Sites de notícia na Belarus ficam sem fotos em protesto contra condenações

Fotojornalistas foram detidos quando cobriam atos antiditadura e punidos com 11 dias de prisão

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Bruxelas

“Aqui deveria haver uma foto”, diz a mensagem reproduzida em vários espaços em branco na página principal da TV independente Belsat, na Belarus. No Tut.by, maior jornal online independente bielorrusso, uma câmera atrás das grades aparece em destaque no lugar da principal fotografia do dia.

Veículos informativos amanheceram nesta quinta (17) com mensagens em protesto contra a condenação, na véspera, de dois repórteres-fotográficos, acusados de participarem de eventos não proibidos.

Os fotojornalistas, Vladimir Gridin e Alexander Vasiukovich, cobriam uma manifestação contra a ditadura no domingo (13) e foram detidos ao entrar num café para transmitir as imagens à Redação. Cada um recebeu pena de 11 dias de prisão.

Eles são 2 de mais de 180 jornalistas detidos pela ditadura bielorrussa desde 9 de agosto, quando a suspeita de fraude na eleição presidencial levou milhares às ruas em protesto.

Desde então, ocorrem diariamente manifestações pela renúncia do ditador, Aleksandr Lukachenko, apesar da repressão: na Belarus, atos públicos são ilegais se não tiverem permissão do governo, e a participação em protestos pode acarretar penas de multa ou prisão.

O regime, porém, distorce a interpretação da lei e fere a liberdade da imprensa, segundo a associação de jornalistas do país. Repórteres são agarrados por policiais e retirados dos locais de protesto, o que impede a cobertura jornalística. Foi o que aconteceu durante uma manifestação de estudantes em 1º de setembro: seis repórteres foram levados pela polícia e, depois de três dias detidos, condenados a três dias de prisão.

Segundo Ilya Nuzov, diretora para Europa Oriental e Ásia Central da FIDH (Federação Internacional de Direitos Humanos), há entre os casos documentados de prisão de jornalistas na Belarus 40 estrangeiros.

O país do leste europeu está numa das últimas colocações no ranking de liberdade de imprensa da Repórteres sem Fronteiras: 156º entre 180 avaliados.

No último mês, a ditadura bielorrussa cassou a credencial de cerca de 20 correspondentes e negou autorização para entrada de número equivalente de profissionais. Durante os três primeiros dias de protestos, vídeos registraram jornalistas identificados e credenciados sendo espancados pela tropa de choque.

“Jornalistas têm o direito legal de participar de eventos de massa para cobri-los”, afirmou em comunicado a AJB (Associação dos Jornalistas da Belarus). A organização pediu revisão das setenças e investigação e punição dos envolvidos na repressão aos repórteres.

Diretores e apresentadores de TV que pediram demissão de órgãos estatais por discordarem da repressão aos manifestantes também viraram alvo do regime. No dia 11 de setembro, um editor que se desligou da ONT foi condenado a 15 dias de prisão por participar de marcha em agosto.

Dois outros apresentadores, Dmitry Kokhno e Denis Dudinsky, já haviam sido condenados e presos pelo mesmo motivo. Em todos os casos, os julgamentos ocorreram sem a divulgação correta do horário da sessão, dificultando a defesa, segundo advogados.

Além das manifestações dos veículos de mídia em apoio aos repórteres condenados, uma animação feita por artistas de 19 países foi publicada na internet nesta quinta, em protesto contra a violência policial.

O grupo, descrito como Animadores pela Belarus, tem representantes de África do Sul, Alemanha, Austrália, Belarus, Bélgica, Canadá, EUA, França, Grécia, Holanda, Israel, Itália, Polônia, Portugal, República Tcheca, Romênia, Rússia, Reino Unido e Uzbequistão.

Nesta quinta, Lukachenko anunciou que vai fechar a fronteira com a Polônia e a Lituânia e reforçar os controles na fronteira com a Ucrânia, a maior das três. Os governos polonês e lituano disseram que ainda não foram notificados da medida.

Foi na fronteira da Ucrânia onde a opositora Maria Kalesnikava, 38, foi detida após rasgar seu passaporte para evitar ser expulsa da Belarus.

Em 1977, durante a ditadura militar, a Folha foi ameaçada de fechamento ao publicar em branco a coluna do jornalista Lourenço Diaféria, em protesto por sua prisão.

Diaféria foi acusado de violar a Lei da Segurança Nacional por ter feito menção, considerada ofensiva pelo governo, ao duque de Caxias, patrono do Exército brasileiro, na crônica diária publicada na Ilustrada.

A publicação da coluna em branco foi considerada uma afronta pelos militares, e o chefe da Casa Militar, general Hugo Abreu, avisou em telefonema ao então publisher da Folha, Octavio Frias de Oliveira [1912-2007], que o jornal seria fechado se o protesto voltasse a acontecer.

Bulgária impede entrada de repórteres na Assembleia

Houve também protestos contra ataques à liberdade de imprensa na Bulgária, onde manifestantes fazem há dois meses protestos pela renúncia do primeiro-ministro, Boiko Borissov.

O país tem a pior colocação da União Europeia no ranking de liberdade de expressão da ONG Jornalistas Sem Fronteiras (111º entre 180 países), e o governo foi instado nesta quarta pelo Parlamento Europeu a investigar o espancamento do repórter Dimitar Kenarov durante um megaprotesto no último dia 2.

Os eurodeputados citaram informações do Conselho da Europa (entidade de direitos humanos) de que Kenarov foi agredido e detido ilegalmente pela polícia quando cobria o evento na capital, Sófia.

Kenarov diz que fotografava a manifestação quando foi pressionado contra a parede e arrastado pela praça até as escadas do Parlamento. Lá, foi chutado na cabeça por pelo menos dois policiais, algemado e preso, sem ordem de detenção e sem acesso a advogado. Segundo ele, sua câmera foi jogada ao chão e quebrada, embora ele tenha se identificado como jornalista várias vezes.

O documento também cita duas agressões recentes, a do fotojornalista da agência de notícias AFP Nikolai Doichinov, que foi atingido nas costas com cassetetes e teve a câmera quebrada, e a de Nikolay Minkov, da rede de televisão BNT, agredido com spray de pimenta.

Em Sófia, 60 repórteres que cobrem a Assembleia Nacional entraram com petição contra uma nova regra que impede a entrada de jornalistas no prédio do Parlamento e o livre acesso aos deputados. A norma foi determinada pela presidente da Casa, Tsveta Karaiancheva, que integra o Gerb, partido do premiê.

Na rede de mídia Euractiv, jornalistas búlgaros afirmaram que o governo impôs condições de trabalho humilhantes: os repórteres ficam aglomerados num pequeno corredor e podem ver parlamentares e ministros apenas em entrevistas agendadas ou em um monitor, frequentemente apagado.

“O isolamento físico dos meios de comunicação e a falta de oportunidade de falar livremente com deputados e convidados —ministros e representantes de instituições sujeitas ao escrutínio parlamentar— limitam gravemente o acesso à informação, um direito democrático fundamental dos cidadãos”, diz a petição enviada por jornalistas de cerca de 20 veículos.

A presidente da Assembleia, porém, disse que não pretende rever a determinação.

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