sobre prolongar ou não o período de transição (por um prazo máximo de até dois anos) poderia ser tomada até o final deste mês, mas o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, vinha afirmando desde as eleições de dezembro de 2019 que não pediria um adiamento.

A decisão britânica foi criticada pelos líderes de Escócia, Nicola Sturgeon, e País de Gales, Mark Drakeford, para quem o prazo muito restrito aumenta as chances de um acordo comercial que prejudicará o Reino Unido ou até de uma “desastrosa saída sem acordo”.

A Confederação da Indústria Britânica também considera o “no deal” desastroso para a recuperação econômica e para as desigualdades regionais no país. “Todas as oportunidades de crescimento devem ser aproveitadas. Um bom acordo com a UE seria a pedra fundamental da renovação”, afirmou a entidade.

A UE é o principal parceiro comercial do Reino Unido, responsável por cerca de 45% das exportações britânicas em 2018 e 53% de tudo o que os ex-parceiros compram (os números variam com critérios e taxas de câmbio).

Num dos setores mais importantes da economia britânica, o de serviços, o Reino Unido obtém 7,2% de sua receita de exportação com vendas à UE (o fluxo inverso representa só 1,1% das vendas europeias).

A indústria britânica, principalmente a mais avançada, depende de fornecedores e clientes europeus, e um impasse pode elevar muito seus custos.

Laboratórios farmacêuticos, agronegócio e indústria química também serão prejudicados se não houver entendimento sobre as regras de qualidade e segurança.

Os dois lados anunciaram nesta sexta que vão intensificar as reuniões de negociação, de mensais para semanais, priorizando dentre os 13 pontos de discussão os mais controversos.

A questão mais difícil é a exigência europeia de que o Reino Unido acate as regras trabalhistas, ambientais e de concorrência, patamares mínimos que, no jargão dos negociadores, são chamados de campo de jogo —”level playing field”, em inglês.

Depois de comunicar a decisão britânica aos europeus, um dos principais ministros de Boris, Michael Gove, escreveu em uma rede social: “Em 1º de janeiro de 2021, retomaremos o controle e recuperaremos nossa independência política e econômica".

“Retomar o controle” foi o principal slogan da campanha que levou à vitória no referendo de 2016, centrada justamente na independência em relação às normas estabelecidas pela UE.

Outro ponto delicado é como controlar o trânsito de mercadorias na ilha irlandesa, uma vez que a Irlanda é membro da UE e a Irlanda do Norte integra o Reino Unido.

O vice-presidente da Comissão Europeia, Maros Sefcovic, que liderou a delegação europeia na reunião desta sexta, disse que tomou como definitiva a declaração de Gove, mas que a UE "permanece aberta à extensão de prazo" até o final do mês.

"O relógio está correndo, e precisamos de resultados tangíveis nesse processo", disse Sefcovic.

ENTENDA O BREXIT

O que é o brexit?

É a saída do Reino Unido da União Europeia, que aconteceu em 31 de janeiro de 2020. O bloco reúne agora 27 países.

Por que houve brexit?

A saída foi aprovada pela maioria dos britânicos em referendo em 2016. O brexit foi proposto para que o Reino Unido não precisasse seguir regras e políticas comuns da União Europeia.

Se já houve o brexit, por que mais reuniões?

Para discutir as novas bases do relacionamento econômico e político entre o Reino Unido e a UE. As reuniões passam a ser semanais, e o prazo de transição termina em 31 de dezembro deste ano.

Durante a transição, o Reino Unido ainda está na UE?

Não, e por isso não participa mais do Conselho Europeu, do Parlamento ou de qualquer instância de decisão europeia. Mas continuam valendo todas as regras para cidadãos, consumidores, empresas, investidores, estudantes e pesquisadores, até que se negociem as novas bases.

A Corte de Justiça da União Europeia continua a ter jurisdição sobre o Reino Unido, inclusive em relação ao acordo de retirada.

E se não houver acordo durante a transição?

O comércio do Reino Unido com a UE passa a obedecer às regras da OMC (Organização Mundial do Comércio) a partir do dia seguinte.

O que será negociado?

Comércio de bens e serviços, investimentos, transporte, energia, regras de pesca, cooperação judicial, coordenação em ações de defesa, partilha de dados, propriedade intelectual e acesso a concursos públicos, entre outros pontos.

Quais os pontos mais controversos?

1. Regulação

É a primeira de três condições que a Europa diz serem indispensáveis para um acordo amplo de zero tarifa e zero cota: o chamado “level playing field”, ou seja, o compromisso dos britânicos de seguir regras trabalhistas, ambientais, fiscais e de subsídios vigentes na UE. O argumento é que isso evita competição desleal.Boris Johnson diz que não há intenção de baixar seus patamares de regulação, que já são no mínimo iguais aos britânicos.

2. Irlanda

A UE diz que não fará acordo sem garantia de que não haverá controle de fronteiras ou aduana entre a Irlanda do Norte (território britânico) e sua vizinha do sul. Para isso, seria preciso um controle no mar da Irlanda, que separa a ilha da Grã-Bretanha. O governo britânico, porém, tem sinalizado que não fará o controle marítimo.

3. Pesca

A UE quer garantir acesso livre às águas britânicas, enquanto Boris Johnson insiste em negociações anuais, baseadas em avaliações científicas sobre a quantidade de peixes e garantido primazia aos barcos britânicos. O Reino Unido vende 80% de seus peixes para a UE e importa de lá 70% do pescado que consome.

4. Escopo e prazo

O Reino Unido tem insistido em priorizar a discussão de livre comércio de um conjunto limitado de serviços e bens. A União Europeia afirma que não abrirá mão do patamar mínimo de regulação e que os britânicos não podem “escolher as cerejas” no acordo.

5. Setor financeiro

Londres abriga o maior centro financeiro da Europa, e quer manter seu principal mercado para serviços bancários, seguros, gestão de patrimônio e operações financeiras. A União Europeia diz que acesso livre ao mercado não faz parte da conversa e menciona apenas cooperação “voluntária” na regulação financeira.

6. Solução de disputas

Para os europeus, qualquer discordância sobre o futuro relacionamento deve ser resolvido pela Corte de Justiça da UE. Boris argumenta que a Justiça europeia não pode se sobrepor às leis britânicas e sugere órgãos de arbitragem independentes.

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