Human Rights Watch acusa governo da Bolívia de manipular Judiciário contra Evo

Para ONG, acusações de terrorismo contra ex-presidente são desproporcionais

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Buenos Aires

A ONG Human Rights Watch (HRW) apresentou nesta sexta-feira (11) o relatório "Processos de Terrorismo Contra Evo Morales", no qual analisa as acusações judiciais contra o ex-presidente da Bolívia e pede que o Ministério Público do país retire as acusações de terrorismo contra ele.

Evo foi acusado pelo Executivo, liderado pela presidente interina Jeanine Añez, de ordenar os bloqueios de estradas realizados por apoiadores do MAS (Movimento ao Socialismo), partido do líder indígena, durante os protestos que se seguiram à sua renúncia, em novembro de 2019.

A entidade considerou que as acusações são desproporcionais, uma vez que se apoiam em uma só gravação telefônica em que Evo, já no exílio, conversa com um ativista de seu partido e pede que a ação de bloqueio de estradas continue.

O ex-presidente da Bolívia Evo Morales durante entrevista coletiva em Buenos Aires, onde se exilou após renunciar
O ex-presidente da Bolívia Evo Morales durante entrevista coletiva em Buenos Aires, onde se exilou após renunciar - Ronaldo Schemidt - 21.fev.20/AFP

O ex-presidente afirmou, mais de uma vez, que a voz registrada na ligação não pertence a ele. O relatório classifica as provas como débeis e aponta para o tamanho do delito, lembrando que "a interrupção de vias é uma forma comum de protesto na Bolívia e em outros países da região".

Nos países andinos, em que muitas cidades importantes estão localizadas no alto das montanhas, o fechamento de estradas é, tradicionalmente, uma forma de manifestação simbólica e eficiente.

A HRW também recorda que a mesma tática já foi usada contra o próprio Evo nas semanas anteriores à sua renúncia, para pressioná-lo a sair do cargo.

A ONG analisou a denúncia, que tem 1.500 páginas, e afirma que ela não possui uma prova significativa de que o ex-presidente estivesse vinculado diretamente aos incêndios criminosos de casas, ataques a veículos e outros atos de vandalismo que ocorreram pouco antes da posse de Añez.

"A única prova apresentada, e não se trata de uma evidência contundente, é a ligação telefônica gravada em novembro de 2019, mas ela não é suficiente para respaldar todas as acusações feitas a Morales por sedição e terrorismo", diz José Miguel Vivanco, diretor para as Américas da HRW. "Está longe de configurar terrorismo sob qualquer definição razoável do delito."

A entidade afirma que seria mais apropriado processar os autores dos bloqueios, mas sem vinculá-los diretamente à ligação telefônica do ex-presidente e sem tratar os ocorridos como ato terrorista, um delito que pode levar a pena de até 20 anos de prisão.

O relatório ainda recrimina o uso de expressões por parte de integrantes do Executivo boliviano. O ministro do Interior, Arturo Murillo, por exemplo, prometeu "ir à caça" de Evo e de membros de seu governo.

Segundo a HRW, as palavras são intimidatórias e pressionam juízes e promotores em processos contra membros do MAS, culpando-os por ações violentas. O relatório aponta que a declaração deu respaldo à abertura de mais de 150 processos contra os apoiadores do partido, também por sedição e terrorismo.

A ONG diz que é explícito o fato de que o Executivo liderado por Añez manipula o aparato judiciário do país, assim como o fez, em sua gestão, o próprio governo de Evo.

A investigação da HRW foi feita na Bolívia em fevereiro, a partir de 80 entrevistas com pessoas que participaram dos eventos no país. Entre os mais de 150 processos contra membros do MAS, 21 foram auditados pela entidade e foram considerados "abusivos e arbitrários".

"Detectamos evidências de processos sem fundamento, constrangimento da liberdade de expressão e uso excessivo do recurso da detenção preventiva", diz o documento.

Um desses casos é o de Patricia Hermosa, acusada de mediar ligações entre o ex-presidente, hoje na Argentina na condição de refugiado, e partidários do MAS na Bolívia.

A ex-chefe de gabinete de Evo continua presa sem julgamento. Ainda durante o período da prisão preventiva, Hermosa sofreu um aborto espontâneo.

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