Descrição de chapéu Armênia

Armênia rejeita mediação de Putin, e conflito piora com Azerbaijão

Russo conversa com Macron, e presidentes vão insistir em negociações no Cáucaso

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São Paulo

A Armênia descartou uma mediação russa no conflito com o Azerbaijão, que entrou no quarto dia com alguns dos combates mais duros entre os dois países nesta crise.

"Não é muito apropriado falar de uma reunião entre Armênia, Azerbaijão e Rússia enquanto há hostilidades intensas", disse nesta quarta (30) a jornalistas russos o premiê Nikol Pashinyan.

Azeri chora sobre caixão de soldado que teria sido morto em combate com armênios, no distrito de Beylagan
Azeri chora sobre caixão de soldado que teria sido morto em combate, no distrito de Beylagan - Tofik Babaiev/AFP

A posição veio um dia depois de ele conversar ao telefone com o presidente russo, Vladimir Putin, pela segunda vez desde domingo, quando os ataques começaram na disputada região de Nagorno-Karabakh.

No fim da tarde desta quarta, Putin recebeu um telefonema do presidente francês, Emmanuel Macron. Ambos os líderes concordaram em insistir na tentativa de colocar armênios e azeris na mesa de negociações.

Rússia e França integram o grupo original de países que buscou uma solução para o conflito, sem sucesso até aqui.

A frase de Pashinyan explicita o incômodo com a posição de cautela do Kremlin em relação a seus aliados armênios, que contrasta com os tambores de guerras tocados na Turquia de Recep Tayyip Erdogan para estimular seus protegidos azeris.

"Estamos juntos com o Azerbaijão na mesa de negociação e no campo de batalha. Essas não são palavras vazias", disse também nesta quarta à agência turca Andalu o chanceler do país, Mevlut Cavusoglu.

Os motivos de Putin são claros. Primeiro, ele não quer antagonizar explicitamente com Erdogan, com quem divide parcerias e rivalidades, para não abrir uma frente de turbulência em sua fronteira sul ao mesmo tempo em que lida com a crise no flanco oeste, na sua turbulenta aliada Belarus.

Segundo, Putin não gosta de Pashinyan, que chegou ao poder em 2018 após a queda de um amigo pessoal e aliado, Serzh Sargsyan. Moscou, diferentemente do que ocorreu por exemplo na Ucrânia em 2014, manteve boas relações com a Armênia, mas há desconfiança mútua.

No fim da tarde, em Moscou, o Ministério das Relações Exteriores reafirmou que quer sediar conversas entre os chanceleres armênio e azeri sobre a crise.

Analistas russos veem o movimento de Putin como uma forma de aumentar a dependência dos armênios caso a crise escale ainda mais.

Afinal de contas, Moscou tem uma base militar grande, equipada com tanques, baterias antiaéreas e 18 caças MiG-29 em Gyumri, leste armênio. Herança dos tempos em que toda a região fazia parte da União Soviética, o local abriga 3.000 soldados.

Moscou e Ierevan têm um pacto militar segundo o qual os russos se comprometem a proteger os armênios de agressões externas, mas Pashinyan afirmou que não lançará mão disso agora.

Além disso, o armênio ligou nesta manhã para o presidente do Irã, Hassan Rouhani, para falar sobre a crise e o papel da Turquia. Teerã apoia tacitamente Ierevan, por sua rivalidade com os tucos e por temer separatismo de sua grande minoria azeri, cerca de 25% da população.

Mas mantém laços com o Azerbaijão, país também de maioria muçulmana xiita.

Enquanto isso, o conflito aumentou em intensidade nessa quarta. Em Nagorno-Karabakh, os armênios étnicos que governam o encrave em território azeri lançaram uma contra-ofensiva para buscar recuperar áreas perdidas desde o domingo.

Segundo os ministérios da Defesa de ambos os países, os engajamentos ocorreram ao longo de toda a Linha de Contato, a fronteira do cessar-fogo de 1994 que suspendeu precariamente dois anos de guerra entre Armênia e Azerbaijão sobre o controle da região.

Destroços do que seria um jato Su-25 derrubado na terça-feira na Armênia
Destroços do que seria um jato Su-25 derrubado na terça-feira na Armênia - Armenian Unified Infocenter/via Reuters

Como é a praxe desde o começo do conflito, as informações são contraditórias e alimentadas por relatos esparsos de redes sociais —mais eficazes e loquazes na Armênia, enquanto os azeris seguem a cartilha autocrática de seu líder, Ilham Aliyev.

Baku afirmou ter destruído uma bateria antiaérea S-300, de fabricação russa, do Exército da Armênia que teria sido colocada em Martuni, em Nagorno-Karabakh.

Já Ierevan divulgou fotos do que considera prova da interferência turca no conflito, os destroços de um jato Su-25 abatido na terça, segundo os armênios, pelo disparo de um F-16 de Ancara em espaço aéreo azeri. A Turquia nega.

Os relatos de F-16 turcos na região seguiram nesta quarta. Segundo o Ministério da Defesa em Baku, os ataques armênios foram neutralizados, e o número de tanques destruídos somou 130 desde domingo.

O governo de Aliyev também disse que mais sete civis azeris foram feridos por bombardeios de artilharia armênia fora de Nagorno-Karabakh, o que Ierevan nega. Com tudo isso, o número de vítimas do conflito segue nebuloso, na casa de cem mortos e centenas de feridos. Imagens divulgadas na mídia estatal azeri mostravam soldados em caixões, mas não há um número oficial de baixas.

Baku disse ter "neutralizado" 2.300 soldados separatistas em Karabakh, enquanto o governo local falava em 84 mortes até a terça.

A região, chamada de República de Artsakh por Ierevan, era uma área autônoma do Azerbaijão soviético, de maioria armênia. Nos anos 1920, antes de virar ditador da União Soviética, o georgiano Josef Stálin cuidou da divisão territorial do Cáucaso sob domínio comunista.

Num paralelo com o cuidado de Putin agora, Stálin manteve Kharabak nominalmente dentro da área comandada por Baku para aplacar os turcos, que formavam então sua república das cinzas do Império Otomano derrotado na Primeira Guerra Mundial.

Como o presidente russo, o futuro ditador queria estabilizar uma das mais importantes regiões da nascente União Soviética, historicamente suscetível a invasões.

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