Índia e China voltam a se acusar em disputa militar na fronteira

Tensão sobe novamente entre gigantes asiáticos após escaramuça fatal em junho

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São Paulo

A Índia e a China voltaram a se acusar de promover ações militares provocativas ao longo da fronteira disputada entre os dois países na cordilheira do Himalaia.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores em Nova Déli, os indianos tiveram de reforçar posições defensivas em quatro picos na região próxima ao lago de Pangong após movimentações de tropas chinesas no sábado (29).

Caça indiano patrulha região perto de Leh, capital de Ladakh, área fronteiriça com a China
Caça indiano patrulha região perto de Leh, capital de Ladakh, área fronteiriça com a China - Mohd Arhaan Archer - 31.ago.2020/AFP

"O lado indiano evitou essa tentativa unilateral de alterar o status quo", disse em nota o porta-voz da pasta, Anurag Srivastava. A China negou a ação e falou em "provocações flagrantes" de militares do vizinho na região.

A porta-voz da chancelaria Hua Chnying afirmou que os movimentos indianos na segunda (31), que ocorreram em outros pontos da fronteira, "violaram grosseiramente a soberania territorial da China e os acordos relevantes" sobre as áreas em disputa.

A troca de acusações é o mais recente episódio de uma crise que ressurgiu neste ano, que tem preocupado analistas militares acerca do risco de um embate entre as duas potências nucleares.

Ambos os países são milenares, e suas fronteiras mudaram muito ao longo da história. Desde a independência indiana (1947) e do estabelecimento da ditadura comunista chinesa (1949), houve disputas acentuadas —em 1962, Pequim venceu uma guerra.

Os quase 3.500 km de fronteiras mútuas, boa parte nos picos gelados do Himalaia, têm pontos chamados linhas de controle, em que há presença militar de lado a lado. De tempos em tempos, conflitos pontuais irrompem.

O mais recente ocorreu em junho, quando uma escaramuça com paus e pedras resultou em pelo menos 20 indianos e um número incerto de chineses mortos, o mais grave incidente em 53 anos. Os dois países já vinham reforçarando suas posições militares na região e promovendo exercícios de combate.

Ao mesmo tempo, pelo óbvio desinteresse de economias dominantes na Ásia em ver algo pontual escalar para uma guerra, Pequim e Nova Déli estabeleceram contatos entre seus diplomatas e chefes militares.

O incidente do fim de semana levou a uma nova rodada de negociações, mas o fato é que nenhum dos lados tampouco parece disposto a ceder. Os indianos temem que a construção de infraestrutura chinesa junto à fronteira a torne um fato consumado.

Segundo os indianos, os chineses estabeleceram bases na margem norte do lago. Já Pequim diz que Nova Déli tem violado com frequência a linha de controle ao sul de lá.

Sem tantos recursos e capacidade técnica, Nova Déli faz uma ocupação mais militar e mantém bolsões visando separar seu território das áreas sob disputa. No estado do Sikkim, por exemplo, turistas só podem ir até certo ponto antes de encontrarem barreiras militares na direção da China.

Ainda há poucos detalhes do que os indianos fizeram nos quatro picos citados por seu ministério, mas a natureza do engajamento militar em alta altitude sugere o posicionamento de artilharia para controlar passos abaixo daqueles pontos.

No domingo (30), o chanceler chinês, Wang Yi, havia dito que queria uma solução pacífica para o embate.

Há questões mais e menos amplas embutidas da disputa. A Índia, apesar de tradicionalmente independente e próxima também de Moscou, é aliada dos Estados Unidos, que vive sua Guerra Fria 2.0 particular com a China.

O governo do premiê Narendra Modi se aproximou do de Donald Trump, e manter pressão sobre Pequim é um mote de Washington nesses dias.

Assim, há duas semanas os EUA enviaram três bombardeiros estratégicos furtivos B-2, capazes de lançar ogivas nucleares, para sua base no oceano Índico. Foi um sinal de apoio a Nova Déli, ainda que os aviões estejam a cerca de dez horas de voo da região em disputa.

No foco regional, a China é aliada do Paquistão, a turbulenta república de maioria muçulmana que foi extirpada da antiga Índia Britânica e é a maior rival de Nova Déli. Pequim investiu fortemente em infraestrutura local e é a maior parceira militar de Islamabad, o que gera apreensão na Índia.

Como os três países têm armas nucleares, a equação fica ao mesmo tempo mais equilibrada, em favor de soluções pacíficas, e perigosa, dado o risco de algo sair de controle com custo humano inimaginável. China e Índia somam 2,8 bilhões dos 7,8 bilhões de humanos, e há 221 milhões de paquistaneses.

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