Uma coleção “com luz e com sombras”. É assim que se refere a um conjunto de 200 imagens do "lockdown" na Inglaterra Ellen Harrison, diretora de programação pública do Historic England, organização federal responsável por registrar e catalogar o patrimônio inglês.
Entre 29 de abril e 5 de maio, os ingleses foram convidados pela instituição para fotografarem as suas vidas durante a dura quarentena instituída no país para conter a disseminação do coronavírus, em um projeto chamado "Fotografando o Lockdown".
O desejo foi uma ordem: o público enviou mais de 3.000 fotografias, capturadas em todas as regiões da Inglaterra.
Túmulos em um cemitério, luvas cirúrgicas penduradas em um varal, ruas completamente vazias no centro de Londres, uma avó fotografando o neto recém-nascido do outro lado de uma janela e um carro funerário carregando o corpo de uma enfermeira que morreu de Covid-19 são algumas das imagens que formam a parte sombria da coleção.
“Trabalhamos para não embelezar nem idealizar a experiência [do 'lockdown']. Poderíamos ter tido cem fotos de arco-íris, mas daí não teríamos contado a história toda”, explica Harrison, que participou da equipe responsável pela seleção final.
"Era importante que tivéssemos as dificuldades também, fotos sobre pessoas se sentindo muito isoladas e outras mostrando a exaustão dos profissionais de saúde."
Outras fotografias otimistas retratam, por exemplo, senhoras bebendo champanhe na rua, sentadas distantes uma das outras, o desabrochar de flores na primavera do hemisfério norte e três homens se exercitando no jardim de casa. Contudo, há um ar melancólico e solitário em todas as cenas.
"O 'lockdown' foi um momento tão importante na história que precisávamos do público para ajudar a formatar o que lembraremos deste período”, acrescenta Harrison, explicando que, em geral, a documentação de eventos relevantes é feita pelos fotógrafos da organização.
A quarentena do coronavírus foi a primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial que a Historic England fez uma convocação pública para o envio de material que foi incorporado a seu acervo —em meados do século 20, as imagens se voltavam para a destruição que os bombardeios alemães provocaram na Inglaterra.
A seleção final, já disponível no site da instituição, conta com 100 imagens do público, 50 tiradas por fotógrafos da Historic England e outras 50 produzidas por dez artistas ingleses contemporâneos contratados para o projeto, dentre os quais artistas com deficiência, um afrodescendente e um de raízes asiáticas. O resultado foi uma co-criação entre cidadãos comuns e profissionais.
Harrison afirma acreditar também no processo terapêutico da produção dessas imagens.
“O 'lockdown' foi muito difícil, e isso foi uma das razões pelas quais fizemos este projeto. Como organização pública, sabíamos que um projeto como esse ajudaria as pessoas a se expressarem e a refletirem sobre sentimentos muito difíceis durante o isolamento.”
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