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Diário de confinamento: 'Em casa com o agressor'

Em abril, auge da pandemia na Espanha, houve aumento de 60% nas denúncias de violência de gênero

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Barcelona

Dia #97 – Quinta, 18 de junho. Cena: Barcelona entra hoje na fase 3, a penúltima da desescalada.

As denúncias por violência de gênero sofreram um boom durante o confinamento espanhol. Só no mês de abril, auge da pandemia no país, registrou-se um aumento de 60% nas ligações ao 016 em relação ao mesmo período em 2019.

O número está destinado a consultas, assessoramento jurídico e atendimento de emergência a vítimas.

Agora, com o país prestes a sair do estado de emergência, um recém-lançado estudo nacional sobre violência contra a mulher e feminicídio lança mais luz sobre o tema. É o maior realizado até hoje e abrange dados desde 2003, ano em que se começaram a contabilizar as informações.

Segundo o Observatório contra a Violência Doméstica e de Gênero, vinculado ao poder Judiciário e responsável pelo relatório, a média anual desse período de 16 anos é de 61,3 mortes, ou 0,13 por 100 mil habitantes.

Na foto escura, somente a mulher aparece iluminada pelo sol. Ela está caminhando e veste máscaras e luvas, uma calça de moletom marrom e um casaco leve cinza
Mulher em Barcelona após Espanha iniciar processo de relaxamento da quarentena contra o novo coronavírus - Josep Lago - 24.mai.20/AFP

É uma cifra relativamente baixa, se comparamos com as 1.314 vítimas de feminicídio só em 2019 no Brasil (0,62 por 100 mil habitantes) —um número maior do que as vítimas ao longo de todo o período abrangido pelo estudo, cerca de mil vítimas no total.

Mas nem por isso os programas nacionais de proteção às vítimas baixaram a guarda durante o confinamento. Ao contrário: na Espanha, como em todos os lugares afetados pela Covid, o isolamento domiciliar aumentou muito a potencial vulnerabilidade no ambiente doméstico.

Pensando nisso, nos últimos meses, reforçou-se aqui o atendimento telefônico das denúncias, feito em 52 idiomas.

Além disso, o chamado "plano de contingência" contra a violência de gênero colocou à disposição chats de WhatsApp para facilitar o contato, levando em consideração que muitas mulheres poderiam se encontrar presas em casa com seu agressor, sem possibilidade de comunicar-se por voz.

Durante o confinamento, também se encorajou a colaboração cidadã de vizinhos e familiares para identificar e denunciar casos de violência.

O Ministério da Igualdade chegou a lançar uma campanha de conscientização social sob o lema "Estamos contigo. #TudoIráBem", com conselhos sobre como atuar em diversas situações e cartazes que foram distribuídos em comunidades de vizinhos, supermercados, farmácias e prefeituras.

Em um cartaz destinado a edifícios e comunidades residenciais, por exemplo, lê-se: "Neste edifício, somos muitos os vizinhos e vizinhas que não toleramos a violência machista. Se você é vítima e precisa de ajuda, não duvide em contactar-nos. Lembre-se de que podemos contactar com os serviços disponíveis para você".

O app AlertCops, criado por órgãos oficiais para facilitar denúncias e consultas em situações de urgência, também pode ser utilizado em casos de violência machista.

Por meio dele é possível enviar fotos e vídeos, disparar um alarme ao toque de um botão e, inclusive, monitorar uma rede de familiares e amigos, para facilitar a identificação de qualquer emergência.

A média de idade das vítimas de feminicídio contabilizadas pelo estudo é de 42,2 anos, contra 46,3 dos agressores. Nos registros dos últimos anos, porém, há de tudo: a vítima mais jovem, assassinada em 2012, tinha 13 anos, enquanto a mais velha morreu em janeiro de 2019 aos 95 anos. Em 75% dos casos, o crime aconteceu dentro de casa.

Em 40% dos registros, o relacionamento entre agressor e vítima já havia terminado ou estava em vias de terminar. A média de idade das mulheres ao fazer uma denúncia foi de 38,9 anos, caindo muito a partir dos 45 anos.

Até abrigos pra mascotes das vítimas foram criados durante o confinamento. Embora em geral os centros de acolhida de mulheres não admitam a entrada de pets, nos últimos meses, graças a diversas associações pelos direitos dos animais, começou-se a providenciar espaços para acolhida dos bichinhos de estimação das vítimas.

Também uma questão de estatística: 30% das vítimas de violência machista possuem um animal de companhia, e em 70% a 80% desses casos as mascotes também sofrem ameaças ou agressões associadas à situação principal.

Os números de vítimas vêm discretamente diminuindo nos últimos anos, ao mesmo tempo em que aumentam as denúncias. Ainda assim, é pouco: apenas 26% das mortes registradas pelo estudo apresentavam ocorrências anteriores.

Não foi o caso, por exemplo, da vítima número mil do relatório, em 2019 —a mulher de um policial, encontrada em casa por sua filha, no belo pueblo histórico de Olot, na Catalunha.

“¡Que no quiero verla! / Que mi recuerdo se quema. / ¡Avisad a los jazmines / con su blancura pequeña!» ("La Sangre Derramada", de Federico García Lorca).

“Músicas para Quarentenas” podem ser escutadas aqui.

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