Descrição de chapéu The New York Times China

Sob nova lei de segurança nacional, começa batalha por internet livre em Hong Kong

Território emerge na linha de frente da guerra fria tecnológica entre EUA e China

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The New York Times

Enquanto Hong Kong enfrenta uma nova lei de segurança draconiana, o pequeno território surge como a linha de frente na luta global entre os EUA e a China que envolve censura, vigilância e o futuro da internet.

Há muito tempo um baluarte de liberdade na fronteira digital da internet chinesa, rigidamente controlada, a situação instável de Hong Kong mudou radicalmente em uma semana. A nova lei autoriza a censura policial e a espionagem digital, e as regras podem ser aplicadas à expressão online no mundo inteiro.

Agora, o governo de Hong Kong está criando controles na internet que satisfaçam o mais prolífico censor do planeta, o Partido Comunista Chinês. E as mudanças ameaçam aumentar as tensões entre a China e os Estados Unidos, em que a própria tecnologia se tornou um meio para as duas superpotências econômicas tentarem aumentar sua influência e se prejudicar reciprocamente.

Manifestantes seguram cartaz com pedido de independência durante protesto contra a nova lei de segurança nacional chinesa
Manifestantes seguram cartaz com pedido de independência durante protesto contra a nova lei de segurança nacional chinesa - Anthony Wallace - 1º.jul.20/AFP

Apanhados no meio estão os 7 milhões de habitantes da cidade, registros online do ruidoso debate político —parte dos quais poderá se tornar ilegal— e as maiores companhias de internet do mundo, que hospedam os dados e, por extensão, os protegem.

O impasse está fermentando. Muitas grandes empresas de tecnologia, como Facebook, Google, Twitter, Zoom e Linkedin, disseram nos últimos dois dias que vão parar temporariamente de atender aos pedidos de dados de usuários feitos pelas autoridades de Hong Kong.

O governo local, por sua vez, deixou claro que a pena por desacatar a lei pode incluir cadeia para funcionários das empresas.

De acordo com a lei, as autoridades de Hong Kong têm o poder de ordenar o modo como as pessoas do mundo todo falam sobre a política contestada da cidade.

Um empregado do Facebook em Hong Kong pode ser preso se a companhia não entregar dados de um usuário baseado nos EUA que as autoridades chinesas consideram uma ameaça à segurança nacional.

Embora não esteja claro até que ponto o governo de Hong Kong vai aplicar a lei, a ameaça de batalhas legais poderá determinar se a cidade fica dentro da cortina de ferro jurídica da China ou se torna um híbrido onde o discurso e as comunicações online são policiadas de forma seletiva.

A Guerra Fria tecnológica entre China e EUA se desenrola em várias frentes. A guerra comercial envolveu gigantes tecnológicas chinesas, como Huawei e ZTE, enquanto companhias americanas se queixam das políticas industriais que favorecem as empresas chinesas no país e as subsidiam no exterior.

Os severos controles digitais de Pequim impediram empresas como Google e Facebook de operar seus serviços na China continental.

As empresas americanas ainda ganham bilhões de dólares em receitas de publicidade chinesas, mas uma decisão de seguir as regras de Hong Kong poderia provocar irritação em Washington, onde houve condenação bipartidária à lei de segurança.

Novos bloqueios a negócios americanos também poderão provocar retaliação.

O secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, disse na segunda (6) que o governo Trump está avaliando bloquear alguns aplicativos chineses, que ele considera ameaças à segurança nacional. "Não quero me adiantar ao presidente, mas é algo que estamos examinando", disse ele em entrevista à Fox News.

Um porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, defendeu a lei em uma entrevista coletiva na terça, dizendo que ela tornaria Hong Kong "mais estável e harmoniosa".

"Os cavalos correrão mais depressa, os cavalos correrão mais felizes, as ações ferverão e as dançarinas dançarão melhor. Temos plena confiança em Hong Kong", disse ele, referindo-se a uma frase do falecido líder chinês Deng Xiaoping sobre a cidade.

A experiência do Google no último ano mostra a frágil posição que as maiores companhias de internet americanas enfrentam. Enquanto a polícia de Hong Kong lutava para conter os protestos que se espalharam pela cidade em 2019, pediu a ajuda de empresas da internet.

Os pedidos de dados e as ordens de retirada de conteúdo pela polícia mais que dobraram no segundo semestre de 2019 em relação ao primeiro, superando 7.000, segundo um deputado pró-democracia, Charles Mok.

A polícia pediu que o Google retirasse diversas postagens, incluindo um manual de políticas confidencial que vazou online, um vídeo do YouTube do grupo de hackers Anonymous apoiando os protestos e links para um site que permitia ao público ver detalhes pessoais de policiais, segundo o relatório de transparência da companhia. Em todos os casos o Google se recusou.

A nova lei poderá punir a empresa com multas, apreensão de equipamentos e prisões se ela novamente recusar pedidos de dados e de exclusão de publicações. Ela também permitiria a apreensão pela polícia de equipamentos de empresas que hospedem esse conteúdo.

"Vemos a tendência. Não é apenas que eles estão fazendo mais pedidos, é o poder cada vez maior de as autoridades fazerem isso arbitrariamente", disse Mok, acrescentando que "algumas plataformas locais menores ficarão temerosas das consequências jurídicas e poderão acatar" os pedidos do governo.

Vários pequenos apps locais ligados ao movimento de protesto já fecharam. O Eat With You, que rotulava restaurantes com base em sua afiliação política, parou de funcionar um dia depois que a lei de segurança foi aprovada, na semana passada.

No domingo (5), outro serviço que mapeava empresas a favor dos manifestantes ou da polícia no Google Maps suspendeu seu serviço, alegando "mudança de circunstâncias sociais".

Indivíduos também aderiram à autocensura. Muitos retiraram posts, "likes" de algumas páginas pró-democracia e até apagaram contas em plataformas como Twitter, segundo ativistas.

Temores de que o WhatsApp entregaria dados provocaram um aumento nos downloads do app Signal, de conversas criptografadas. O WhatsApp, porém, não recebeu recentemente pedidos de dados pela polícia de Hong Kong, segundo uma fonte informada sobre o assunto.

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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