Opositor de Putin está em coma após suposto envenenamento, diz porta-voz

Aliados de Alexei Navalni falam em tentativa de assassinato e acusam envolvimento do governo russo

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Moscou | AFP e Reuters

O ativista Alexei Navalni, um dos principais opositores do governo de Vladimir Putin na Rússia, foi internado nesta quinta-feira (20) em uma unidade de terapia intensiva de um hospital da Sibéria, vítima de envenenamento, de acordo com sua porta-voz, Kira Iarmich .

Navalni estava voando da Sibéria até Moscou quando o avião precisou fazer um pouso de emergência após ele passar mal. Segundo a porta-voz, a principal suspeita é que ele tenha tomado uma xícara de chá envenenado em um aeroporto da cidade de Tomsk.

"Nós presumimos que Alexei foi envenenado com algo misturado ao seu chá. Foi a única coisa que ele bebeu naquela manhã. Os médicos dizem que a toxina foi absorvida mais rapidamente por meio do líquido quente. Alexei agora está inconsciente", disse Iarmich.

Ainda de acordo com a porta-voz, Navalni estava em coma e respirando com a ajuda de aparelhos.

O líder opositor Alexei Navalni durante protesto em Moscou - Shamil Zhumatov - 29.fev.20/Reuters

As versões da equipe médica, entretanto, ainda são imprecisas. Em uma rede social, Iarmich disse que alguns médicos foram proibidos de dar informações sobre o caso.

A médica pessoal de Navalni, Anastasiya Vasiliyeva, também afirmou que o diretor do setor de emergência do hospital que recebeu o opositor se recusou a falar com ela.

Mais tarde, Anatoly Kalinichenko, um médico no hospital da cidade de Omsk, onde Navalni está internado, disse que ainda não há certeza de que o líder opositor foi envenenado e que exames estão sendo feitos para confirmar o diagnóstico.

Uma porta-voz do Ministério da Saúde russo confirmou a internação e disse que o estado de Navalni é considerado grave.

“Os médicos estão fazendo todo o possível para estabilizar sua condição”, disse a representante. "A versão do envenenamento é uma das várias versões que estão sendo consideradas. Não é possível dizer agora qual foi o motivo."

Um porta-voz do Kremlin disse que deseja uma recuperação rápida a Navalni como a qualquer outro cidadão russo. Também acrescentou que a possibilidade de envenenamento precisa ser confirmado por testes de laboratório, e as autoridades estariam prontas para considerar um pedido para que ele receba tratamento médico fora da Rússia.

A chanceler da Alemanha, Angela Merkel, e o presidente da França, Emmanuel Macron, já se ofereceram para fornecer assistência a Navalni em seus países. Em uma entrevista coletiva após uma reunião entre os dois líderes na residência de verão de Macron, ambos disseram estar profundamente preocupados com seu estado de saúde.

"As notícias que temos a esta hora são extremamente preocupantes. Continuaremos acompanhando a situação de muito perto", disse Macron. "Estamos prontos para fornecer toda a assistência necessária a Alexei Navalni e às pessoas próximas a ele em termos de saúde, asilo e proteção."

Merkel disse ser "particularmente importante" que as circunstâncias sobre o suposto envenenamento "sejam esclarecidas muito rapidamente".

"Insistimos nisso, porque o que ouvimos até agora é muito desfavorável. Deve ser feito com muita transparência", disse.

De acordo com o jornal alemão Bild, uma ambulância com uma equipe especializada no tratamento de pacientes em coma deve deixar a Alemanha para buscar o dissidente russo na noite desta quinta-feira.

A afirmação é do ativista de direitos humanos Jaka Bizilj, responsável pela ONG alemã Cinema for Peace. "Se Navalni estiver em condições de ser transportado amanhã [21] de manhã, o avião voará imediatamente para Berlim. Sua esposa o acompanhará."

Bizilj é esloveno, mas mora na capital alemã. Em 2018, ele ofereceu o mesmo tratamento ao ativista Pyotr Verzilov, membro do grupo Pussy Riot, que havia sido envenenado em Moscou.

O diretor do departamento jurídico da fundação anticorrupção comandada por Navalni, Vyacheslav Gimadi, escreveu no Twitter que "não há dúvidas de que ele foi envenenado por sua posição e suas atividades políticas".

Também anunciou que os advogados do opositor solicitaram uma investigação por tentativa de assassinato de uma pessoa pública.

Crítico de Putin, Navalni ganhou notoriedade após convocar manifestações contra o governo por meio das redes sociais. Ele já foi detido várias vezes por organizar protestos não autorizados, além de ter sido atacado nas ruas por apoiadores do presidente russo.

Em 2017, um ativista pró-Kremlin atirou um corante químico que o deixou parcialmente cego de um olho.

Navalni também ajudou nas investigações sobre o que disse serem exemplos chocantes da corrupção no governo, e seus vídeos sobre o assunto somam milhões de visualizações.

De acordo com o jornal The Moscow Times, ele estava voltando para a capital russa depois de viajar pela Sibéria para organizar o apoio a candidatos independentes que concorrem às eleições regionais, que serão realizadas em setembro.

Um passageiro que estava no mesmo voo disse que Navalni foi ao banheiro pouco depois da decolagem, começou a passar mal e a gritar de dor.

A companhia aérea confirmou essa versão e disse que ele não comeu ou bebeu nada enquanto estava no avião. O piloto fez um pouso de emergência em Omsk, onde o opositor foi internado.

Um vídeo publicado nas redes sociais mostra Navalni inconsciente sendo colocado em uma maca, depois de ser retirado do avião.

Embora a hipótese do envenenamento ainda não tenha sido confirmada, a porta-voz de Navalni compartilhou um tuíte que acusa o presidente da Rússia de envolvimento na suposta tentativa de assassinato. "Existem apenas três opções para quem envenenou Navalni: Putin, Putin, Putin."

Há uma longa história de inimigos do Kremlin que foram mortos ou hospitalizados após suspeitas de envenenamento.

Em 2006, Alexander Litvinenko, um ex-espião russo, morreu após beber chá misturado com polônio-210, uma substância radioativa altamente tóxica. Em 2018, o ex-agente Sergei Skripal também foi envenenado depois de ser considerado um traidor por Moscou.

Outro opositor russo, Piotr Verzilov, foi hospitalizado em setembro de 2018 depois de passar mal ao sair de uma audiência em um tribunal de Moscou. Ele foi levado em estado grave para Berlim, onde permaneceu vários dias hospitalizado.

Em julho de 2019, quando cumpria uma curta pena de prisão, o próprio Navalni também afirmou ter sido "envenenado com um material químico desconhecido" e foi transferido para um hospital. As autoridades citaram uma "reação alérgica" e afirmaram que "não encontraram nenhuma substância tóxica".

"Obviamente, o mesmo foi feito com ele agora", disse a porta-voz do opositor.


Outros desafetos de Putin alvos de envenenamento


Iuri Shchekochikhin, 2003
Jornalista investigativo, teve sintomas de forte alergia e morreu dias antes de se encontrar com investigadores do FBI.

Anna Politkovskaya, 2004
Jornalista investigativa, passou mal após tomar chá em um voo. Ela sobreviveu, mas foi assassinada a tiros dois anos depois, em frente de casa.

Viktor Yushchenko, 2004
Candidato à presidência da Ucrânia contra um rival apoiado por Moscou, foi envenenado em meio à campanha. Ele sobreviveu, venceu a eleição e assumiu o cargo, mas ficou com cicatrizes no rosto.

Alexander Litvinenko, 2006
Ex-espião russo, se tornou crítico de Putin. Passou mal após tomar um chá com outro ex-agente russo em Londres, e morreu três dias depois, em novembro de 2006

Sergei Skripai, 2018
Ex-agente duplo russo, foi encontrado caído em um banco na praia no Reino Unido, junto com a filha. A polícia suspeita que veneno foi colocado na porta de sua casa. Recuperou-se após semanas no hospital.

Pyotr Verzilov, 2018
Ativista e porta-voz do grupo Pussy Riot, foi levado a um hospital de Moscou depois de perder subitamente a visão, audição e movimentos. Ele foi levado depois para a Alemanha, onde os médicos apontaram que os sintomas eram indicativos de envenenamento. Ele sobreviveu.

Leia aqui mais detalhes sobre os casos acima.


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