Descrição de chapéu Diplomacia Brasileira

Em cúpula, Lacalle Pou defende Mercosul sem alinhamento com EUA ou China

Presidente uruguaio assumiu nesta quinta a presidência rotativa do bloco

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Brasília

No dia em que assumiu a presidência rotativa do Mercosul, o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, afirmou que o bloco não pode, diante da queda de braço global entre Estados Unidos e China, optar por ficar mais próximo de uma das potências mundiais em detrimento da outra.

"Quero ser muito claro no que diz respeito aos EUA e à China. Não podemos cair na falsa dicotomia de estar mais próximos de um do que de outro", declarou ele nesta quinta-feira (2), durante a cúpula do Mercosul. "Os países que triunfaram no seu desenvolvimento estiveram próximos dos dois.”

A reunião dos chefes de Estado de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai ocorreu de forma virtual pela primeira vez na história devido à crise do novo coronavírus. Também participaram os presidentes de Chile, Sebastián Piñera, Colômbia, Iván Duque, e Bolívia, Jeanine Añez, além do chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell.

O presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, durante reunião virtual do Mercosul
O presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, durante reunião virtual do Mercosul - Walter Paciello/AFP

Ao destacar a necessidade de um posicionamento equidistante do Mercosul entre China e EUA —que protagonizam as maiores disputas nas áreas de comércio e tecnologia—, a fala de Lacalle Pou foi interpretada por membros do governo Jair Bolsonaro como uma queixa em relação à política de alinhamento automático do Brasil com os Estados Unidos.

Além de defender posições dos americanos, o chanceler Ernesto Araújo é criticado pela ala pragmática do governo por declarações que irritaram os chineses, hoje os maiores parceiros comerciais do país.

Auxiliares do uruguaio, no entanto, negam essa versão e dizem que Lacalle Pou apenas explicitou uma posição consolidada de seu partido na área de política externa.

Negociadores brasileiros ouvidos pela Folha avaliam, sob condição de anonimato, que o presidente do Uruguai buscou enviar uma sinalização para o setor exportador de seu país.

Segundo esses interlocutores, os uruguaios pleiteiam há tempos a assinatura de acordos comerciais com a China e com os Estados Unidos, potenciais destinos das exportações de carne do país sul-americano.

As regras do Mercosul apenas permitem que acordos de livre comércio sejam fechados com a anuência dos quatro integrantes, o que na prática trava as ambições uruguaias.

Tanto o Brasil quanto a Argentina rechaçam permitir um entendimento do Uruguai com os chineses, com medo de que produtos do gigante asiático acabem entrando sem impostos em seus países por meio do país vizinho, numa espécie de triangulação.

Os Estados Unidos, por outro lado, rejeitam uma negociação comercial com o Mercosul e trabalham por entendimentos bilaterais, sendo que a prioridade é o Brasil.

Em sua fala, Lacalle Pou também argumentou que o Mercosul deve aprofundar a relação com os chineses.

“A China manifestou formalmente a vocação de aprofundar as relações com o Mercosul. Creio que existe uma espécie de omissão do nosso bloco em responder adequadamente a essa formalidade”, afirmou.

“Nós, no nosso país, temos a convicção de que esse fortalecimento será para o bem da região. Pensemos na Ásia de 2050 e na China. Pensemos na quantidade e na qualidade de alimento que vão precisar e voltemos rapidamente à nossa região, a grande produtora de alimentos.”

O Mercosul atualmente está dividido entre as posições pró-abertura de Brasil, Uruguai e Paraguai e o protecionismo da Argentina, governada pelo peronista Alberto Fernández.

Nesse sentido, o Brasil defende uma flexibilização de normas do bloco para que acordos comerciais possam ser discutidos sem o consenso dos quatro membros, uma forma de acelerar esses entendimentos. A posição brasileira é partilhada por paraguaios e uruguaios.

Nesta quinta, um dos trechos da declaração de Lacalle Pou foi interpretado por diplomatas brasileiros como uma sinalização de que o Uruguai pretende trabalhar por maior flexibilidade nas regras do Mercosul.

“Os consensos às vezes podem significar lentidão. E por isso o consenso no Mercosul deve ser pragmático, que tenha a capacidade de analisar, de prever e de reagir nos tempos do mundo. Porque se isso [consenso] significar discussões quase acadêmicas, o mundo vai passar por cima de nós”, afirmou.

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