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Portugal cria abrigo especial para idosas vítimas de violência doméstica

Confinamento provocado pela pandemia de coronavírus levou a aumento do número de casos no país

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Lisboa

O confinamento provocado pela Covid-19 levou a um aumento no número de registros de violência doméstica em Portugal, inclusive entre mulheres com mais de 65 anos, que representaram 7,3% dos casos atendidos pela RNNAVV (Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência) durante a pandemia.

Embora tenham peso nas estatísticas, elas não são o público-alvo dos sistemas de acolhimento, que têm estruturas pensadas para receber mulheres jovens e crianças. As dificuldades do atual modelo de abrigos foram escancaradas com o crescimento dos casos no decorrer da crise sanitária.

Para tentar garantir um atendimento que supra as necessidades específicas das vítimas mais velhas, que muitas vezes sofrem agressões e abusos há décadas, o país lançou um projeto de casas-abrigos a idosas.

Mulher com máscara em ônibus na periferia de Lisboa, em Portugal
Mulher com máscara em ônibus na periferia de Lisboa, em Portugal - Patricia de Melo Moreira - 30.jun.20/AFP

Atualmente, há dois modelos principais de acolhimento em Portugal: estruturas de emergência, para estadias de no máximo 30 dias, e casas-abrigos, nas quais as vítimas permanecem por até um ano, sempre com o objetivo de recuperarem a autonomia e se reinserirem na sociedade.

A ideia é que as instalações voltadas para mulheres idosas não tenham prazo máximo de permanência e contem com cuidados básicos de saúde e interação social.

“Nosso desafio tem sido tirar da invisibilidade as idosas e as crianças, que muitas vezes aparecem diluídas neste grande chapéu de vítimas de violência doméstica", afirmou a secretária para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro.

Segundo ela, o projeto está dentro da estratégia de oferecer centros específicos para mulheres mais vulneráveis. Em 2019, por exemplo, foi criado uma estrutura para vítimas com problemas de saúde mental. Há ainda um para mulheres com deficiências e outro dedicado ao atendimento de pessoas LGBTI.

Na maior parte dos casos, as mulheres idosas são vítimas dos filhos ou de companheiros e não têm alternativa de acolhimento dentro de suas próprias famílias. Devido à proximidade com o agressor, muitas relutam em buscar atendimento.

Inicialmente, serão disponilizadas três unidades, com capacidade para receber 40 mulheres cada uma. O investimento total é de cerca de 2 milhões de euros (R$ 12,2 milhões), e os espaços, espalhados pelo país —um no Norte, um Sul e outro no Centro—, devem começar a funcionar no início de 2022.

A demora para a inauguração, de acordo com as autoridades responsáveis pelo projeto, deve-se à necessidade de reformar as estruturas que abrigarão as idosas.

O panorama em Portugal é comum a vários outros países, onde os registros de casos de violência doméstica aumentaram após o confinamento provocado pela pandemia.

Segundo o psicólogo Daniel Cotrim, responsável pela área de violência da Apav (Associação Portuguesa da Vítima), é possível que o número de atendimentos ainda aumente até o fim do ano, uma vez que a pandemia não se estabilizou no país e muitas mulheres ainda estão confinadas com seus agressores.

Cotrim afirma que a alta da procura por ajuda também tem a ver com a maior quantidade de informação disponível, com muitas organizações não governamentais atuando em parceria com as autoridades.

“Essas vítimas acabam percebendo que não vão ter de passar a vida toda como vítimas de violência, como mulheres há 20 anos muitas vezes pensavam”, avalia.

O número de atendimentos da RNAVV durante o período mais crítico do confinamento, entre 13 de abril e 30 de junho, foi de 20.063, do quais 1.537 eram de idosas.

Entre 13 de abril e 7 de junho, foram feitos 1.171 atendimentos de pessoas com mais de 65 anos. As cifras incluem pedidos de informação e atendimento jurídico e psicológico.

Entre as idosas, 20 delas precisaram sair de casa e buscar acolhimento. No total, foram instaladas nos abrigos 734 pessoas, das quais 446 já saíram das instituições com planos de reestruturação social, acolhimento de familiares, entre outros.

“É importante, mas não é só criar estruturas de acolhimento e achar que está tudo resolvido. É preciso articulação, ou então vira só um depósito de pessoas. Felizmente, isso tem acontecido”, afirma o psicólogo.

Cotrim também chamou a atenção para o fato de, em 2019, ter havido casos de feminicídio de mulheres com mais de 70 anos.

Segundo o Observatório das Mulheres Assassinadas, organizado pela ONG Umar (União de Mulheres Alternativa e Resposta), no ano passado ocorreram seis feminicídios de mulheres idosas, o que representa 21% do total desse tipo de crime no país.

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